Exigir coerência na seara política é a mais hercúlea das missões, talvez tarefa impossível, mas não se pode desistir de cobrar que os políticos escrevam sento aquilo que falam em pé. Há uma ruidosa dissonância entre o que foi defendido ao longo do processo de impeachment de Dilma Rousseff e o que diz a agora ex-presidente da República. Durante o processo, a tropa de choque dilmista, assim como a acusada, alegava que o governo de Michel Temer era golpista e representava uma ameaça às conquistas sociais e aos direitos dos trabalhadores.
Na sua defesa, perante os senadores, Dilma Vana disse discordar do processo, classificado como golpe parlamentar, e que seu governo foi integralmente dedicado aos trabalhadores e aos mais pobres, a começar pela valorização do salário do trabalhador e a ampliação dos programas sociais, como o Bolsa Família, por exemplo.
A ex-presidente pode alegar o que bem entender, mas nada justifica o desrespeito à lei, sem que a transgressão não tenha uma punição correspondente. Para justificar seu desejo de não ser inabilitada para o exercício de funções públicas, Dilma alegou que, confirmado o impeachment, teria de sobreviver com uma aposentadoria de aproximadamente R$ 5 mil, já que não terá direito ao salário de ex-presidente da República, por força da decisão do Senado.
A manobra inconstitucional que preservou o direito de Dilma Rousseff de exercer cargos públicos encontrou explicação, não convincente, na necessidade de a petista ter de reforçar os ganhos com atividades extras, como atividade acadêmica em universidades públicas.
Ora, se Dilma espalhou aos quatro cantos o fato de seu governo ter valorizado o salário mínimo, atualmente fixado em R$ 880, uma aposentadoria de R$ 5 mil é fortuna. Considerando que, em tese, o comunismo defende o mantra do “tudo comum a todos”, Dilma, uma marxista convicta, não tem razão para reclamar, pois dois terços dos brasileiros recebem menos de dois salários mínimos mensais. E sua aposentadoria equivale a quase sete salários mínimos.
Pois bem, o discurso melancólico de Dilma tem algo que não se encaixa no contexto. Levando-se em conta que Dilma acredita ser impossível sobreviver com R$ 5 mil mensais no País de Alice que ela vendeu aos brasileiros incautos, ultrapassa o razoável os planos da petista de passar uma temporada em países da América do Sul e na Europa. Afinal, para tanto é preciso dinheiro extra.
Contudo, essas possíveis viagens de Dilma ao exterior podem encontrar explicações além do seu apertado orçamento mensal. A ex-presidente perdeu o chamado foro privilegiado e, na esteira das delações premiadas dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura, poderá em breve tornar-se alvo fácil da Operação Lava-Jato.