Lava-Jato: filha de José Janene, o mentor do Petrolão, não convence no papel de inocente de ocasião

(Reprodução Folha de S. Paulo)
(Reprodução Folha de S. Paulo)

É no mínimo devaneio explícito o conjunto de declarações de Danielle Janene que consta de matéria publicada pelo jornal “Folha de S. Paulo” na edição desta segunda-feira (19). Filha de José Janene, o Xeique do Mensalão e mentor intelectual do esquema de corrupção que hoje é conhecido como Petrolão, Danielle disse que seu pai não permitia que ela pagasse uma só conta, “nem do verdureiro”.

Quem conhece a história de Janene sabe que Danielle foi durante alguns anos o braço direito do político que abusou da ousadia e chegou a chamar publicamente o então presidente Lula de “filho da puta”. A filha de Janene, falecido em outubro de 2010, alega que após essa data a realidade familiar mudou em termos financeiros. “As pessoas entraram em contato para falar de problemas. Nunca ninguém bateu na porta para falar: ‘Olha, tem dinheiro esperando vocês ou alguma coisa boa’”, afirmou Danielle à jornalista Katna Baran.

A filha do então deputado federal pelo PP do Paraná disse estar magoada com Alberto Youssef, o doleiro do Petrolão, a quem ela chamava de “tio Beto”. Youssef era compadre de José Janene (padrinho de um dos filhos do finado parlamentar) e operador financeiro do criador do esquema criminoso que derreteu os cofres da Petrobras.

Danielle alega que quando Youssef foi preso no escândalo do Banestado, em 2004, por determinação do mesmo Sérgio Moro, seu pai ajudou a família do doleiro. E ela ressente-se pelo fato de Alberto Yousseff não ter feito o mesmo. Ora, se o doleiro está preso há mais de dois anos e com os bens indisponíveis (muitos foram a leilão), não há como ajudar quem quer que seja, principalmente os parentes do seu sócio em malandragens.

A herdeira de Janene também é ré em processo resultante da Lava-Jato por lavagem de aproximadamente R$ 1 milhão, além de reparação de danos na casa de R$ 10 milhões. Ademais, Danielle é alvo de processo em que é acusada de apropriação indébita de todo equipamento da Dunel Indústria e Comércio, que recebeu aporte financeiro inicial de Janene, que queria transformar a empresa em uma espécie de central de branqueamento do dinheiro do Petrolão.

Ela diz que foi contratada pela empresa, mas jamais cuidou da parte financeira da mesma. “Fui contratada [da empresa], mas nunca mexi com dinheiro, nunca participei do quadro social”, diz. A arquitetura criminosa de Janene não permitia que nenhum dos seus figurasse como sócio das empresas que funcionavam como lavanderia.


A filha de Janene pode alegar o que quiser, até porque o Brasil é uma democracia, que como tal contempla o direito à livre manifestação do pensamento, mas negar os fatos é covardia a essa altura dos acontecimentos. Danielle passou a conviver maior proximidade com o pai quando esse descobriu na filha um talento incrível para lidar com seguros.

Sobre o destino da fortuna do pai, parte arrancada dos cofres da Petrobras, Danielle diz não ter notícias acerca do assunto. “Dinheiro não some, muda de mão. Só fiquei com o ônus, não tive o bônus”, diz ela, ressaltando que na Lava-Jato “não há vítimas”. O dinheiro de Janene está nas mãos de pessoa muito próxima e conhecida da família, pois do contrário a filha não faria tal afirmação. O grande problema é provar que a tal pessoa, outrora de confiança, apoderou-se da fortuna do ex-deputado.

Danielle Janene engana-se ao afirmar que inexistem vítimas no âmbito da Operação Lava-Jato. A primeira e maior vítima é a sociedade brasileira, que financiou a roubalheira desenfreada que perdurou por longos dez anos. A segunda vítima, talvez a principal no campo da realidade tangível, é o empresário Hermes Magnus, proprietário da Dunel, que não apenas perdeu o maquinário de sua empresa e outros bens, como foi alvo de ameaças e intimidações de toda ordem após denunciar o esquema criminoso.

O editor do UCHO.INFO, que em agosto de 2005 denunciou pela primeira vez o esquema de corrupção arquitetado pelo pai de Danielle, teve de enfrentar a truculência de José Janene, que à época chamava-o de “terrorista” e fazia seguidas ameaças. A denúncia final, que levou as autoridades a se debruçarem sobre o caso, aconteceu em janeiro de 2009, após sequência de matérias jornalísticas sobre o assunto.

Diante dos processos de que é alvo, Danielle Janene age forma natural ao destilar indignação e suposta inocência, até porque ninguém é obrigado a produzir provas contra si, mas contra fatos não há argumentos. Para quem tinha acesso aos e-mails nada republicanos de Janene, por meio da conta [email protected], Danielle não convence no papel de inocente de ocasião.

Aliás, não causará surpresa se, ao final da Operação Lava-Jato, surgir a informação de que muitas das investigações avançaram a partir dos dados coletados na conta de correio eletrônico criada pelo alarife do Petrolão.

apoio_04