O final de semana promete ser tenso, pelo menos no Palácio do Jaburu, residência oficial da vice-presidência da República, mas que está sendo ocupada pelo presidente Michel Temer e sua família. As pílulas de tensão são decorrentes da decisão do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), de determinar a abertura de processo investigatório preliminar com base na delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.
O acordo de colaboração premiada de Machado é certamente a maior aberração jurídica no âmbito da Operação Lava-Jato, pois aconteceu depois de uma fracassada tentativa de delação, que não avançou por falta de dados consistentes. Sérgio Machado foi orientado a gravar conversas com as pessoas que ele acusa, lago que fica evidente na maneira quase idêntica que o delator da seguimento às conversas com os acusados.
Um dos acusados por Machado é o presidente da República, que ainda não se manifestou sobre a decisão do relator dos processos da Lava-Jato no STF. Zavascki encaminhou o caso ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que avaliará a necessidade de abertura de inquérito para investigar formalmente Michel Temer.
Na mesma petição (procedimento preliminar à investigação) são citados os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Romero Jucá (PMDB-RR), além dos ex-senadores José Sarney e Delcídio Amaral. Fora isso, o ministro-relator determinou o desdobramento da delação de Sérgio Machado em três petições, as quais conterão menções a Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves (PSDB-MG), Valdir Raupp (PMDB-RO), José Agripino maia (DEM-RN), Cândido Vaccarezza (PT-SP), Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Ideli Salvatti (PT-SC). De igual modo, caberão ao procurador-geral, nesse caso, opinar sobre a abertura de inquérito.
Os trechos da delação em que Sérgio Machado menciona nomes de pessoas sem direito a foro especial por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado, serão remetidos ao juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava-Jato na primeira instância do Judiciário.
Ao falar sobre o atual presidente da República, Sérgio Machado disse que recebeu um pedido de propina para reforçar o caixa da campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo, em 2012. Segundo o delator, o valor combinado teria sido R$ 1,5 milhão, dinheiro que foi disponibilizado pela empreiteira Queiroz Galvão, investigada na Lava-Jato.
Em termos jurídicos a acusação contra Temer é fraca, mas é ainda pior em termos probatórios. Isso porque, de acordo com o que consta no depoimento de colaboração premiada, “o contexto da conversa deixava claro que o que Michel Temer estava ajustando com o depoente era que este solicitasse recursos ilícitos das empresas que tinham contratos com a Transpetro na forma de doação oficial para a campanha de Chalita; que ambos acertaram o valor, que ficou em R$ 1,5 milhão”.
Se o contexto a que se referiu o delator foi apenas um eventual pedido de apoio financeiro à campanha de Chalita, por vias legais ou não, fica difícil incriminar alguém com base em um depoimento que não encontra respaldo em fatos conexos. Isso faz com que a delação perca força, dando subsídios à defesa dos acusados.
No caso de Gabriel Chalita ter registrado a mencionada doação na contabilidade de campanha, a acusação de Machado cai por terra. Mesmo que o delator afirme que o pagamento foi propina travestida de doação oficial de campanha. Se o pagamento de fato existiu e aconteceu por meio de caixa 2, sem qualquer tipo de comprovação e desprovido de qualquer prova acessória, Sérgio Machado terá problemas no escopo do seu acordo de colaboração.
No pedido de homologação da delação de Sérgio Machado encaminhado ao STF, em 12 de maio passado, o procurador fez menções ao nome de Michel Temer, que na ocasião ocupava a Presidência da República na condição de interino. Janot ressaltou no documento que Temer é uma das autoridades com foro privilegiado sobre as quais a delação traz detalhes.
Em seguida, o PGR listou os eventuais crimes existentes a partir da delação do ex-presidente da Transpetro: organização criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, “com envolvimento do vice-presidente da República, de senadores e deputados federais”.
Em qualquer investigação séria, conduzida por autoridades minimamente responsáveis, Sérgio Machado sequer seria ouvido pela segunda vez. A não ser que a delação está acompanhada de documentos e informações que comprovem, direta ou indiretamente, as acusações.