Uma troca de e-mails em 2015 aponta indícios de fraude do Corinthians e da Odebrecht no diário de obras da Arena alvinegra para tentar antecipar o recebimento dos incentivos fiscais da Prefeitura de São Paulo.
Em julho de 2011, a prefeitura aprovou o repasse dos Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento (CIDs) para o Itaquerão, com a condição de que ele fosse sede do jogo de abertura da Copa do Mundo de 2014.
Em formato de papéis financeiros, os descontos em impostos eram emitidos de acordo com a evolução das obras. O fundo formado para construir o estádio poderia depois vender esses créditos, com certo deságio, para empresas interessadas. Vale destacar que, além de um boletim de medição elaborado pela construtora Odebrecht, a prefeitura também fiscalizava se os avanços eram condizentes.
Em dezembro de 2013, quando o estádio ainda tinha o custo inicial previsto de R$ 820 milhões, a construtora e o clube atestavam que não havia mais “nenhuma obra a ser realizada”. Em agosto de 2014, quando o valor subiu para R$ 985 milhões, mais uma vez o boletim atestou que não havia mais “nenhuma obra a ser realizada”.
Em setembro de 2015, a Odebrecht confirmou que as obras, na verdade, só acabaram naquele ano.
Os e-mails apontam que houve uma manobra da construtora com o clube para dar as obras como adiantadas com o objetivo de receber antes os incentivos da prefeitura paulistana. “Foi uma decisão de cotistas, por necessidade direta na emissão dos CIDs”, destacou Ricardo Corregio, engenheiro da Odebrecht responsável pela construção, em uma das mensagens eletrônicas interceptadas. Ele respondia a uma pergunta do então gerente da arena, Nilton Leão, sobre o motivo de a medição de 2014 não representar a realidade dos trabalhos naquele ano. O presidente do Corinthians no momento em que a medição foi assinada era Mario Gobbi.
Nas trocas de mensagens do ano passado, o presidente corintiano Roberto de Andrade e o ex-presidente Andrés Sanchez estão copiados. Além de ex-presidente, Sanchez foi o responsável pelo estádio durante toda a sua construção e, mesmo sem cargo oficial, continua sendo o número 1 da arena ainda hoje.
O documento que dá a arena como 100% concluída tem a assinatura de Antônio Roberto Gavioli, diretor de contrato da empreiteira.
Um e-mail enviado por Nilton Leão ao engenheiro Ricardo Corregio questionou a situação: “01) Pelo que vejo, naquela data [2014] estávamos longe de completar a obra e o saldo de obra a executar consta no Boletim como ZERO. É isto mesmo?”.
A resposta chegou logo depois: “Correto, é isto mesmo. Alinhado com Clube. Te explico pessoalmente para qual necessidade. Obs: Isso refere-se à medição/fatura emitida e NÃO a pagamentos!!”, pontuou Corregio, ressaltando que a empreiteira não havia recebido por aquilo que tinha sido já faturado.
Dois anos e meio depois da inauguração ainda se discute se o estádio foi concluído conforme o projeto. Uma auditoria ocorre está em andamento para investigar o que deixou de ser feito pela Odebrecht.
As trocas de mensagens seguintes se sucederam com um bate-boca. Para uma das respostas, o engenheiro retirou algumas pessoas que estavam copiadas, entre elas Anibal Coutinho, arquiteto do estádio, e Guilherme Molina, advogado e da família do amigo de infância do ex-presidente Andrés Sanchez.
“Se eu incluo pessoas em um e-mail desta importância é porque não tenho problemas, e desejo, que as respostas fluam de forma clara, direta e transparente para todos ao mesmo tempo. Peço que, por favor, não repita atitudes pouco profissionais como esta, pois caso contrário continuaremos a encontrar dificuldades para resolver nossos problemas”, escreveu Nilton Leão.
Logo em seguida, Corregio responde ressaltando que o episódio “foi uma decisão de cotistas, por necessidade direta na emissão dos CIDs!”. “E eu considerei, neste caso, ser OBRIGAÇÃO de reservar a informação ao Clube e BRL. Agora, se você quiser passar a informação adiante, seja pra quem for, fique à vontade. Não se sinta ofendido, magoado ou chateado. Você é um profissional gabaritado, competente e sabedor que alguns assuntos devem ser tratados de forma reservada”, afirmou o engenheiro.