Se países pudessem ser comparados a um quadro de eletricidade, não seria absurdo afirmar que o Brasil está com os fios trocados. Quando criou-se o termo moralidade pública, por certo o seu criador sequer imaginava que o Brasil chegaria a tamanha degradação política. Não se pode negar que a moralidade tem seus badulaques de acordo com a época e os costumes de uma nação, mas beira a irresponsabilidade fechar os olhos para a deturpação que vem sendo imposta à moral no campo da política.
Insistimos no fato de que, antes de assumir a Presidência da República, ainda na condição de interino, o peemedebista Michel Temer prometeu aos brasileiros formar uma equipe ministerial apenas com notáveis. Refém do criminoso fisiologismo político que grassa no Congresso Nacional e precisando da aprovação do impeachment de Dilma para ser presidente de fato e de direito, Temer não titubeou e rendeu-se ao banditismo político.
Supostamente encorajado pelos pífios soluços que surgem no campo da economia, Michel Temer não mais sente-se acuado ao fazer nomeações esdrúxulas e absurdas no âmbito da equipe de governo e seus puxadinhos políticos.
Ciente de que Rodrigo Maia (DEM-RJ) estava no radar da Operação Lava-Jato, o presidente da República estacionou o trator palaciano na Câmara dos Deputados para garantir a reeleição do democrata ao comando da Casa. De igual modo agiu em relação à chegada de Eunício Oliveira (PMDB-CE) à presidência do Senado. Da mesma forma Temer atuou para que o correligionário maranhense Edison Lobão fosse aclamado presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
O ápice da irresponsabilidade surgiu com a nomeação de Wellington Moreira Franco (PMDB-RJ), então secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), para o cargo de ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência. Essa inexplicável mudança de status deu a Moreira Franco, investigado na Lava-Jato por corrupção e outros crimes, o direito ao foro especial por prerrogativa de função, o foro privilegiado. Ou seja, Moreira Franco só poderá ser processado e julgado no Supremo Tribunal Federal, onde a velocidade da Justiça aproxima-se a de um jabuti cansado.
Como esperado, a nomeação de Moreira Franco como ministro foi alvo de questionamento na Justiça, com base na decisão do ministro Gilmar Mendes (STF), que em 2016 suspendeu, em caráter liminar, a nomeação de Lula como chefe da Casa Civil do governo da “companheira” Dilma.
O juiz federal Eduardo Rocha Penteado, do Distrito Federal, acolhendo pedido formulado em ação proposta por três cidadãos, suspendeu na tarde de quarta-feira (8) a nomeação de Moreira Franco como ministro. De chofre, anunciada a decisão, o Palácio do Planalto acionou a Advocacia-Geral da União (AGU), como se o órgão fosse um escritório de advocacia pronto para defender corruptos.
Ainda na noite de quarta-feira, o governo afirmou que o afastamento de Moreira Franco do cargo de ministro provocaria “danos irreparáveis” ao País. Se por um lado a afirmação é absurda, por outro é preciso lembrar que o Brasil existiu até então sem os supostos préstimos de Moreira Franco. Só mesmo um governo irresponsável e desacreditado é capaz de valer-se de tão insana declaração.
Na manhã desta quinta-feira (9), o presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), desembargador Hilton Queiroz, derrubou a liminar que suspendia a nomeação de Moreira Franco como ministro. Na opinião do magistrado, a liminar em questão gerou situação de “grave lesão à ordem pública e administrativa”, não sem antes ter interferido interferir na separação de poderes e usurpar competências do Executivo.
A interpretação de conveniência da legislação vigente no País transformou-se em perigosa arma contra o Estado Democrático de Direito. Esse discurso repetitivo de que é preciso garantir e preservar a independência dos Poderes constituídos mais parece um desvario de encomenda, pois fica a mensagem subliminar de que cada Poder está livre para violar as leis, sem ter de se preocupar com molestamentos jurídicos. Em suma, o Brasil caminha a passos largos para consolidar-se como a maior das “corruptocracias”.