Após brincar de dono do Universo durante três semanas, Donald Trump, o homem laranja, “amarelou”

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Desde a vitória nas urnas até agora, Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, tentou cumprir o que prometeu durante a campanha, mas com o passar dos dias o magnata começa a perceber que governar não é tão simples quanto comandar um reality show decadente. Mostrando-se, dia após dia, como um aprendiz mimado, que não pode ser contrariado, Trump terá de decidir entre o desejo daqueles que lhe elegeram a realidade dos fatos.

Para tanto, Trump terá de escolher entre levar os EUA ao isolamento, algo extremamente perigoso em termos geopolítico, e manter a opção feita pelo país em relação ao cenário internacional. Depois das seguidas derrotas que colecionou na Justiça no caso dos vetos migratórios, Donald recebeu na Casa Branca, nesta segunda-feira (13), o primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau.

Durante o encontro, ambos conversaram sobre vários temas, inclusive comerciais, mas a pauta dominante foi o problema migratório. Enquanto Trudeau defendeu os refugiados, lembrando ao homólogo estadunidense que o Canadá já recebeu 40 mil sírios, Trump disse ser preciso barrar as “pessoas erradas”.

Em primeiro lugar é preciso saber o que Donald Trump entende por certo e errado. Não obstante, seu comportamento covarde chega a ser nauseante, pois até a última semana seu veto era contra imigrantes de países majoritariamente muçulmanos – Iêmen, Irã, Iraque, Líbia, Síria, Somália e Sudão (por 90 dias) – e de refugiados (por 120 dias). Não há registro nos Estados Unidos de crimes de terrorismo cometidos por pessoas nascidas nos mencionados países.

Trump sabe que seu plano deu errado, ao mesmo tempo em que está ciente de que precisa entregar ao eleitor aquilo que foi prometido na campanha. Como algumas das promessas são impossíveis de serem cumpridas, caso seja mantido o bom senso, a saída é mudar o discurso de forma homeopática, antes que seu governo vá pelos ares.

Essa repentina mudança comportamental é fruto da necessidade de sobrevivência política, sem a qual Trump corre o risco de ser ejetado do cargo. Afinal, até mesmo políticos republicanos já fazem críticas recorrentes às decisões do novo inquilino da Casa Branca.


Cuidado com os chineses

O primeiro sinal dessa mudança de comportamento ficou evidente na conversa telefônica que o presidente dos EUA manteve com o chinês Xi Jinping. Depois de ameaçar a China com promessas de retaliações comerciais, como forma de garantir o emprego dos norte-americanos, e de colocar “combustível” na questão de Taiwan, Trump mudou o palavrório e exalou covardia de ocasião.

Em relação à postura comercial da China, Trump, em dezembro do ano passado, usou o Twitter para acusar o governo de Pequim de “desvalorizar sua moeda”, “taxar demais” as importações americanas e “construir um grande complexo militar” no Mar do Sul da China.

No recente diálogo telefônico, Xi Jinping ouviu do colega norte-americano que os EUA reconhecem o “princípio da China única”, ou seja, a questão de Taiwan ficou à beira da estrada. Se Trump mudou de ideia não se sabe, mas certamente ele mudou a postura em relação aos chineses. E se isso se confirmar, ele terá de dar explicações aos eleitores que acreditaram nas suas estapafúrdias promessas, como, por exemplo, “América em primeiro lugar”.

A razão do recuo de Trump pode estar em um pequeno detalhe, que em termos financeiros não é tão ínfimo. A dívida total dos EUA deve chegar a US$ 20 trilhões ao final de 2017, valor que não cabe na extensa maioria das calculadoras. A dívida pública dos EUA, lastreada em títulos do Tesouro (treasure bills), gira em torno de US$ 14 trilhões.

Do total da dívida pública americana, US$ 5,94 trilhões estão nas mãos de estrangeiros, ou seja, detêm 43% do total (já foi 56%). Entre os maiores credores da dívida pública dos EUA, em primeiro lugar aparece o Japão, com R$ 1,1 trilhão, seguido da China, que tem pouco mais de US$ 1 trilhão. Porém, o mercado financeiro internacional começa a se afastar dos títulos do Tesouro americano por causa das incertezas políticas que rondam a Casa Branca.

No momento em que a China resolver dar uma dura resposta a eventual e estabanada investida de Trump contra o país asiático, o que não é difícil, a correria na Casa Branca será enorme. Entre brincar de ser presidente dos EUA a reboque do histrionismo e deixar o país seguir o seu caminho, a segunda opção é a mais indicada. Sempre lembrando que provocar a China a essa altura dos acontecimentos não é a melhor receita. Em suma, homem laranja “amarelou”.

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