Ser mãe de jornalista é estar o tempo todo na mira da maledicência alheia

(*) Ucho Haddad

Um dia – na verdade em muitos –, alguém ousou dizer ser eu um falso jornalista apenas por não ter esquentado o banco da faculdade. Afirmavam os paladinos da moralidade destroçada que a ausência d’um diploma na parede significava desconhecer os mais rasos princípios da ética. Partiram para esse golpe rasteiro porque meu jornalismo sempre incomodou, como ainda incomoda.

Por ter absorvido a ética na esteira do convívio com meus pais, desde o berço e a mamadeira, respeito os adversários que rotineiramente recorrem ao “filho da puta” para me atacar. O que não significa que têm o meu meu endosso. Apenas sinto pena de gente movida pela pequenez existencial. Diferentemente da forma de agir desses aprendizes de algoz de aluguer, desde cedo aprendi que é preciso estender a mão até mesmo aos mais figadais adversários. E assim faço, pois a vida é um livro sem fim, mesmo ciente da minha inexorável finitude.

Quando a ofensa entra em cena fica evidente que conheço não apenas o mais rebuscado conceito da ética, mas o simplório também. Para o desespero desses safardanas de plantão, estreei na vida com vocação para a escrita. Diante disso, os incomodados que se mudem, que deixem de ler o que escrevo. Sempre lembrando que a borduna continuará rasgando o ar.

Como cantava Jair Rodrigues, “deixa que digam, que pensem, que falem”… Sei de onde vim, desconheço para onde vou. Por isso durmo e acordo com a consciência plena e tranquila, sempre pronto para dar o meu melhor a cada instante, o tempo todo. Como ser humano, como jornalista. É fato que falho vez por outra, por isso sou o melhor produto dos meus próprios erros, graças a Deus, mas incessante é a busca pelo acerto e pela autossuperação.

Por sorte, afinal a vida a mim continua se apresentando com excesso de condescendência, tive duas mães. Uma de verdade, outra também. Uma natural, outra por adoção. Uma branca, outra negra. Dois seres inenarráveis. Uma ainda presente, outra que já se foi. De ambas recebi o melhor. Uma é exemplo de perseverança, outra foi reduto de fé. Ambas extraordinárias, apesar dos defeitos que todos temos. Foram chatas nos momentos certos, foram imprescindíveis também nos momentos certos. Uma é Zuza, outra foi Francisca. Assim é, assim foi. Foram, são, sempre serão.

Pensando bem, para estar jornalista e não se incomodar com os ataques sórdidos que em inúmeras ocasiões tentaram alcançar a honra de cada uma das minhas mães, acabei por criar uma terceira genitora. Uma mãe virtual, obra do imaginário, fruto da necessidade profissional. Idealizada para aplacar o pensamento delinquente daqueles que se opõem aos meus escritos. Alguém inexistente em termos materiais para fazer das ofensas algo ainda mais descabido, sem pé e sem cabeça. Sem razão de ser, coisa de gente tacanha de alma.

O tempo passou e a vida, sempre professora, ensinou-me em várias ocasiões. E continua a ensinar. Com Jânio da Silva Quadros aprendi que o “filho da puta” torna-se infinitamente mais ofensivo quando substituído pelo “filho de puta”. Dizia Jânio que o “de” funciona como endereço daquela cuja honra está à mercê da chula maledicência alheia.

Como às minhas mães os detratores profissionais dedicaram apenas o “da”, não o “de”, fico mais tranquilo – mesmo que a tranquilidade jamais tenha me abandonado –, pois a honra e a dignidade de ambas estão preservadas, como sempre estarão. Em relação à terceira mãe, sparring dos mandriões que cruzam o meu caminho, peço perdão. Afinal, não sei ser diferente e jamais deixaria de fazer o que faço com tanta paixão e dedicação.

Sei que para muitos tenho um jeito esquisito de ser e de existir, mas assim vivo e sou feliz. Sempre no rastro de tudo o que a duplicidade materna me ensinou. Aos que tentam achincalhá-las por temor da verdade ou da divergência ideológica, dedico o meu desprezo. Vez por outra rio desses seres que mais parecem brotar de uma prosopopeia de faroeste, mas a própria insignificância é o que lhes cabe.

Às minhas mães, agradecer é pouco. Quanto às ofensas descabidas, aos pulhas resta dedicar um pouco da baba de Caim. Feliz Dia da Zuza, Feliz Dia da Chica! Feliz, todo dia!

(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, fotógrafo, escritor e poeta.

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