(*) Carlos Brickmann
Lula finalmente prestou depoimento a Sérgio Moro. Encontraram-se em pessoa, falaram olhos nos olhos. Nada aconteceu de espetacular. Não houve briga de torcidas em Curitiba, nem troca de ofensas entre depoente, juiz e promotores. Quem achava que Lula é culpado continua achando, quem achava que Lula é inocente não mudou de ideia. Assunto encerrado.
Encerrado, pois a disputa hoje é menos no campo jurídico do que no eleitoral. É difícil acreditar que tantos delatores diferentes façam descrições tão parecidas do método petista de redistribuir a renda dos outros se algo não for verdade – e sabendo que, se mentirem, perderão as vantagens que já obtiveram e ficarão na cadeia. Lula, no depoimento, vacilou algumas vezes: garantiu que não tem influência no PT, nem no Instituto Lula, e que sua esposa decidia negócios de centenas de milhares de reais sem consultá-lo. Moro, um juiz duro, certamente esteve atento a esse tipo de detalhe.
A sentença de Moro, com possível condenação, deve sair em junho. Lula terá uns 13 meses até que o PT o lance candidato à Presidência da República. Mas, nesse período, se o Tribunal Regional Federal confirmar uma eventual condenação, Lula vira ficha suja e fica inelegível. Os magistrados poderão até permitir que se defenda em liberdade até o processo transitar em julgado, mas ele não poderá ser candidato. E, com o número de processos que sofre, eleger-se presidente é sua única boa saída.
Nus, em segurança
Detalhe saboroso da delação do marqueteiro João Santana e de sua esposa, Mônica Moura: o líder do PT no Senado, Delcídio do Amaral, exigiu que parte das contribuições de empreiteiras à sua campanha fosse depositada em conta clandestina no Exterior. A negociação foi feita na sauna da casa de Delcídio, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Justo: na sauna, nenhum negociador teria como ocultar gravadores ou câmeras.
Vantagem extra
E ninguém teria como botar a mão no bolso dos outros.
Odebrecht? Café pequeno
Marcelo Odebrecht e seus 77 diretores fizeram uma radiografia notável da circulação de dinheiro não só em campanhas eleitorais, mas também como retribuição a atitudes amigáveis dos poderosos da época. Mas nada foi tão espetacular como a delação premiada de João Santana e Mônica Moura: enquanto a Odebrecht se aproximava dos cofres públicos de maneira protocolar – heterodoxa, sim, mas protocolar – João Santana e Mônica Moura é como se fossem da família, conheciam tudo por dentro. Surgiram então as bombas: a narrativa de Mônica segundo a qual o ministro da Justiça de Dilma, José Eduardo Cardozo, contava à presidente tudo que conseguia saber – e não deveria saber, quanto mais espalhar – sobre as ações da Polícia Federal na Lava Jato; e como Dilma, operando um e-mail falso, passava as informações sigilosas aos marqueteiros. Nas duas delações, ambos garantiram que Lula e Dilma sabiam tudo sobre as doações premiadas, e que Lula era o comandante-chefe do esquema – “a instância final”, como o chamavam. E que Dilma, quando tinha uma informação sigilosa a passar-lhes, sem risco de ser interceptada, levava Mônica para passear numa varanda ou nos jardins do palácio.
Detalhes saborosos
Algumas despesas que, conforme Mônica Moura, Dilma Rousseff lhe pediu para pagar: ao cabeleireiro, R$ 40 mil; a uma dama de companhia, R$ 4 mil mensais durante quase um ano; a um operador de teleprompter, (aquele vídeo em que corre o texto para quem fala na TV) R$ 95 mil. A Secretaria de Comunicações tem operadores de teleprompter, a EBC tem operadores de teleprompter, mas Dilma só aceitava um, e pagava por fora.
Carne queimando
A Operação Bullish (referência ao nome em inglês de manobras para elevar o preço de ações em bolsa) atinge a J&F, dona do JBS, maior produtor mundial de carne bovina. Mas a Polícia Federal investiga principalmente como é que o BNDES Participações entrou com mais de R$ 8 bilhões para financiar o crescimento do grupo. É operação para ir longe.
Sem fantasia
O programa de TV do PSDB foi muito interessante: insistiu na ética. Um dos políticos que mais destaque obtiveram foi o presidente nacional do partido, senador Aécio Neves, atingido por delações premiadas. E, segundo depoimento de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, foi apontado por José Dirceu como responsável pela nomeação de uma pessoa de sua confiança numa diretoria da empresa. Aécio não falou sobre isso. O partido, ao que se saiba, ainda não buscou apurar como um dos principais dirigentes da oposição conseguiu nomear gente sua num Governo petista. A troco de que? A propósito, quem é que Aécio teria indicado?
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.