A autofagia deu lugar ao corporativismo na sessão derradeira do julgamento da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso porque o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, visivelmente irritado e quase descontrolado, reagiu com truculência verbal ao rebater pedido formulado pelo vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, que com base na legislação vigente arguiu o impedimento de Admar Gonzaga.
O ministro Admar, que ao longo do julgamento não perdeu uma oportunidade sequer para, de maneira pernóstica, confrontar o relator Herman Benjamin, foi advogado da chapa Dilma-Temer na eleição presidencial de 2010. Não se trata de questionar a idoneidade do ministro Admar Gonzaga, mas de preservar o princípio da imparcialidade, que deve pautar o Judiciário, e não suscitar dúvidas.
Há muito em rota de colisão com o Ministério Público Federal (MPF), Gilmar Mendes, em momento de fúria, subiu o tom com Nicolao Dino, como se a arguição de impedimento fugisse ao que determina a legislação.
Depois de comandar um movimento injustificável para extirpar o conteúdo dos depoimentos de Marcelo Odebrecht, João Santana e Mônica Moura, da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), o presidente da Corte eleitoral disse que o MPF precisa respeitar o “princípio da lealdade processual”.
Se há alguém, no presente momento, que não tem condições de falar em lealdade processual, esse é Gilmar Mendes, que ao longo do processo, como um todo, mostrou ser desleal consigo mesmo e com a própria consciência.
Quando, contrariando decisão da ministra Maria Thereza de Assis Moura, à época integrante do TSE, de arquivar o processo que visava a cassação da chapa liderada pelo PT, Gilmar Mendes disse, ao fazer referência aos ilícitos na campanha de Dilma: “Há dados fortes [de irregularidades] e vamos ignorar isso na ação?”.
O próprio Gilmar Mendes, que foi relator da ação sobre a contabilidade da chapa encabeçada por Dilma, disse em 2015 que demorou a concluir seu voto por conta dos muitos casos de corrupção envolvendo o tema.
Há dois anos, o pensamento de Gilmar Mendes acerca da importância das provas de corrupção era distinto, mas agora, desconhece-se a razão, ele se contradiz com toda a desfaçatez que lhe é peculiar.
O mesmo Gilmar participou da sessão que decidiu pela produção de novas provas, abrindo tempo para que o ministro Herman Benjamin ouvisse Odebrecht, Santana e Moura, mas agora sente-se à vontade para votar pelo descarte do conteúdo dos respectivos depoimentos. Mesmo assim, o presidente do TSE exige respeito à Corte e ao princípio da lealdade processual.