Operação Marquês: esquema criminoso em Portugal pagou mais de 600 mil euros ao petista José Dirceu

Uma empresa do Grupo Espírito Santo (GES) e outra ligada à Portugal Telecom (PT) pagaram ao petista José Dirceu “pelo menos 632 mil euros” entre 2007 e 2014. A informação é da jornalista Ana Henriques, do jornal português “Público”.

De acordo com o Departamento Central de Investigação e Ação Penal, o dinheiro serviu comprar a influência do outrora chefe da Casa Civil do governo Lula, condenado várias vezes por corrupção e outros crimes. O objetivo da investida criminosa foi favorecer a Portugal Telecom e os interesses do GES em negócios que envolviam empresas públicas brasileiras, informa o Ministério Público (MP) de Portugal.

Segundo dados da Operação Marquês, que levou o ex-primeiro-ministro José Sócrates à prisão, a maior parte do dinheiro foi transferida por ordem do antigo banqueiro Ricardo Salgado (Banco Espírito Santo). O pagamento da propina teve como intermediário o advogado português João Abrantes Serra, também investigado na Operação Marquês, mas que acabou livre da acusação.

O Ministério Público português ressalta que as investigações ainda não desaguaram em acusação porque faltavam provas dos crimes que estão sob lupa. O MP destaca que o advogado Abrantes Serra era amigo do irmão de Dirceu, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, com quem, em 2014, criou uma empresa.

Três anos mais tarde, em 2007, Abrantes Serra conclui com os dois irmãos (Dirceu e Luiz Eduardo) a “concertação [acordo] de esforços no sentido de, através do estabelecimento de contatos, em Portugal e no Brasil, pressionar entidades políticas e a administração de empresas públicas para a obtenção de decisões favoráveis a interesses empresariais portugueses e brasileiros”, escreve o procurador Rosário Teixeira no primeiro depoimento do advogado, tomado em dezembro de 2016.

Entre os negócios escusos citados está a decisão da Portugal Telecom de investir na Oi, negócio que terminou com a fusão das duas empresas e com a subsequente venda da antiga operadora portuguesa de telecomunicações à Altice.


A entrada da Portugal Telecom no capital da Oi, diz Rosário Teixeira, “era do interesse de alguns quadros da administração não executiva da PT, caso de Henrique Granadeiro, e de alguns acionistas da mesma PT, caso do BES”. De forma a aproveitar tal conjunto de interesses, continua o procurador, “que envolvia a Andrade Gutierrez [construtora brasileira envolvida no caso Lava Jato], o BES e alguns elementos da administração da Portugal Telecom, o referido José Dirceu de Oliveira, utilizando os seus conhecimentos junto dos responsáveis políticos brasileiros, dispôs-se a contatar as entidades portuguesas no sentido de, através da promessa de condições favoráveis ao investimento da PT na Oi e da promessa de serem gerados ganhos com o negócio, conseguir uma decisão favorável para tal investimento”.

Condenado diversas vezes à prisão, José Dirceu não foi acusado na Operação Marquês. Issi não foi possível porque “no período de tempo em que alegadamente ocorreram os factos” o crime de tráfico de influência implicava que a entidade pública visada pela influência fosse “uma entidade titular de um cargo público no Estado português e não num Estado estrangeiro”, como era o caso.

Rastro dos pagamentos

Antes de chegar a essa conclusão, o MP identificou o caminho dos pagamentos feitos a José Dirceu, sempre através da empresa do advogado Abrantes Serra. O esquema, descreve o MP de Portugal, era estabelecer “pretensos contratos de prestação de serviços” que serviam de fachada para os pagamentos que depois eram parcialmente encaminhados a Dirceu.

No despacho de arquivamento, o MP refere que o gasto foi “repartido, em partes iguais, entre a sociedade de advogados e José Dirceu”. “O primeiro desses pretensos contratos de prestação de serviços veio a ser acordado apenas verbalmente, ainda em 2007, com Henrique Granadeiro, que na altura era presidente não executivo da PT”, escreveu o MP no primeiro depoimento de Abrantes Serra.

A Espírito Santo Financial, holding do GES, pagou, demarco de 2011 a julho de 2014, pelo menos 30 mil euros mensais ao advogado, valor dividido em partes iguais entre este e José Dirceu. Somente o petista recebeu um total de 585 mil euros, além do pagamento de despesas por meio de cartão de crédito vinculado a uma conta bancária controlada pelo advogado português. (Com informações do jornal Público)

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