(*) Carlos Arouck
Foi instalado, em caráter “extraordinário”, o Ministério Extraordinário da Segurança Pública, com o objetivo de coordenar a segurança pública brasileira sem interferir no papel de proteger o cidadão, desempenhado pelos estados e municípios. Apesar de a segurança pública, em sua maior parte, ser de competência dos estados, o Palácio do Planalto tem sido cada vez mais cobrado pela crise no setor. Como conseguirá montar uma estrutura que coordene todas as ações sem invadir competências alheias é um verdadeiro mistério, pois ficaria instituída de forma definitiva a interferência federal em área de jurisdição estadual e municipal.
Esse ministério chega no momento em que ocorre no Rio de Janeiro a intervenção federal, com o intuito de dar um alento à população fluminense, que não tem mais como viver dignamente e sem medo constante. Fora as mortes, tiroteios, agressões e assaltos constantes, há o terror psicológico, o estresse contínuo, a ansiedade e as fobias que dominam os cidadãos em sua tentativa diária de levar a rotina de trabalho, estudo e lazer como sobreviventes de uma guerra travada no mundo real e nas mentes das pessoas também. Mesmo quando um filho sai de casa para ir ao cinema ou à balada e nada de mal acontece, os pais suspiram aliviados somente no momento em que escutam a chave rodar na porta de casa. Por esse e outros motivos, a utilização das Forças Armadas no campo da segurança pública fluminense, em circunstância de caos, recebe o apoio do povo e dispensa as críticas alardeadas pelos intelectuais sobre a inconveniência da medida, que em nada acrescentam, uma vez que o processo já foi aprovado e começou.
Agora, com relação ao novo ministério, a Constituição no seu artigo 144 deixa claro que a segurança pública é “dever do Estado” e deve ser exercida pelas Polícias Federal, Rodoviária Federal, civis, militares e Corpos de Bombeiros militares. A nova pasta precisa respeitar as estruturas previstas na Carta Magna. No entanto, a guerra política e corporativa já começou, as indicações para o titular do futuro ministério quase todas desagradaram, com nomes ultrapassados que falharam nas funções dessa área no passado bem recente e permitiram chegarmos no ponto caótico em que estamos. Por sua vez, a situação das polícias é, de certo modo, desesperadora e sem perspectiva: a novidade representada pela criação desse ministério vem travestida de “soluções” não consensuais. Uma das indicações propostas é a transferência de alguns órgãos do Ministério da Justiça, como a Polícia Federal, para o novo ministério. Mudam os atores da peça de teatro, mas a história continua a mesma. Soa, no mínimo, estranho, passar a PF de um ministério para outro… Alia-se a isso o deslocamento do atual ministro da Defesa, Raul Jungmann, para o comando do órgão, mais um troca-troca. Não é à toa que há acusações de uso de uma questão de importância nacional para fins eleitoreiros, com o objetivo de desviar o foco da tentativa fracassada de reforma da previdência. Afinal, o assunto é um dos que mais preocupa os brasileiros e nenhum político pode deixar o tema de lado.
A população, público alvo principal, não sabe como funciona o sistema de segurança pública existente, nem o que pretende ser criado, tampouco sabe precisar de quem é a culpa pela situação de insegurança atual. Na avaliação das pessoas, o Executivo das três esferas, as várias polícias — Força Nacional de Segurança, Polícia Federal, polícias estaduais e guardas municipais —, o sistema carcerário, o Judiciário e o Legislativo não se distinguem em seus papéis, enquanto a situação só piora. Priorizar o lançamento de uma nova pasta em detrimento de investir na Secretaria já criada faz com que esse ministério nasça sob a desconfiança dos próprios órgãos que o compõem.
Termino citando Míriam Leitão: “A criação do Ministério da Segurança não representa coisa alguma, a não ser a transferência de órgãos de um lado para outro da Esplanada, já muito abarrotada de ministérios, e mais cargos para nomeação”.
(*) Carlos Arouck – Agente de Polícia Federal, é graduado em Direito e Administração de empresas, com especialização em gerenciamento empresarial. Já ministrou cursos na área de proteção e vigilância. Instrutor da Academia Nacional de Polícia, trabalhou no setor de segurança de dignitários, estadistas e autoridades, como Papa João Paulo II, Lady Diana Spencer, Imperador Akihito, Mikhail Gorbachev, Margareth Thatcher, entre outros. Participou como agente de segurança cós maiores eventos do País desde a ECO 92, além de audiências, seminários e palestras sobre segurança pública.