Caso renda-se à vaidade e aceite o convite de Bolsonaro para assumir a Justiça, Moro cometerá um erro

Responsável na primeira instância do Judiciário pelas ações penais decorrentes da Operação Lava-Jato, o juiz Sérgio Fernando Moro está a “meter os pés pelas mãos”, como prega a sabedoria popular. Com a vitória de Jair Bolsonaro nas urnas, Moro já não consegue disfarçar a euforia diante da possibilidade de integrar o governo do presidente eleito, eventualmente como ministro da Justiça. Essa possibilidade foi comemorada pela esposa do magistrado, a advogada Rosângela Wolff Moro, que nas redes sociais comentou eufórica o eventual convite de Bolsonaro.

Integrar um governo que antes de começar oficialmente flerta insistentemente com o obscurantismo e já se envolveu em polêmicas contra o Estado de Direito exige, no mínimo, tempo redobrado para reflexão. Aceitar de chofre um convite desse naipe é dar espaço ao histrionismo. Isso não significa que Moro seja histriônico, mas é preciso coragem para assumir o Ministério da Justiça à sombra de um presidente da República que é visto pela maioria como uma ameaça à democracia.

A obsessão de Jair Bolsonaro em ter Moro em sua equipe de governo pode ser aliviada com a indicação do juiz da Lava-Jato para o Supremo Tribunal Federal (STF), mas o magistrado teria de aguardar até 2020, quando o ministro Celso de Mello, o decano da Corte, completará 75 anos e terá de se aposentar compulsoriamente.

Em termos práticos e lógicos, a indicação ao STF é a situação mais segura para Sérgio Moro, pois o cargo é vitalício, além de ser uma espécie de honraria àqueles que operam no universo do Direito. O que nem sempre é verdade, pois a Corte já recepcionou alguns néscios em termos jurídicos. Pois bem, a eventual chegada de Moro ao STF o impediria de julgar os réus da Lava-Jato que porventura recorram à máxima instância do Judiciário nacional. Por outro lado, lhe dará a chance de julgar os réus que beneficiados pelo foro privilegiado escaparam da primeira instância.

Deixando de lado essa faca de dois gumes, caso aceite o convite para comandar o Ministério da Justiça, Sérgio Moro estará assumindo o risco de a qualquer momento ser demitido pelas chamadas “forças ocultas”, algo comum nos bastidores do poder. E quem conhece a política nacional em suas entranhas sabe que isso é verdade. Entre trocar a pasmaceira do que é certo pelos os holofotes da incerteza, a primeira opção é a mais recomendada. Porém, vaidade é como roupa feita sob medida.


No caso de Jair Bolsonaro, que precisa mostrar à opinião pública que é capaz de montar um governo com notáveis, o melhor a essa altura é colocar na pasta da Justiça um nome respeitado no meio jurídico e que tenha boa interlocução com o Supremo. Não por acaso, o ex-ministro Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, foi sondado para assumir o posto.

Ponderado e apaziguador de mão cheia, Ayres Britto é um jurista conceituado e com bom trânsito nos escaninhos da Suprema Corte, onde deixou amigos e ainda cultiva ótimas relações. Ex-petista e alinhado à esquerda, Ayres Britto é um homem à frente do seu tempo e que demonstrou inquestionável coerência jurídica em suas decisões enquanto ministro do Supremo. Em outras palavras, o viés ideológico não macula sua reputação como jurista.

O nome de Ayres Britto passou a orbitar o núcleo duro da campanha de Jair Bolsonaro após alguns episódios que foram considerados como ameaças à democracia e ao Estado de Direito. O mais recente foi a divulgação do vídeo em que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, afirmou que para fechar o STF eram necessários apenas um soldado e um cabo. Foi o suficiente para que luzes de alerta fosse acesas na Praça dos Três Poderes.

Depois disso, Bolsonaro teria recebido avisos de autoridades de que o melhor seria moderar o discurso, antes que o caldeirão entornasse. Alguns recados tornaram-se públicos, mas os principais, os mais contundentes, aconteceram intramuros e teriam partido das Forças Armadas, do próprio STF e da Procuradoria-Geral da República. Ao que parece, surtiram os feitos desejados.

Para não colocar tudo a perder, Bolsonaro colocou em cena o “Jairzinho Paz e Amor” e passou a defender de maneira surpreendente a Constituição, o Estado Democrático de Direito e a liberdade de expressão. Pero no mucho!