Aliados de Bolsonaro tentam aprovar na CCJ do Senado ampliação da Lei Antiterrorismo

O governo do presidente eleito Jair Bolsonaro ainda não estreou, mas começou mal. Não bastassem os sequenciais absurdos vociferados pelo próprio Bolsonaro e seus sequazes, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado tenta votar nesta quarta-feira (31) o projeto que revê o enquadramento como atos de terrorismo as ações de movimentos sociais.

A proposta é do senador Magno Malta (PR-ES), que vai ao encontro do discurso de Bolsonaro contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), altera a Lei Antiterrorismo sancionada em 2016 e inclui na nova definição desses crimes atos para “coagir governo” a “fazer ou deixar de fazer alguma coisa, por motivação política, ideológica ou social”.

Malta, que é próximo a Jair Bolsonaro e não foi reeleito, mas deve ter cargo no novo governo, é relator da proposta de autoria do senador Lasier Martins (PSD-RS).

Durante a campanha, Bolsonaro fez duras e seguidas críticas aos sem-terra, reforçando a tese que seu governo desrespeitaria a democracia, como tem demonstrado em muitas declarações. Na noite da última segunda-feira (29), durante entrevista a emissoras de televisão, o presidente eleito disse que não dialogará com o movimento. “Eu vou fazer a faxina. A faxina será em cima dos que não respeitam a lei, como o pessoal do MST”, afirmou.

A votação da matéria na CCJ não será fácil, uma vez que os aliados de Bolsonaro enfrentarão resistência por parte de muitos parlamentares. O senador Randolfe Rodrigues (Rede), por exemplo, apresentou voto separado em que classifica o texto inconstitucional. É preciso reconhecer que, gostando ou não, a justificativa do senador Randolfe é correta, pois fere o que estabelece a Carta Magna em relação à liberdade.


A procuradora da República Deborah Duprat, dos Direitos Humanos, afirma que a lei antiterrorismo não pode tolher liberdades. “Sociedades democráticas têm que conviver com manifestações, reuniões e protestos. O que exceder as chamadas “liberdades expressivas” e eventualmente configurar crime deve ser tratado no âmbito do direito pena”, disse.

Convém lembrar que a Constituição trata o terrorismo no mesmo artigo que trata dos “direitos fundamentais” (artigo 5º). Significa dizer que leis que tratam de terrorismo jamais podem ter o efeito inibidor das liberdades de manifestação, reunião, associação e protesto — acrescentou Deborah.

Há uma diferença considerável entre fazer valer a lei vigente e recusar-se ao diálogo. No momento em que o Estado fecha as portas para qualquer possibilidade de negociação, o caminho dos movimentos sociais é a radicalização. Isso significa que o horizonte aponta para tempos difíceis e sombrios no futuro.

Jair Bolsonaro, muito estranhamente, passou a ser um adorador da Constituição, ao mesmo tempo em que condena os governos petistas pelo viés ideológico, mas vem atuando nos bastidores para que seus aliados votem no Congresso matérias de seu interesse, desrespeitando a Carta Magna e seguindo sua promessa de campanha, que é eliminar a esquerda.

Tomando por base o fato de que o artigo 5º da Constituição, mencionado pela procuradora Deborah Duprat, é cláusula pétrea, é enorme a chance de a matéria que encontra-se na CCJ do Senado, se aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente da República, acabe no Supremo Tribunal Federal a reboque de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade.