(*) Marli Gonçalves
Chegou dezembro, com os seus ho-ho-ho, luzinhas piscantes coloridas, árvores enfeitadas e renas estilizadas despregadas de sótãos, porões e garagens onde se abrigaram empilhados durante todos os outros dias. Todo mundo se programa até para o que vai comer no fim do mês. Tempos complicados para os seres mutáveis que só querem a alegria de volta nos dias seguintes que chegarão ao ano que vem
Acho lindo e respeito quem tem condições de se organizar, planejar metodicamente todos os passos adiante, preparar até o pé-de-meia. Principalmente em um momento tão atribulado como o que passamos aqui na terrinha.
Nunca consegui. Fora isso, tenho horror, sempre tive, a compromissos agendados com muita antecedência. Nem aniversário, o meu, gosto de comemorar, marcar nada, porque no dia posso, e vai ser normal, eu não querer ir, e tem uma certeza que sempre tive: o dia é meu, faço o que quiser, embora quase sempre passe mesmo na mesma, trabalhando, que é o que tem para hoje e o que quase sempre ocorreu nos dias 8 de junho. Manter a cabeça fora d`água para continuar respirando. Exercitando a apneia quando tentam te dar um caldo, e você quer tentar emergir.
Ser mutável, pensa, não é fácil não. E Deus me fez mutável. Veja que isso também não quer dizer que seja ruim, ser mutável também é ser versátil, variado, e até volúvel. Adoro. É, mais ainda, não ser uma coisa só, birrenta, que fica batendo pezinho muito tempo. Não deu, não deu, vambora, vambora.
Por mim realmente os dias seriam sempre diferentes, cheios de novidades e aprendizados. Eu teria o luxo de poder usar inúmeras personalidades, exercitar todos os meus alteregos inclusive visualmente. Escrever como diferentes personagens, nomes e pseudônimos. Não desisto de conseguir essa liberdade verdadeira um dia.
Só que a realidade é dura. A gente não vive só com a gente, convive e depende de outras pessoas, dos acontecimentos, das compreensões, e estas teimam em podar os ímpetos, ou querendo impor tudo dentro da rotina, uma coisa engessada. Confortável para eles.
Até mudar de ideia anda complicado, com esse bando de gente de um ou do outro lado do rio, nas margens; e poucos navegando nas fluidas águas do futuro.
Dezembro chegou, e com ele todo o rol daquelas coisas que todo ano se repetem, novamente todo mundo contando para onde vai, perguntando para onde você vai, correndo para ser bonzinho, e também para mandar para cima de outro alguém tudo o que podia ter sido feito durante todo o ano. Começa o corre-corre. Os apelos, e com eles, a tristeza, a sensação de vazio e decepção. As revisões.
No Brasil desses dias, em que estamos em suspensão – não negue, porque ninguém tem condições de saber no que vai dar tudo isso, o novo Governo, o novo presidente e sua saúde, as pessoas que estão sendo instaladas nos locais, as decisões que dão dois passos para a frente e três para trás – seres mutáveis como eu sofrem muito.
Queremos pensar positivo, manter o otimismo, além, mas sempre surgem obstáculos, incertezas que nos amarram numa angustiante mesmice, dependências que tiram a paz de qualquer atitude criativa. Afinal, se não dá para pensar nem no dia seguinte, ficamos tolhidos, tentando acertar o passo, com medo de cair nos inúmeros fossos destampados, do qual não param de sair e surgir assombrações e ameaças.
Não dá para viajar. Nem em pensamento. Mas dá para se distrair um pouco. Por isso – só por isso – é bom ser mutável.
(*) Marli Gonçalves, jornalista – As gravações do meu programinha de um minuto – #ADEHOJE, #ADODIA (acompanhe! Estrelando nas redes sociais e nos nossos sites) – pelo menos têm me ajudado a cada dia poder pensar diferente sobre os fatos.
Fim de ano, 2018
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