Acusado de agredir a ex-mulher, ministro Admar Gonzaga desiste de novo mandato no TSE

Acusado de lesão corporal em um caso de violência doméstica, o ministro Admar Gonzaga, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), comunicou ao Supremo Tribunal Federal (STF), na última semana, sua desistência de ser reconduzido ao cargo por período de dois anos.

Essa decisão já era esperada, uma vez que sua ex-mulher, Élida Souza Matos, vítima de agressão, entrou com pedido na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que a instituição suspenda o direito de advogar do ainda ministro do TSE. Considerando que o pedido apresentado à OAB pode fazer com que Admar perca o assento no TSE, uma vez que ocupa vaga destinada a advogados, a desistência a movo mandato era o caminho natural.

A suspensão do direito de advogar faz parte da denúncia apresentada por Élida, que acusa o ex-marido de agressão física e de contratar um detetive para persegui-la. Admar Gonzaga nega as acusações.

No documento, Élida Matos solicita que a suspensão vigore até que sua acusação seja julgada pelo Tribunal de Ética da OAB. Ela argumenta que o simples fato de a Procuradoria-Geral da República (PGR) ter aceitado a denúncia contra Admar Gonzaga prova a autoria da agressão. A vítima recorre ainda a uma súmula aprovada em março passado pela Ordem dos Advogados do Brasil, que impede que agressores de mulheres sejam inscritos na instituição.

O processo em que Admar é acusado de agredir sua ex-esposa tramitava no Supremo até a semana passada, quando o ministro Celso de Mello decidiu enviá-lo para o Tribunal de Justiça do DF, por entender que o caso não se encaixa no novo entendimento do foro privilegiado, que só vale para os crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo.

A partir de agora cabe ao STF aprovar a lista tríplice que será analisada pelo presidente Jair Bolsonaro, que definir os nomes dos ministros do TSE que representam a classe dos advogados. Outro ministro cujo mandato no TSE termina em breve (9 de maio) é Tarcísio Vieira. Ambos – Admar e Tarcísio – integram a Corte eleitoral como representantes da OAB.

As escolhas para o TSE são importantes para Bolsonaro, já que a campanha do capitão à Presidência da República é alvo de oito processos que apuram supostas irregularidades, como disparo em massa de mensagens no aplicativo WhatsApp contra o PT, ataque cibernético ao grupo de Facebook “Mulheres Unidas contra Bolsonaro” e outdoors espalhados com o nome de Bolsonaro em diversos municípios brasileiros. A defesa da campanha nega irregularidades.

Não obstante, Admar Gonzaga já advogou para Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), conhecido como “Pitbull” ou “Zero Dois”, garantindo na Justiça o direito do filho do presidente da República de concorrer ao cargo de vereador no início de carreira, aos 17 anos. Em 2000, Carlos tornou-se o mais jovem vereador da história do Brasil. O próprio Jair Bolsonaro já chamou Admar de “meu peixe” perante interlocutores.

Porém, Jair Bolsonaro, que tanta ojeriza tem da esquerda, não considerou o fato de Admar um dia ter advogado para o PT, assim como para o Democratas e o PSD. Ou seja, Admar Gonzaga não é “peixe” apenas de Bolsonaro, mas de boa parte da política nacional.

Com a desistência de Admar Gonzaga, a expectativa dentro do TSE é a de que o ministro substituto Sérgio Banhos seja efetivado como titular. A articulação nos bastidores é sobre os demais nomes que integrarão as listas tríplices e assumir uma vaga de substituto – entre os nomes ventilados estão a ex-ministra Grace Mendonça e o advogado Flávio Pansieri, atual diretor da Escola Judiciária Eleitoral da Corte.

Cabe ao ministro substituto julgar durante as eleições questões envolvendo propaganda eleitoral e eventualmente substituir algum titular em caso de ausência ou impedimento. A recondução de Tarcísio Vieira por mais dois anos é considerada praticamente certa por integrantes do TSE.


Na agressão à ex-mulher, a culpa foi do Listerine

O ministro teria pedido ao advogado Alexandre Luiz Amorim Falaschi para contratar um investigador particular com o objetivo de seguir sua mulher, Élida Souza Matos, de acordo com depoimento prestado pelo próprio advogado na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM) de Brasília. O detetive Ailton Francisco Ferreira afirmou que instalou um rastreador no carro de Élida. Em julho de 2017, a esposa de Admar Gonzaga registrou boletim de ocorrência acusando o ministro de agressão, mas depois retirou a queixa.

Em novembro de 2017, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, denunciou Admar ao Supremo Tribunal Federal (STF) por lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher.

Mesmo com a renúncia de Élida à acusação, o caso seguiu no STF, onde ministros do TSE têm prerrogativa de foro. “A retratação realizada pela vítima, por ser írrita (nula, sem efeito), não possui qualquer eficácia em relação ao noticiado delito de lesões corporais, cabendo ao Ministério Público adotar as providências que entender cabíveis”, explicou Celso de Mello.

De acordo com o laudo de exame de corpo de delito, houve “ofensa à integridade corporal ou à saúde”, e o meio que produziu essa ofensa foi “contundente”. Atendida no IML, a mulher do ministro apresentava, segundo o laudo, “edema e equimose violácea em região orbital direita”. Ela alegou ter sido agredida com empurrões.

Em outubro de 2017, Admar Gonzaga enviou sua defesa ao STF. Na manifestação, o ministro relatou que a mulher havia recebido a notícia de uma doença, ingerido bebida alcoólica sem se alimentar, e uma crise de ciúmes acabou desencadeando a briga entre os dois. Admar confirmou que empurrou a mulher, mas disse que o fez em sua defesa e “que o movimento não foi empregado como meio deliberado de agressão”. Ressaltou o ministro que seus movimentos foram em defesa própria.

“Não são fatos, mas a versão expressada por uma pessoa acometida de grave crise de ciúmes, e que havia degustado algumas taças de vinho a mais, sem o acompanhamento de adequada alimentação. Assim como agravante para a desestabilidade emocional, sucedeu-se a descoberta de doença autoimune, denominada esclerodermia, conforme já revelado em petição da própria requerente, muito atormentada pela exposição que estamos sofrendo”, alegou.

Admar Gonzaga também deu ao STF explicações sobre o hematoma no olho de sua esposa, que consta do laudo do IML de Brasília. Alegou que Élida escorregou em um enxaguante bucal e bateu o rosto na banheira. “Tal lesão, pelo que me recordo, foi causada pelo tombo que se sucedeu ao escorregão que sofreu sobre o Listerine, e que a levou a bater com o rosto na banheira, mas jamais em face do alegado empurrão em seu rosto.”