Guaidó afirma ter o apoio de militares dissidentes para derrubar o ditador venezuelano Nicolás Maduro

Em mensagem de vídeo, gravada na companhia de vários militares dissidentes, o autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, afirmou nesta terça-feira (30) que integrantes das Forças Armadas venezuelanas deram “finalmente e de vez o passo” para acompanhá-lo e conseguir “o fim definitivo da usurpação” do governo de Nicolás Maduro. Enquanto isso, o governo chavista disse estar “enfrentando e desativando” um plano de golpe de “militares traidores”.

“Hoje, valentes soldados, valentes patriotas, valentes homens apegados à Constituição acudiram ao nosso chamado”, disse Guaidó em vídeo de três minutos divulgado no Twitter, aparentemente gravado pouco antes do amanhecer na base militar La Carlota, no setor leste de Caracas. “O momento é agora. A cessação definitiva da usurpação começou hoje.”

“São muitos os militares. A família militar de uma vez [por todas] deu o passo. A todos aqueles que estão nos ouvindo: é o momento, o momento é agora, não só de calma, mas de coragem e sanidade para que chegue a sanidade à Venezuela. Deus os abençoe, seguimos adiante. Vamos recuperar a democracia e a liberdade na Venezuela”, disse o líder da oposição.

“As Forças Armadas tomaram a decisão correta e podem contar com o apoio do povo da Venezuela, o apoio da nossa Constituição, a garantia de que estão do lado certo da história. Hoje, como presidente da Venezuela, como legítimo comandante em chefe das Forças Armadas, convoco todos os soldados, toda família militar, a nos acompanhar nesta façanha como sempre fizemos, no marco da Constituição, no marco da luta não violenta”, afirmou Guaidó.

Na mensagem, Guaidó convocou às ruas todos os venezuelanos que se comprometeram nas últimas semanas a se manifestar para exigir a saída de Maduro.

“Povo da Venezuela, é necessário que todos saiamos às ruas, apoiemos a democracia e recuperemos nossa liberdade. Organizados e unidos, devemos nos deslocar às principais instalações militares. Povo de Caracas, todo mundo para La Carlota”, convocou Guaidó.

O ministro da Comunicação da Venezuela, Jorge Rodríguez, comunicou que o governo de Maduro está “enfrentando e desativando uma tentativa de golpe de Estado”.

“Informamos o povo da Venezuela que estamos neste momento enfrentando e desativando um pequeno grupo de militares traidores que se posicionaram no Distribuidor Altamira para promover um golpe de Estado e contra a Constituição e a paz da República”, disse o ministro.

“A esta tentativa se juntou a extrema direita golpista e assassina, que anunciou sua agenda violenta há meses. Pedimos ao povo que permaneçam em alerta máximo para, junto com a gloriosa Força Armada Nacional Bolivariana [FANB], derrotar a tentativa de golpe e preservar a paz”, prosseguiu Rodríguez.


Além de alguns militares, Guaidó estava acompanhado do oposicionista venezuelano Leopoldo López, que foi libertado nesta terça-feira em Caracas, onde cumpria pena de quase 14 anos de prisão domiciliar.

Em breve mensagem emitida do lado de fora da base da Força Aérea, López disse ter sido libertado por militares que apoiam Guaidó e acrescentou que “hoje, as pessoas estão muito cientes de que as coisas precisam mudar”.

“O povo e as Forças Armadas vão conseguir o fim da usurpação, um governo de transição e eleições livres”, encerrou López aos gritos de “Venezuela livre!”.

O pai de Leopoldo López, que reside em Boston (EUA), confirmou por telefone que o oposicionista recebeu “indulto presidencial” de Guaidó, reconhecido como chefe de Estado venezuelano por dezenas de países europeus e do continente americano, inclusive Brasil, Alemanha e Estados Unidos.

“Hoje começa a Operação Liberdade em toda a Venezuela para acabar com a usurpação de Nicolás Maduro”, acrescentou o pai do oposicionista venezuelano.

O fundador e líder do partido Vontade Popular (VP) se entregou às autoridades venezuelanas em 18 de fevereiro de 2014, depois que um tribunal de Caracas ordenou a prisão por instigar a violência no papel de um dos organizadores de uma manifestação que havia sido realizada seis dias antes e terminou com três mortos e dezenas de feridos.


Ele foi transferido para uma prisão militar acusado dos crimes de incitação à desordem pública, associação para cometer um crime, danos matérias e incêndio. López acabou condenado em setembro de 2015 a 13 anos, nove meses, sete dias e 12 horas de prisão. Desde meados de 2017, López cumpria a pena em prisão domiciliar.

O ex-promotor Franklin Nieves, que acusou López, afirmou em outubro de 2015 que o processo judicial havia sido “uma farsa” e que ele tinha sido pressionado por Maduro e vários superiores dentro do Ministério Público para defender “provas falsas” contra o opositor.

Em 2018, a procuradora-geral Luisa Ortega Díaz, chefe do Ministério Público, denunciou ter sido pressionada por Diosdado Cabello – presidente da Assembleia Nacional da Venezuela na época da detenção de López – a acusar o opositor das mortes de Bassil Da Costa e Juan Montoya nos protestos.

Grupo de Lima

O chanceler da Colômbia, Carlos Holmes Trujillo, pediu nesta terça-feira uma reunião de emergência do “Grupo de Lima” para tratar da nova situação de crise na Venezuela, após Juan Guaidó anunciar ter o apoio de um grupo de militares venezuelanos contra o ditador Nicolás Maduro.

“Faço um chamado a todos os países-membros do Grupo de Lima para que hoje continuemos nossa tarefa de apoiar o retorno da democracia e da liberdade na Venezuela e definamos (como fazer isso) de comum acordo uma reunião de emergência”, escreveu Trujillo em sua conta no Twitter.

Em outra mensagem, o ministro de Relações Exteriores colombiano afirmou que, por instruções do presidente Iván Duque (Colômbia), já avançou na “comunicação com os países do Grupo de Lima para convocar a reunião de emergência”.

Criado em agosto de 2017 na capital colombiana com o objetivo de encontrar soluções para a grave crise na Venezuela, o “Grupo de Lima” é formado por Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru, Guiana e Santa Lúcia.

Maduro fala em golpe

O ministro da Comunicação da Venezuela, Jorge Rodríguez, publicou nas redes sociais mensagens em que afirma ser o movimento liderado por Guaidó um “golpe de Estado”. “Estamos enfrentando e desafiando um reduzido número de efetivos militares traidores que se posicionaram para tentar um golpe de Estado”.

Por outro lado, o ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino López, afirmou que há normalidade nos quartéis, o que contradiz as informações não confirmadas que crescem em número com o passar das horas.

Também nas redes sociais, Padrino López publicou que “as Forças Armadas se mantêm firmes na defesa da Constituição e de suas autoridades legítimas”. “Todas as unidades militares das oito regiões de defesa integral reportam normalidade em seus quartéis e bases, sob mando de seus comandantes naturais”, escreveu o ministro.

Em declaração na TV estatal VTV, na qual classificou a ação de Guaidó como um “espectáculo grotesco”, o dirigente chavista Diosdado Cabello convocou uma manifestação em frente Palácio Miraflores, sede do Executivo venezuelano, em Caracas. Já o ministro das Indústrias, Tareck El Aissami, disse que o levante pró-Guaidó é “minúsculo, microscópio”.

Desdobramentos

Considerando que as informações ainda não são oficiais, causa preocupação o que pode acontecer nas próximas horas, pois ainda não se sabe de que lado ficarão os “coletivos” formados por sicários (milicianos), que passam de 1 milhão de integrantes e contam com armamentos potentes e em quantidade.

A convocação de uma reunião de emergência do “Grupo de Lima” se explica pela necessidade de uma solução negociada, o que evitaria um banho de sangue na Venezuela, já que Nicolás Maduro e seus aliados, na maioria militares de alta patente, prometem resistir.

No contraponto, autoridades venezuelanas e internacionais se movimentam nos bastidores no âmbito de uma negociação para garantir a saída de Nicolás Maduro do país, assim como de seus principais assessores.

Um eventual exílio em Cuba não está descartado, já que o governo de Havana, que na era de Hugo Chávez foi largamente beneficiado pelo regime chavista, já se colocou à disposição para receber Maduro e seus asseclas. China e Rússia, que apoiam o ditador venezuelano, também são considerados como possíveis destinos dos principais integrantes do atual governo da Venezuela (Com informações da Deutsche Welle e agências internacionais)