Após o Senado aprovar projeto contra abuso de autoridade, a banda histriônica da Lava-Jato reage

O Senado aprovou, na quarta-feira (26), o projeto de lei que define e pune o abuso de autoridade praticado por juízes e membros do Ministério Público. O texto estava parado desde 2017 e voltou a tramitar com celeridade em meio ao escândalo que envolve o ministro da Justiça, Sérgio Moro, cuja conduta como juiz à frente da Lava-Jato, entre 2014 e 2018, passou a ser alvo de questionamentos após a revelação de trocas de mensagens com membros da força-tarefa da operação.

A medida sobre abuso por parte de autoridades foi aprovada dentro do chamado pacote de “dez medidas contra a corrupção”, projeto de iniciativa popular originalmente defendido por membros da força-tarefa da Lava-Jato, mas que foi alterado pela Câmara dos Deputados no final de 2016.

À época, as mudanças foram alvo de críticas e os deputados foram acusados de desfigurar o projeto, enfraquecendo várias das medidas e incluindo os chamados “jabutis” em meio ao texto. No jargão político, “jabuti” é a prática de inserir em proposta de lei uma emenda que não tem qualquer relação com o texto.

Após a aprovação na Câmara, o projeto seguiu para o Senado, mas pouco avançou nos últimos dois anos. Isso mudou há duas semanas, quando o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), relator do projeto, apresentou seu parecer modificando alguns pontos aprovados pela Câmara.

O parecer foi aprovado também na quarta-feira pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e seguiu no mesmo dia para análise do plenário. A inclusão na pauta ocorreu a pedido do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Um texto-base, sem os trechos que tratam do abuso de autoridade, foi inicialmente aprovado por 48 votos a favor e 24 contra. Já a inclusão dos trechos sobre o abuso foi aprovada simbolicamente em plenário. Agora, o pacote terá de retornar à Câmara por conta das modificações promovidas pelos senadores.


De acordo com o projeto aprovado no Senado, um magistrado incorrerá em abuso de autoridade nos seguintes casos: se proferir julgamento quando impedido por lei, se atuar com evidente motivação política, se expressar opinião, por qualquer meio de comunicação, no meio do processo, entre outros pontos.

Já para os membros do Ministério Público, ficará caracterizado como abuso se um procurador ou promotor instaurar processo sem provas e indícios suficientes; se expressar, por qualquer meio de comunicação, “juízo de valor indevido” no decorrer do processo; e se atuar com evidente motivação político-partidária.

De acordo com o texto, a autoridade que violar esses itens estará sujeita a pena de detenção de seis meses a dois anos, além de multa.

No mesmo pacote, os senadores aprovaram também medidas que criminalizam o caixa dois e a compra de votos, além de incluir a corrupção e o peculato (desvio de recursos públicos) na lista de crimes hediondos.

Em vídeo postado no Twitter, o procurador Deltan Dallagnol – defensor do pacote original e um dos personagens do escândalo que envolve o ex-juiz Sérgio Moro – classificou o texto aprovado como um retrocesso e um obstáculo na luta contra a corrupção e pediu o apoio da sociedade e dos senadores.

“Para vocês terem uma ideia, dentre as pegadinhas que tem lá, tem a possibilidade de o investigado investigar e acusar o próprio investigador, por isso nós somos contra esse projeto. Nós somos, sim, a favor de uma punição adequada para o crime de abuso de autoridade, consistente, como aquela prevista no projeto de lei apresentado [por procuradores] em 2017 no Senado Federal que não tem pegadinhas e avança nesse sentido”, afirmou Dallagnol.

Combater a corrupção é mais do que necessário, mas é preciso que essa cruzada aconteça dentro dos limites da lei, sem qualquer ufanismo por parte dos agentes do Estado. Em muitos casos da Lava-Jato, por exemplo, o que se viu foi a exacerbação de poder por parte das autoridades, sempre interessadas no excesso de exposição midiática e na condenação a qualquer preço. Isso significa que à margem de um espetáculo vexatório, em que reinou o histrionismo, a legislação vigente ficou à beira do caminho.