Chancelaria iraniana pede explicações ao Brasil sobre nota de apoio aos EUA no caso Soleimani

Se a política do isolacionismo não está a funcionar perfeitamente para os Estados Unidos, maior potência econômica e militar do planeta, não é preciso dose extra de raciocínio para concluir o que em breve acontecerá com o Brasil caso o presidente Jair Bolsonaro insista nessa irresponsabilidade diplomática.

Quando Bolsonaro, ainda candidato, começou a disparar salamaleques na direção de Israel, o UCHO.INFO alertou o então presidenciável para que destrinchasse os números das exportações brasileiras para Oriente Médio. E ao final avalia-se se era conveniente se jogar no colo dos israelenses, apenas porque a comunidade judaica abraçou sua candidatura e talvez tenha despejado polpudos quinhões no caixa da campanha.

Agora, com a temperatura subindo na queda de braços entre Estados Unidos e Irã, Bolsonaro resolveu mais uma vez demonstrar subserviência ao presidente americano, Donald Trump, afirmando que entregará aos Estados Unidos todos os terroristas que atuarem em território nacional. Um destampatório que não encontra mínimo respaldo na legislação vigente.

Não obstante, o Itamaraty emitiu nota manifestando “apoio à luta contra o flagelo do terrorismo”. A nota da diplomacia brasileira fez referência ao assassinato do general iraniano Qasem Soleimani, morto durante ataque aéreo em Bagdá, ordenado pelo presidente dos EUA.

“Ao tomar conhecimento das ações conduzidas pelos EUA nos últimos dias no Iraque, o governo brasileiro manifesta seu apoio à luta contra o flagelo do terrorismo e reitera que essa luta requer a cooperação de toda a comunidade internacional sem que se busque qualquer justificativa ou relativização para o terrorismo”, ressalta um trecho do comunicado, intitulado “Acontecimentos no Iraque e luta contra o terrorismo”.

No comunicado, o Ministério de Relações Exteriores, respingado pela sabujice de Ernesto Araújo, enfatizou que “o Brasil está igualmente pronto a participar de esforços internacionais que contribuam para evitar uma escalada de conflitos neste momento”, não sem antes ter destacado que o terrorismo não é um problema do Oriente Médio e dos países desenvolvidos, sendo que “o Brasil não pode permanecer indiferente a essa ameaça, que afeta inclusive a América do Sul”.

Essa nota do Itamaraty rendeu uma reação da chancelaria iraniana, que chamou a representante do Brasil em Teerã para explicações, o que na diplomacia é considerado uma reprimenda. Como o embaixador brasileiro no Irã, Rodrigo Azeredo, está de férias, coube à encarregada de negócios da embaixada, Maria Cristina Lopes, representou o governo na reunião no Ministério das Relações Exteriores iraniano.

O estapafúrdio comunicado do Itamaraty recebeu críticas de diplomatas brasileiros – tanto da ativa quanto de aposentados –, pois endossou o assassinato de um funcionário de um governo estrangeiro, considerado ato de guerra, além de desrespeitar a tradição brasileira de considerar como terroristas as organizações listadas Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). O Brasil só considera oficialmente como terroristas os grupos al-Qaeda e Estado Islâmico, de acordo com resoluções tomadas pela ONU.

O despreparo de Bolsonaro e seus principais auxiliares, sempre movidos pelo revanchismo ideológico, chega a ser nauseante, pois não se faz diplomacia à sombra do radicalismo e da ausência de diálogo. Tirante o fato que o Conselho de Segurança da ONU não classifica os iranianos como terroristas, ultrapassa as raias da ignorância e do absurdo classificar como incentivadora do terrorismo uma nação que compra do Brasil aproximadamente US$ 2 bilhões por ano e importa 30% da safra do milho nacional.

Se Donald Trump deseja manter os EUA na seara do isolacionismo, apenas porque questões geopolíticas e comerciais interessam à terra do Tio Sam, que ele se entenda com os americanos, mas que Bolsonaro não queira imitar o mandatário ianque arrastando o agronegócio verde-louro ao torvelinho de seu desvario ideológico.