Quem acompanhou, na última segunda-feira (20), a participação do ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) no programa Roda Viva, da TV Cultura, não demorou a perceber que o ex-juiz da Lava-Jato é candidatíssimo à Presidência da República em 2022, apesar de afirmar o contrário.
O presidente Jair Bolsonaro já havia percebido a intenção do ministro de ocupar o principal gabinete do Palácio do Planalto, por isso passou a adotar um discurso mais ácido na direção de Moro em eventos públicos. Ao mesmo tempo, quando pressionado pela imprensa a respeito dessa frente de conflito com Moro, o presidente desconversava com suas costumeiras galhofas.
Depois da entrevista de Moro ao Roda Viva e com a declaração do ministro de ser contra a federalização do caso Marielle Franco, apesar de afirmar ter em suas mãos a “chave” do caso, Bolsonaro decidiu partir para a ofensiva, dando contornos ainda mais beligerantes aos subterrâneos do poder, que só quem conhece com certa dose de intimidade sabe como funciona.
O presidente da República confirmou nesta quinta-feira (23) que estuda a recriação do Ministério da Segurança Pública, decisão que, se confirmada, esvaziará o poder de Moro no âmbito do governo. Até porque, o ex-juiz será responsável apenas pelas questões relacionadas à pasta da Justiça.
O projeto que “ressuscita” o Ministério da Segurança Pública é uma reivindicação dos secretários estaduais, que se reuniram com Bolsonaro na quarta-feira para tratar assuntos relacionados ao tema. Nesta quinta-feira, ao deixar o Palácio da Alvora, Bolsonaro disse que é normal que o ministro seja contrário à ideia, mas ressaltou que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e os membros da Comissão de Segurança Pública da Casa legislativa são favoráveis à recriação da pasta.
“É comum receber demanda de toda a sociedade. E ontem eles (secretários) pediram para mim a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança. Isso é estudado. Estudado com o Moro. Lógico que o Moro deve ser contra, mas é estudado com os demais ministros. O Rodrigo Maia é favorável à criação da Segurança. Acredito que a Comissão de Segurança Pública (da Câmara), como trabalhou ano passado, também seja favorável. Temos que ver como se comporta esse setor da sociedade para melhor decidir”, disse o presidente da República, que havia anunciado no dia anterior sua decisão de não mais falar com os jornalistas.
Quem desconhece o modus operandi da política, em especial a brasileira, sequer imagina como se dá o enxadrismo político nos bastidores. Há na decisão de Jair Bolsonaro um amontoado de interesses, que vai desde a sua eventual reeleição até a preservação do status político do próprio clã, que balança à beira do precipício com o caso das malfadadas “rachadinhas”, escândalo que tem na proa o senador Flávio Bolsonaro e o ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz, um especialista no milagre da multiplicação das cédulas.
Sérgio Moro, por sua vez, que desde os tempos de Lava-Jato vem desenhando um canhestro projeto de poder, não vem medindo esforços para alcançar seu objetivo, que é subir a rampa do Palácio do Planalto com direito à faixa presidencial. Para tal, Moro aposta na eventual condenação de Flávio Bolsonaro, que, se confirmada, poderá desgastar politicamente o presidente da República e seu projeto de reeleição.
Enquanto essa silenciosa e covarde queda de braços acontece nos escaninhos da Esplanada dos Ministérios, o contribuinte brasileiro continua trabalhando arduamente para financiar o Estado, como um todo, agora com mais uma pesada fatura pela frente: os custos de um novo ministério. Para a sorte da população, Bolsonaro, logo após assumir a Presidência, criticou de forma voraz o que chamou de “velha política”. Imagine, caro leitor, se não tivesse feito isso!