Covid-19: após confusão no número de mortos, governo recua e retoma divulgação de dados totais

 
Após a ampla repercussão negativa sobre mudanças na divulgação dos dados da Covid-19 no Brasil, o Ministério da Saúde informou, no domingo (7), que voltará a publicar informações detalhadas em novo portal na internet. A medida sinaliza um recuo do governo, após ser acusado de tentar omitir os dados sobre a doença no País, algo típico de regimes totalitaristas e que remete à era plúmbea brasileira, quando os militares esconderam informações sobre mortos e desparecidos durante a ditadura.

O ministério emitiu dois comunicados no final de semana afirmando que uma nova plataforma com os números da doença no país está sendo finalizada. Na última nota, a pasta relatou problemas técnicos que teriam comprometido a divulgação e informou que passaria a divulgar os dados com a data da morte, e não no dia em que as autoridades confirmaram a Covid-19 como causa do óbito. O número acumulado de casos também deverá estar disponível.

A medida significa um recuo em relação à postura do governo, que nos últimos dias mudou a forma com os dados vinham sendo divulgados, o que gerou fortes críticas de diversos setores, como entidades de saúde, políticos e membros do Judiciário, e espalhou temores de manipulação dos números por parte do governo.

Na última sexta-feira, o ministério reforçou a ênfase na divulgação do número de pessoas recuperadas e passou a relatar apenas os novos casos e mortes nas últimas 24 horas, excluindo a informação sobre o total de infecções e óbitos, como vinha sendo feito desde o início da epidemia no Brasil.

No mesmo dia, porém, o portal com informações sobre a doença saiu do ar e retornou apenas no final da tarde de sábado, já com mudanças e apenas com as informações diárias.

No último sábado (6), o presidente Jair Bolsonaro confirmou a mudança na divulgação, afirmando que o propósito seria “evitar subnotificação e inconsistências”. Na quarta-feira, o governo começou a enviar as informações às 22h, alegando que se fossem divulgados entre às 17h e 19h, como vinha ocorrendo, haveria risco de erro nas contagens.

Essa confusão ganhou ingrediente extra com a proposta do empresário Carlos Wizard, que nesta segunda-feira (8) assumiria oficialmente a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos do Ministério da Saúde, mas desistiu após ser alvo de enxurrada de críticas por causa da desvairada proposta de recontar os mortos por Covid-19 em todo o País.

 
Ordem absurda

A mudança na forma da divulgação dos dados sobre a Covid-19 no País ocorreu após o presidente Jair Bolsonaro determinar que o número diário de mortes ficasse abaixo de mil, como se isso fosse possível no mundo real. Ou seja, após acusar a China de esconder informações sobre o novo coronavírus, Bolsonaro tentou fazer o mesmo no País.

A absurda ordem do presidente da República foi repassada ao ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, que entregou a demanda à sua equipe. É importante ressaltar que o Ministério da Saúde foi transformado em espaço avançado das Forças Armadas, tamanho é o número de militares em postos estratégicos em uma pasta que exige conhecimento técnico.

Para se enquadrar no limite imposto pelo presidente, a solução encontrada pela assessoria de Pazuello foi separar óbitos ocorridos nas últimas 24 horas das ocorridas em dias anteriores, mas só confirmadas naquele período. Até a última semana, o Ministério da Saúde somava todas as mortes registradas em um mesmo dia, independentemente da data da ocorrência.

Como citou o UCHO.INFO em matéria anterior, Bolsonaro, que classificou a Covid-19 como “gripezinha”, começa a temer os efeitos colaterais do negacionismo e da irresponsabilidade genocida que emoldura as ações do governo federal de combate ao novo coronavírus.

No momento em que a opinião pública precisa conhecer a realidade no escopo da Covid-19, o que ajuda a definir as atitudes do cidadão em relação à prevenção, o presidente da República age na contramão do bom-senso e exige do Ministério uma manobra criminosa e que mereceu um sem fim de críticas ao redor do planeta.

Duas contagens oficiais diferentes em um só dia

Na noite do domingo, o governo divulgou dados contrastantes sobre a Covid-19. Um primeiro balanço, divulgado em torno das 20h30, contabilizou 1.382 mortes nas últimas 24 horas, o que elevaria o total de óbitos desde o início da epidemia para 37.312. Já o número de novos casos seria 12.581 casos, totalizando 685.427.

Contudo, por volta das 22h, o portal do Ministério da Saúde contabilizou apenas 525 mortes no mesmo período, o que representa uma diferença de 857 em relação à primeira divulgação, e apontou, porém, 18.912 casos. Até o momento, o órgão ainda não explicou os motivos da discrepância entre as duas contagens.

Com a polêmica em torno da divulgação dos dados, o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (CONASS), órgão não vinculado ao Ministério da Saúde que engloba as secretarias estaduais, criou seu próprio portal com informações sobre a doença.

O chamado Painel CONASS atualizará os dados diariamente às 17h, horário em que as secretarias enviam os dados para o Ministério da Saúde para serem incluídos no boletim nacional. Neste domingo, o portal contabilizou 1.116 mortes e 30.164 novos casos. O total no país desde o início da epidemia, segundo as secretarias, é de 36.151 óbitos e 680.456 infecções.

Em comunicado à imprensa, o presidente do CONASS e secretário de Saúde do Pará, Alberto Beltrame, afirmou que as decisões em gestão de saúde devem ser pautadas pela “ciência, verdade e informação precisa e oportuna”. (Com agências de notícias)