Que todo governo tem doses de populismo barato é algo de conhecimento público, até porque esse detalhe faz parte da política. Contudo, o populismo rasteiro e covarde que ziguezagueia nas entranhas do governo de Jair Bolsonaro chega a ser nauseante.
Nesta terça-feira (9), o ministro da Saúde foi à Câmara dos Deputados para explicar aos parlamentares o malabarismo da pasta para esconder os dados totais da Covid-19 no País. Eduardo Pazuello usava uma máscara de proteção que de um lado ostentava parte do pavilhão nacional e de outro a marca do Sistema Único de Saúde (SUS). Adereço típico de quem sofre de histrionismo incurável. É fato que o humor do brasileiro dá vazão às mais variadas manifestações, mas uma autoridade deveria respeitar a importância do cargo e não sair por aí “fantasiado” em meio à pandemia do novo coronavírus.
A reboque de um discurso marcado por rodopios e sem qualquer dose de convencimento, até porque não há explicação para um pedido absurdo como o feito pelo presidente Jair Bolsonaro – o Brasil não poderia ter mais de 1 mil mortes diárias por Covid-19 –, o ministro da Saúde cometeu uma gafe que até mesmo quem desconhece questões geográficas conheceria. E por razões óbvias o ministro foi alvo de uma enxurrada de piadas nas redes sociais.
Pazuello afirmou aos deputados que as regiões Norte e Nordeste já ultrapassaram a pior fase da pandemia porque são “ligadas ao inverno Hemisfério Norte”. O ministro tentou explicar algo que desconhece, mas acabou se complicando.
“Nós podemos separar o Brasil em Norte e Nordeste, que é a região que está mais ligada ao inverno do hemisfério norte, são as datas do hemisfério norte em termos de inverno, e ao Centro-Sul, Sudeste, Centro-Oeste, que é o restante do país que está ligado mais ao inverno do hemisfério sul”, disse o ministro. “Nesta primeira etapa, nós tivemos o grande impacto nas regiões Norte e Nordeste”, completou.
Com extensão continental, o território brasileiro em grande maioria (93%) está localizado no Hemisfério Sul. Além disso, a temporada de inverno no Brasil, país eminentemente tropical, começa em junho, ao contrário do que ocorre no Hemisfério Norte, onde a temporada mais fria do ano inicia-se em dezembro.
Os 7% do território brasileiro que constam como parte do Hemisfério Norte estão localizados próximo à linha do Equador, onde predomina o clima quente durante o ano todo. A linha imaginária que divide o globo terrestre em dois hemisférios passa sobre quatro estados brasileiros: Pará, Roraima, Amazonas e Amapá. Portanto, ao contrário do que afirmou Pazuello, o Nordeste está localizado na porção Sul da Terra.
Diferentemente das balizas meteorológicas, o Nordeste brasileiro tem duas estacoes climáticas distintas: o verão, em que impera o clima seco e a ausência de chuvas, e o inverno período chuvoso. É dessa maneira que os nordestinos diferenciam as estações na região, o que não significa que no “inverno” o sol e o calor são ausentes, pelo contrário. A única diferença é o índice de umidade do ar que aumenta por causa das chuvas.
A declaração de Eduardo Pazuello por certo será considerada por alguns apoiadores do governo como mero equívoco, mas é inaceitável que um ministro da Saúde desconheça temas tão básicos como o em questão. Além disso, se considerarmos que Pazuello é, segundo consta em seu currículo, especialista em logística, o vexame torna-se ainda maior.
O episódio em si, deixando de lado as piadas que ganharam as redes sociais, mostra a irresponsabilidade do presidente da República ao entregar um ministério de suma importância, como o da Saúde, a alguém como Pazuello, que chegou ao posto apenas porque é general de Exército. Aliás, a quantidade de militares na equipe de Pazuello faz da pasta da Saúde um puxadinho do quartel mais próximo.
