(*) Gisele Leite
As relações da ciência com o poder sempre foram emblemáticas, temporais e históricas. E jamais podemos olvidar os respectivos contextos.
Mas existem três perspectivas, a saber: a do poder da ciência, o poder na ciência e o poder com ciência.
Mensura-se, inicialmente, a primeira perspectiva através do peso dos temas científicos nas questões relevantes para a sociedade a que respeitam.
Já o poder da ciência não é ditado pela intensidade de atividades científicas, mas antes pela visão por parte dos poderes sobre a importância da ciência e da tecnologia para a consolidação e sobrevivência do sistema.
Aliás, o reconhecimento e status de cientistas eminentes e a proximidade do poder (seja político e econômico) de conselheiros científicos são bons indicadores do valor social da ciência.
Por sua vez, o poder na ciência corresponde ao relevante exercício de assegurar normas de funcionamento e de regular conflitos de competência na comunidade científica.
E, muitas vezes, uma conjugação peculiar de fatores que motiva certas instituições científicas, durante determinados períodos, pareça imunes aos vícios de outras organizações existentes na mesma sociedade.
Frequentemente, tal não se verifica. Os oásis onde se faz investigação científica não duram mais que breves períodos em que o entusiasmo gerado pelos seus promotores consegue abater os procedimentos estatuídos.
Por último, temos o poder com ciência, o poder científico, a aspiração de tantas boas e piedosas almas, designado também por ser o «poder iluminado».
Na realidade, a ciência expandiu-se enormemente no mundo moderno e os poderes, para se exercerem, têm de saber utilizar conhecimentos científicos, inexoravelmente.
Mas, tal não significa que o processo de tomada de decisão seja um processo científico, nem que os aspectos cognitivos não científicos relacionados com uma dada questão devam ser menorizados. Exige-se conhecimento, estratégia e amadurecimento.
A ciência não detém o monopólio da criação de significados que levam à formação dos valores e percepções de uma cultura. E o poder iluminado é aquele que procura incessantemente a articulação cognitiva mais adequada às questões e aos obstáculos que se lhe deparam.
O papel crescente da ciência no funcionamento da economia e da sociedade contribuiu para clarificar a diferença entre as finalidades da prática científica – a procura da plausibilidade – e as da administração (em geral, e da ciência em particular) – a procura da utilidade.
Não se pode administrar uma crise ignorando o poder da ciência, nem a necessidade de liderança adequada e esclarecida. A necessidade de se divulgar os resultados e demais acontecimentos científicos para o público e opiniões dos cientistas revela-se no direito à informação, lisura e sobrevivência.
Referências:
CARAÇA, João. A Ciência. Lisboa: Editora Quimera, 2012.
(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.
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