Em novo destampatório, Bolsonaro usa rede social para defender apoiadores investigados e ameaçar o STF

     
    Sem citar diretamente a Operação Lume, da Polícia Federal, que, requerida pela Procuradoria-Geral da República e autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes (STF), cumpriu mandados de busca e apreensão contra bolsonaristas ultrarradicais, o presidente Jair Bolsonaro usou na noite de terça-feira (16) as redes sociais para defender seus apoiadores e com excesso de ousadia afirmar ser defensor da democracia e da Constituição.

    Bolsonaro, que flerta com o autoritarismo diuturnamente e tenta impor suas vontades à força, desrespeitando o Legislativo e o Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nas postagens que vê nas recentes decisões da Corte “abusos”, “violação de direitos” e “ataques concretos” ao governo, por isso tomará as “medidas legais” para proteger a Constituição.

    O presidente sabe que erra sobejamente nos desafios que lança aos Poderes da República e atenta o Estado Democrático de Direito ao atropela a Carta Magna, como se tivesse sido eleito não para governar o País, mas para ser dono da nação e dos cidadãos.

    Incomodado com as investigações e temendo que provas que constam nos inquéritos em tramitação no STF sejam carreadas aos processos em julgamento no Superior Eleitoral (TSE), os quais pode culminar com a cassação da sua chapa, Bolsonaro tenta vender um falso bom-mocismo, mas não consegue fazê-lo sem recorrer a ameaças, intimidações e afirmações farsescas.

    Na rede social, o presidente da República publicou uma sequência de dez mensagens com viés claramente autoritário, mesmo que tenha destacado o respeito à democracia. Quem acompanha os discursos e as postagens de Bolsonaro não demorou a perceber que as mencionadas mensagens foram escritas por terceiros, talvez por algum integrante do “generalato palaciano”.

    “O que adversários apontam como ‘autoritarismo’ do governo e de seus apoiadores não passam de posicionamentos alinhados aos valores do nosso povo, que é, em sua grande maioria, conservador. A tentativa de excluir esse pensamento do debate público é que, de fato, é autoritária” escreveu.

    Bolsonaro tem o direito de enganar a massa de apoiadores que continuam acreditando nesse desgoverno, mas querer ludibriar toda uma população é excesso de pretensão. Falar em valores alinhados ao nosso povo é pasteurizar o pensamento ultrarradical que se instalou no Palácio do Planalto, como se todos os brasileiros concordassem com esse devaneio autoritário. As pesquisas de opinião mostram de forma clara que o governo e o presidente derretem à sombra do que pensa a sociedade.

     
    Em outra postagem, o presidente conseguiu fazer uma ode à mitomania: “O histórico do meu governo prova que sempre estivemos ao lado da democracia e da Constituição brasileira. Não houve, até agora, nenhuma medida que demonstre qualquer tipo de apreço nosso ao autoritarismo, muito pelo contrário”.

    O presidente exalta a memória de torturadores, como é o caso do facínora Carlos Alberto Brilhante Ustra, e homenageia ditadores sanguinários, mas atreve-se a afirmar que não há qualquer medida que remeta ao seu apreço pelo autoritarismo. Basta ver como Bolsonaro reage aos populares que se aglomeram diariamente na saída do Palácio do Palácio da Alvorada e arriscam contrariá-lo. Além disso, as manobras escusas que vem tentando implementar com o intuito de blindar os filhos no âmbito de investigações é atitude típica de tiranete.

    Na sequência, o chefe do Executivo fez nova postagem eivada pelo devaneio totalitarista: “Queremos, acima de tudo, preservar a nossa democracia. E fingir naturalidade diante de tudo que está acontecendo só contribuiria para a sua completa destruição. Nada é mais autoritário do que atentar contra a liberdade de seu próprio povo. Só pode haver democracia onde o povo é respeitado, onde os governados escolhem quem irá governá-los e onde as liberdades fundamentais são protegidas. É o povo que legitima as instituições, e não o contrário. Isso sim é democracia.”

    Détraqué conhecido, Jair Bolsonaro sempre apostou na radicalização como forma de ganhar suposta notoriedade, mas pelo fato de durante quase três décadas ter sido um parlamentar pífio e medíocre, jamais provocou a merecida e necessária reação dos amantes da democracia. Agora, com a obrigação de respeitar os limites impostos pela Carta Magna, o presidente se vê tentado a sinalizar com a possibilidade de ruptura democrática, o que faz de forma recorrente, mesmo que afirme ser defensor da democracia.

    Como se estivesse a sofrer de amnésia de ocasião, Bolsonaro escreveu: “Vale lembrar que, há décadas, o conservadorismo foi abolido de nossa política, e as pessoas que se identificam com esses valores viviam sob governos socialistas que entregaram o país à violência e à corrupção, feriram nossa democracia e destruíram nossa identidade nacional”.

    Bolsonaro tem o direito à livre manifestação do pensamento, mesmo que tosco e covarde, mas não pode ignorar as atitudes e decisões que tomou em passado não tão distante. Como parlamentar, o agora presidente da República votou algumas vezes com o PT, partido com que se aliou no Rio de Janeiro para viabilizar o processo de impeachment do governador Wilson Witzel, assistiu calado ao protagonismo criminoso do PP (hoje Progressistas), seu então partido, no escândalo do Petrolão e elogiou de maneira rasgada o finado venezuelano Hugo Chávez. Sobre corrupção, o presidente deveria ater-se ao silêncio obsequioso, pois antes de qualquer declaração desse naipe precisa esclarecer o relacionamento com Fabrício Queiroz e seus “fantasmas”.

    Dirigindo-se apenas aos seus descontrolados apoiadores, Bolsonaro finaliza o destampatório virtual da seguinte forma: “Luto para fazer a minha parte, mas não posso assistir calado enquanto direitos são violados e ideias são perseguidas. Por isso, tomarei todas as medidas legais possíveis para proteger a Constituição e a liberdade do dos brasileiros”.

    Desde a posse até agora, Bolsonaro nada fez em prol do Brasil, já que na maior parte do tempo se dedicou a criar atritos com os outros Poderes, patrocinar constrangimentos ao País no cenário internacional e de maneira vexaminosa se curvar diante de governantes radicais e movidos pela estupidez política. Se na opinião do presidente isso é “fazer a parte” que lhe cabe, que peça para sair o quanto antes, pois o Brasil não pode ir pelo ralo.