(*) Carlos Brickmann
Ainda quer saber por que o Queiroz depositou R$ 89 mil na conta de Michelle? Coisa antiga, esqueça. Antiga e micha. Agora o Governo usa o nome de Michelle para pedir doações dos portos de Santos e do Rio de Janeiro, ambos controlados pelo próprio Governo, ao Pátria Voluntária, programa beneficente coordenado pela esposa do chefe de Governo, a própria Michelle. O pedido à autoridade portuária de Santos, Santos Port Authority, pode render R$ 200 mil, e está sendo avaliado. A Cia. Docas do Rio também está analisando o pedido, mas não informou valores.
O objetivo do programa Pátria Voluntária é incentivar o voluntariado e as iniciativas beneficentes da sociedade. Dinheiro estatal não lhe falta: há pouco, uma doação de R$ 7,5 milhões do frigorífico Marfrig para a compra de cem mil testes rápidos para a Covid foi repassada pelo Governo para o programa de financiamento do Pátria Solidária, o Arrecadação Solidária (depois de consulta à Marfrig, que concordou: afinal, são todos solidários).
Parte dos recursos arrecadados pelo Arrecadação Solidária foi encaminhada a ONGs missionárias evangélicas indicadas pelo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, dirigido pela ministra Damares Alves. O TCU, o Ministério Público e a oposição querem investigar esse repasse, a forma de escolha das ONGs que o receberam e as atividades que realizam com os recursos.
Definitivamente não são tão solidários assim.
O nome das coisas
A antiga Cia. Docas, depois Codesp, é hoje Santos Port Authority. Terá sido privatizada e vendida a estrangeiros? Não: só trocou de nome, já no governo Bolsonaro. Afinal de contas, Brazil acima de tudo!
STF, todos com razão
O mais curioso na disputa entre o ministro Marco Aurélio, que libertou o acusado André do Rap, apontado como expoente do PCC, Primeiro Comando da Capital, e o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo, que anulou a ordem de libertação e mandou capturar e prender André do Rap, é que os dois têm razão e nenhum dos dois tem razão. Diz a lei, recentemente aprovada, que os juízes têm de renovar a ordem de prisão preventiva a cada 90 dias. Correto: evita-se o que ocorreu muito durante a Operação Lava Jato, as prisões preventivas que só eram suspensas em condições específicas. O empresário Marcelo Odebrecht, por exemplo, ficou preso mais de um ano, sem sentença condenatória, e só teve a situação definida depois que fez sua delação premiada.
Milagre: não muito tempo depois, estava preso em sua magnífica mansão, sem os aborrecimentos da vida na cadeia. Pois bem: o ministro Marco Aurélio cumpriu a lei. O acusado foi libertado e não cumpriu nenhuma das ordens que recebeu: sabia o que teria de enfrentar e fugiu tão logo teve a oportunidade. O ministro Luiz Fux, para evitar que um acusado tão perigoso ficasse em liberdade, cumpriu seu dever: anulou a ordem de libertação. Demorou um pouquinho, e não foi possível capturar o cavalheiro.
STF, todos sem razão
Naturalmente, nenhum dos dois tem razão. Se a lei existe, é para ser cumprida. E por que o juiz que determinou a prisão preventiva não renovou a ordem após 90 dias? A história de que o Judiciário está sobrecarregado não é aceitável. Basta ter controle das datas e mandar um estagiário redigir o ato. Marco Aurélio poderia ter pedido a um dos auxiliares que tem no STF para telefonar ao juiz e cobrar providências. Quanto a Fux, será que só soube da iniciativa de Marco Aurélio um dia depois que até este colunista leigo já a conhecia pelo jornal? Terão as vaidades superado aquilo que os ministros sabem que poderiam fazer?
Data maxima venia, assim não é possível.
Cortando o dos outros
Sabe aquele grupo de ministros e assessores que vive reclamando da vida, porque não consegue cortar salários, aposentadorias, direitos adquiridos? Pois não se preocupe: parece que o grupo vive muito bem, obrigado. Talvez os salários não sejam tão bons quanto os pagos pela iniciativa privada, mas andam ganhando mais que o teto constitucional (muda-se o nome do penduricalho, mas é dinheiro a mais que entra). No Ministério da Economia, os jetons (pagamentos para comparecer a reuniões) podem chegar a mais de R$ 14 mil por mês. Soma-se a isso um salário bem razoável, próximo dos R$ 30 mil. E os penduricalhos, claro: auxílio-moradia, auxílio-alimentação, passagens. Lá, só o ministro Paulo Guedes não embolsa extras.
A arte de volta
Com a redução de casos da Covid, o belíssimo Museu de Arte Sacra de São Paulo reabre depois de amanhã, sexta-feira, às 10h da manhã, com uma excepcional exposição de fotografia, Nós, da Etiópia – crônicas de uma viagem, do ótimo Daniel Taveira. De acordo com o diretor do Museu, José Marçal, não dá para perder. Ingressos em www.museuartesacra.org.br. Vale a pena.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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