O xadrez do zum-zum-zum

(*) Carlos Brickmann

O bispo Marcello Crivella foi uma das grandes decepções deste colunista. Eu esperava um prefeito carola num Rio de Janeiro nada carola, torcedor da Igreja Universal do Reino de Deus, e, para agradar ao bispo Edir Macedo, hoje Bolsonaro desde criancinha, capaz de jurar pela verdade bolsonarista, apesar da contradição em termos. Foi tudo isso. Mas quem esperava que não abrisse o Carnaval quando isso era possível, por questões pessoais? Quem o imaginaria incapaz de tocar os serviços básicos de uma metrópole tão linda? Quem esperava demonstrações maciças e amplas de incompetência?

Enfim, culminou seu mandato pedindo apoio de Bolsonaro à reeleição. O mesmo Bolsonaro que apoiou 14 candidatos e viu doze deles derrotados. Na manhã desta terça foi preso por acusações de corrupção, quando faltavam só nove dias para encerrar seu mandato. Agora tem de ouvir a marchinha de Paulinho Soledade, com imagens que o mostram dançando com Bolsonaro: “Zum, zum, zum, zum, zum, zum, zum, Tá faltando um”.

Falta mais de um, Eminência. Falta o Recruta Zero que com o Sr. dança a marchinha, faltam seus zeros à esquerda. Faltam os do outro lado, que tanto encheram os bolsos, cujos processos andam devagar, devagarzinho. A PF agiu na Operação Hades. Hades é o deus grego dos mortos (para os romanos, chamava-se Plutão), seja qual for seu partido. E era invisível – como prever suas atitudes futuras?

Como prever, agora, quem serão seus novos alvos?

As novidades

E a que fator o bispo Crivella atribui sua prisão? Claro: “à perseguição política”. Justo ele, desamparado, com apoio da Igreja Universal do Reino de Deus e do presidente Bolsonaro, é vítima de perseguição, “já que atuou contra a corrupção”, lutou “contra todas as empreiteiras”, “tirou recursos do Carnaval”, negociou “o VLT, Veículo Leve sobre Trilhos”, combateu “o pedágio ilegal e injusto”. E antes de ser preso levou uma surra das urnas.

A Operação Hades investiga um tal QG da Propina na Prefeitura do Rio.

Sexo com criancinhas

A bomba explodiu no final da semana passada: o Conanda, Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes, aprovou visita íntima a adolescentes infratores. Adolescentes, nesse tipo de instituição, usam este nome a partir de 12 anos de idade. Pelo que a aprovação sinalizava, crianças com 12 anos de idade poderiam ter visitas íntimas, estariam sujeitas a pressões de pessoas mais velhas, poderiam até engravidar com aval do Conanda. Pouco mais tarde, apurou-se que a medida não tinha essa amplidão: sexo com menores continuava sendo proibido, as disposições do Código Penal se superpunham a estas – enfim, nada tinha mudado.

E a grande pergunta: por que os limites não tinham sido apontados na disposição, deixando que se criassem atritos na interpretação do que estava escrito? Daria muito trabalho expressar tudo direitinho, evitando possíveis medidas judiciais e gerando tensões na família dos adolescentes recolhidos?

Respeito

O deputado Fernando Cury, Cidadania, que agiu na frente de celulares, deixou de lado as tentativas de negar o que fez – no caso, abraçar a deputada Isa Penna, do PSOL, com a mão num seio, pegando-a de surpresa e sem lhe dar sequer o direito de ser avisada de que receberia o indesejado abraço.

Aparentemente, a questão irá longe: a deputada Isa Penna já disse que só poderia discutir as providências que já tomou após receber um pedido público de desculpas do deputado Fernando Cury; ele, que se recusava a fazer qualquer comentário sobre o caso, acabou contratando uma das grandes empresas de assessoria de Comunicação do país, a caríssima CDN, para lhe dizer o que fazer. Dizer que não fez nada vai lhe criar problemas: o assédio foi filmado.

O velho e o novo

A Assembleia Legislativa Paulista, desde os tempos do palácio antigo, nunca chegou a ser uma casa de santos. Ao longo dos anos, sempre houve encontros de casais – só que normalmente discretos. Vez por outra algum segurança da Casa surpreendeu algum casal; mas, excetuando-se uma vez, houve um pedido de desculpas e o segurança se limitou a encaminhar um relato para a chefia, onde mofa até hoje. E como, ao que se saiba, tenham sido sempre encontros mutuamente consentidos, ninguém deu queixa.

Neste caso, há a possibilidade de que tenha havido alguma aposta para que o parlamentar tenha tido a ousadia de assediar a colega em público. A reação veio em conjunto, não apenas dos movimentos feministas da Assembleia, mas também de outros movimentos – por exemplo, o PSD Mulher, comandado por uma das mais inatacáveis políticas do país, Alda Marco Antônio. O PSD nada tem a ver com o PSOL, mas ambos têm sua forte ala feminina – e ambas sabem quem são os inimigos comuns de ambas. Esse tipo de sem-vergonhice tem a capacidade de unir adversárias e movê-las para retirar do caminho as pessoas que não deixam de ser sem-vergonhas.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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