As revelações do futuro

(*) Carlos Brickmann

Neste ano que já se vai, e que tantos de nós levou, restaram dúvidas que, um dia, serão esclarecidas – ou não, como diria Caetano. Há coisas novas, ainda quentinhas; há coisas antigas. Todas nas mãos de quem tudo encobre.

Uma dúvida antiga: em 2017, a Polícia localizou R$ 51 milhões no apê do deputado Geddel Vieira Lima. De onde veio o dinheiro? Seu destino era o cofre do deputado, ou havia outro destinatário? Até hoje sem resposta.

Dois
, uma dúvida mais recente: por que o hoje famoso casal Queiroz depositou R$ 89 mil na conta da esposa do presidente, Michelle Bolsonaro? A pergunta provocou uma explosão presidencial: em suas palavras, gostaria de encher a boca do repórter de porrada. Responder teria liquidado o assunto.

Três, o tema proibido: quem mandou matar a vereadora carioca Marielle Franco, há pouco menos de três anos? Há executores condenados e presos, mas os mandantes continuam desconhecidos – algo estranho, pois existem policiais com lendária habilidade nos interrogatórios. Foi um crime mal calculado: Marielle, vereadora de um partido pequeno, virou personalidade mundial, com todas as insinuações possíveis sobre interesses dos mandantes. Para o Governo, seria ótimo esclarecer tudo. Mas nada foi ainda esclarecido.

Quatro, o vice-líder do Governo no Senado, Chico Rodrigues, foi apanhado com dinheiro oculto, atochado onde Olavo de Carvalho disse que Bolsonaro deveria enfiar uma condecoração. De onde veio o dinheiro?

Calma no Brasil

Se, neste finzinho de ano, alguém lamentar que 2020 tenha terminado, por favor, contenha-se: faça de conta que não ouviu. Não vá bater no coitado.

Cala-te, boca

O problema do presidente Bolsonaro não é dizer o que pensa: é pensar o que diz. Desta vez conseguiu provocar uma onda de simpatia por uma pessoa famosa por ser irritanta, desagradável, prepotenta. Dilma passou três anos na prisão, na época daquela ditadura militar que Bolsonaro tanto elogia embora diga que não existiu. Foi torturada, como era praxe na época; a tortura foi confirmada pela Justiça. Agora, 50 anos depois, sem qualquer motivo, a não ser a vontade de falar demais, Bolsonaro pôs em dúvida, às gargalhadas, as torturas a que Dilma foi submetida. Diz que espera as provas, por raios X, da fratura que ela sofreu durante a tortura.

Bobagem, por dois motivos: todos os documentos estão em poder das autoridades; e ele reuniu, em solidariedade a Dilma, personalidades dos mais diversos partidos, como Fernando Henrique, Rodrigo Maia, e naturalmente toda a ala esquerda da política brasileira. Fez o possível para reviver uma personalidade esquecida.

O dono da bola

Bolsonaro brinca de articular-se no Congresso para eleger os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e David Alcolumbre se estranham, o PT finge que só aceita Baleia Rossi como presidente da Câmara contra a vontade, já que ele é do MDB e votou pelo impeachment de Dilma. Mas as coisas não são bem assim: o homem forte da articulação é o ex-presidente Michel Temer. Temer conhece o Congresso melhor do que todos, tem ótimo trânsito nos mais diversos partidos (o que inclui o PT, embora com dificuldades maiores), sabe se mover no universo da política.

E tem com ele a carta mágica: apoio tanto de Bolsonaro quanto dos antibolsonaristas.

Jogando o jogo

Temer coordena Baleia por debaixo dos panos – com isso, garante que seu partido, o MDB, fique no comando da Câmara. Baleia é afável, ajuda na articulação; seu pai, Wagner Rossi, foi secretário do Governo Fleury, PMDB de São Paulo, depois ministro de Lula e Dilma. E Temer tem habilidade para, terminada a tarefa, manter uma certa união entre Congresso e Executivo. O jogo é por aí. Pode mudar, mas por enquanto segue este roteiro.

Mudar?

Temer é um político educadíssimo, formal, cheio de gentilezas. Conhece a política. O problema é que, de um dos lados, há um presidente que não sabe se calar. Se conseguir calar-se, e aos filhos, terá um caminho mais suave.

O país que perdemos

São dados oficiais, fornecidos por um órgão governamental, o Instituto Nacional de Atividades Espaciais, INPE: neste ano, de janeiro a novembro, a Amazônia perdeu 87.762 km² em desmatamento e queimadas. Esta área é equivalente a duas vezes o Estado do Rio, que tem 43.696 km². Somando: o Brasil perdeu boa parte do Rio para o crime organizado e as milícias, ao longo dos anos; e, somando-se a área amazônica ilegalmente destruída, é o equivalente a três Estados do Rio fora do controle de nosso país.

É bom lembrar de uma pergunta do jornalista Gilberto Dimenstein, há alguns anos: se a Argentina tomasse um pedaço do território brasileiro, aceitaríamos isso tranquilamente? Não, claro – e por que os milicianos, grileiros e narcotraficantes são melhores que os argentinos, para que os toleremos?

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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