(*) Carlos Brickmann
O general Pazuello mentiu seguidamente no depoimento à CPI da Covid. Sabe que mentiu: disse que Bolsonaro nunca lhe deu ordens, quando ele já havia dito (e escrito), ao cancelar contrato de compra de vacinas, que “um manda e outro obedece”. Ele disse que o Brasil, desde o primeiro momento, disse à Pfizer que queria comprar vacinas. Ele sabe (e isso foi dito não apenas por um colega de Governo, Fábio Wajngarten, como pelo chefão da Pfizer, Carlos Murillo) que por dois meses o Brasil ignorou as ofertas da Pfizer. E sabe também que sua omissão está documentada. Por que, então, mentiu?
Porque é essa a tática usada por Jair Bolsonaro & Filhos: mentir, mentir, mentir, que algumas pessoas vão pensar que é verdade. Há bolsonaristas que, periodicamente (com o mesmo texto), dizem que a FDA, a agência dos EUA respeitada por sua seriedade, aprovou a cloroquina para tratamento da Covid. Falso: o que houve (é só olhar no site www.novartis.com) é que a Novartis, grande produtora de cloroquina, pediu à FDA que estudasse o remédio. Por que, então, insistir na mentira? Por questão de método. O uso de mentiras, amplamente divulgada por redes sociais, é descrito no livro Os Engenheiros do Caos, de Giuliano da Empoli. Antes disso, trocando as redes sociais pelo rádio, foi usado por um professor alemão que fez muito sucesso.
Depois do sucesso, o alemão Goebbels matou os seis filhos e a esposa e se suicidou, para que os Aliados, vencedores da 2ª Guerra Mundial, não o capturassem.
As narrativas
A mentira não é chamada de “mentira”, mas de “narrativa”. Exemplo: a omissão do Governo (e de seu ministro da Saúde, Pazuello), comprovada por documentos, é desmentida pelo general. Sua frase, de que já tinha dito cinco vezes que não houve omissão, foi transmitida pelos blogueiros bolsonaristas como “Pazuello desmoraliza Renan”. A narrativa é que Pazuello humilhou a oposição por falar, quando esperavam que ficasse em silêncio, e foi vestido de civil, quando esperavam que fosse de farda. Quem pediu ao Supremo o direito de calar-se foi ele. Quem falou em farda também foi ele. Mas a narrativa é de que o valente general esfregou a verdade na cara da CPI. O fato, sem narrativa, é que sem o habeas corpus ele sairia preso de lá.
Frente a frente
Seria ótimo promover uma acareação entre três membros do Governo: o publicitário Fábio Wajngarten, que disse que Bolsonaro ignorou ofertas de vacinas; o diplomata Ernesto Araújo, que confirmou a ordem do presidente de negociar a importação de cloroquina; e Pazuello. É provável que a tal “síndrome vasovagal”, que dizem que teve e levou à interrupção da sessão da CPI, acabe sendo chamada pelo nome mais popular.
Dilmismo bolsonarista
O então deputado Jair Bolsonaro disse que, para o país tomar jeito, era preciso que morressem umas 30 mil pessoas. Donde se conclui que o general Pazuello atingiu a meta, dobrou a meta e dobrou-a de novo até ser afastado.
Panorama eleitoral
Três pesquisas de institutos diferentes coincidem e indicam o crescimento rápido da candidatura de Lula à Presidência. A primeira, do IPESPE-XP, foi divulgada em 11 de maio. O objetivo da XP, uma corretora, não é político: é dar indicações da situação a investidores. Mostrou que a rejeição a Bolsonaro ultrapassava 50% e que Lula já empatava com ele. A segunda, do Datafolha, divulgada no dia 12, mostrava Lula em primeiro lugar no primeiro turno, e vitorioso no segundo. A terceira, da Vox Populi para o ótimo jornal virtual Metrópoles, de Brasília, dá Lula vitorioso no primeiro turno, por 43 a 24%. Junte-se a isso o esforço de Lula para se aproximar do centro político. Conversou com Fernando Henrique, que disse ser contra a polarização.
Mas, se houver a disputa Lula x Bolsonaro, vota em Lula. A seu ver, o mal menor.
Mas ainda é cedo
Falta quase um ano e meio para a eleição. Até lá, Bolsonaro tem a caneta na mão. Um bom aumento no auxílio-Covid certamente lhe dará votos. Espera-se que a vacinação se amplie e o número de mortos por Covid se reduza. Passa-se o tempo e o eleitor tende a esquecer o descaso com a saúde dos vivos e o desrespeito do presidente pelos mortos. O jogo não acabou. Só que a vantagem que Bolsonaro tinha já se evaporou.
Centro rachado
Enquanto isso, os políticos da centro esquerda à centro direita continuam discutindo o processo de escolha da candidatura. Pode até acontecer de, por milagre, aparecer um candidato capaz de passar ao segundo turno. Mas ACM Neto, do DEM, está irritado com Doria, que levou um prefeito demista para o PSDB; Doria, apesar da vacina, não deslanchou; Tasso Jereissati, que poderia ser um nome de união, não sabe se enfrenta Ciro, seu antigo afilhado político.
Quem, diante de um quadro polarizado, não souber em quem votar, que culpe o centro político, incapaz de se unir para combater os extremos.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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