Cremos que em muitas ocasiões o leitor deve considerar uma “chatice” nossa insistência nas questões relacionadas à economia do País, muitas vezes ofuscada pela pirotecnia palaciana e pelo entusiasmo de encomenda dos operadores do mercado financeiro. Mesmo assim, mantemos o compromisso jornalístico de informar a verdade e desnudar a realidade, pois só assim é possível mudar o cenário atual.
Na quarta-feira (14), o mercado e integrantes do governo federal, em especial os da área econômica, comemoraram o fato de a Bolsa de Valores ter ultrapassado a marca de 128 mil pontos, como se isso representasse algum ganho à população. Os oportunistas de plantão alegaram que a subida da Bolsa no dia de ontem reflete a confiança do investidor no País. Somente um desavisado é capaz de acreditar que os donos do capital se fiam em um governo autoritário e que flerta com o golpismo, como o de Jair Bolsonaro, o “coitado” da vez.
A alta da Bolsa na quarta-feira foi provocada pelo cenário internacional, já que as grandes economias começam a dar sinais de recuperação econômica, por isso o interesse em investir em companhias do agronegócio e do setor de commodities. Isso significa que esse movimento de alta não chega ao cidadão comum, onde deveria chegar.
Além disso, o interesse dos investidores estrangeiros por commodities brasileiras fará com que os respectivos produtos fiquem mais caros no mercado interno, impulsionando a inflação, que o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) tenta controlar com o aumento da taxa básica de juro, a Selic, que ao final deste ano deve chegar a 6,63%, portanto acima da meta prevista pelo governo. É importante destacar que a Selic iniciou 2021 em 2% ao ano, mas agora está em 4,25%.
Outro detalhe que não pode ser ignorado é que no acumulado de 12 meses o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, está em 8,4%. O governo espera que a inflação encerre o ano na casa de 6%, mas a inflação dos alimentos está no patamar de 25%.
O movimento de elevação da taxa básica de juro para conter o mais temido fantasma da economia encarece o crédito ao consumidor o financiamento à produção. Em outras palavras, o combate ao desemprego será tarefa inglória para um governo que derrete em termos de popularidade e começa a afundar em escândalos de corrupção, por mais que o presidente da República negue.
Como temos afirmado ao longo dos anos, é impossível falar em retomada da economia com dois terços da população recebendo menos de dois salários mínimos mensais. Enquanto isso, o ainda ministro da Economia, o parlapatão Paulo Guedes, comemora o crescimento do consumo de energia, no momento em que o País vive crise hídrica histórica e corre o risco de enfrentar apagões. Diante dos estragos de suas inglórias declarações, Guedes costuma afirmar que suas frases são tiradas do contexto, algo que somete ele acredita.
De acordo com a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, realizada mensalmente pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo ideal em maio passado deveria ser de R$ 5.351,11, ou seja, quase cinco vezes os míseros R$ 1.100 da remuneração básica em vigor no País. Qualquer pessoa com doses rasas de coerência sabe ser quase impossível sobreviver no Brasil com menos de R$ 40 por dia, a não ser que se aceite a miséria como normal.
Enquanto isso, a reforma tributária, cujas propostas continuam perambulando pelo Congresso Nacional à espera da boa vontade dos adeptos do proxenetismo político. Em recesso por duas semanas, como estabelece a Constituição Federal, o Parlamento terá a partir de agosto menos de seis meses para aprovar a reforma que se levada a cabo produzirá algum alívio no bolso dos assalariados. Para compensar, o governo propõe cortar subsídios a determinados setores, que já acenam com eventuais demissões.
Para piorar o que já sabidamente ruim, o governo pode acabar com as regras que balizam o “vale-refeição” e o “vale-alimentação”, que permitem às empresas descontar do Imposto de Renda, no sistema de Lucro Real, o valor pago em forma de benefício aos trabalhadores. É o que consta, por sugestão do governo, do projeto de reforma tributária sob a relatoria do deputado federal Celso Sabino (PSDB-PA).
Segundo o Ministério da Economia, 280 mil empresas oferecem vale-alimentação e vale-refeição para parte dos 22,3 milhões de trabalhadores formais. Quem não recebe o benefício tem direito a receber a alimentação pronta. Os benefícios fazem parte do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), criado em 1976 para reduzir o nível de desnutrição de dos trabalhadores com carteira assinada. Não é difícil imaginar o que pode acontecer se 20 milhões de perderem esses benefícios.
Ainda há tempo
Em conversa com o UCHO.INFO, o deputado federal Gustavo Fruet (PSDB-PR), ex-prefeito de Curitiba, disse que ainda com o calendário apertado há tempo para aprovar a reforma tributária. Fruet destaca a necessidade de estar atento às mudanças propostas pelo governo nas regras do Imposto de Renda. Além disso, o parlamentar tucano lembra que o MDB, que até seis meses atrás presidia a Comissão da Reforma Tributária, agora dificulta a tramitação das PEC relativas ao tema.
O ex-prefeito de Curitiba disse que o governo Bolsonaro terá de ser muito habilidoso na articulação política para viabilizar a aprovação da reforma tributária, mesmo que em capítulos, pois a essa altura dos acontecimentos é preciso escolher prioridades.
A grande questão que se coloca é que a crise política que emergiu da CPI da Covid, colocando o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), na alça de mira das investigações, já é considerada Centrão como uma oportunidade para “emparedar” o Palácio do Planalto. A cúpula centrista reivindica nos bastidores a indicação de um senador do bloco parlamentar para algum ministério, já que a saída de Barros da liderança do governo é tratada como inevitável.
Um dos próceres do Centrão, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), poderá ocupar o principal gabinete do Palácio do Planalto por escassos dois dias, caso Bolsonaro peça licença do cargo até domingo e o vice Hamilton Mourão não retorne de angola a tempo de substituí-lo. Esse aceno a Lira, apara amansar a fera, foi feito pelo próprio Bolsonaro, enquanto era transferido de Brasília para o Hospital Vila Nova Star, em São Paulo.
Se Arthur Lira caiu na esparrela presidencial não se sabe, mas o UCHO.INFO não acredita nessa “isca de ocasião”. Afinal, a ideologia do Centrão é o balcão de negócios que sempre existiu e cresce cada vez mais no Congresso. Não obstante, deputados e senadores querem distância de temas impopulares, pois dentro de alguns meses terão de enfrentar as urnas.
Resumindo, o brasileiro está refém do populismo barato e tosco de Bolsonaro, das muitas promessas e teorias absurdas de Paulo Guedes e da volúpia criminosa do Centrão. Como disse o imperador romano Júlio César à beira do Rio Rubicão, “a sorte está lançada”. E salve-se quem puder. A conferir!
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