(*) Carlos Brickmann
Não se impressione com o pedido de indiciamento de 71 pessoas pela CPI da Covid, anunciado pelo relator, Renan Calheiros. Renan joga para a plateia alagoana: seu domínio regional está sendo desafiado pelo adversário Artur Lira. Abrir o relatório tem duplo objetivo: garantir a posição de maior antibolsonarista de Alagoas e, com isso, reforçar seus laços políticos com o ex-presidente Lula, de quem, a propósito, já foi adversário e aliado.
Mas a coisa é complicada: talvez os antibolsonaristas da CPI, mesmo não concordando com tantos indiciamentos (que incluem até o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, o 01 entre os zeros à esquerda da família de Sua Excelência), vote com o relator, para manter a unidade; mas é possível que siga o relatório paralelo do senador Alessandro Vieira (Cidadania – SE), que propõe o indiciamento de Bolsonaro, três de seus ministros (Braga Neto, Onyx Lorenzoni e Paulo Guedes), mais doze pessoas.
Há quem queira, ainda, propor emendas individuais. De qualquer forma, a CPI terá alcançado bons resultados: comprovar o descuido com que o Governo Federal encarou a pandemia e a dança em torno de enriquecimento com a compra de vacinas. Isto é o que importa: a partir do relatório da CPI, seja qual for o aprovado, a investigação que apure por que empresas de tradição e bem conceituadas não obtinham resposta do Governo, enquanto outras eram recebidas com carinho e tratadas como se tivessem vacinas para vender – quando nada tinham.
Boas denúncias
Seja qual for o relatório aprovado, não terá consequências judiciais antes de passar pelos tribunais – o que é sempre demorado. Mas as consequências políticas são imediatas: acusações bem feitas e bem fundamentadas poderão minar a base eleitoral do presidente, apesar das “narrativas” (sinônimo atual de histórias mal contadas) de que ele é um exemplo internacional de gestor impecável da crise.
É difícil, mesmo para os mais radicais defensores de Sua Excelência, engolir a “narrativa” a respeito de empresas que não produziam vacinas e eram representadas por pessoas estranhíssimas oferecendo aquilo que não tinham para vender, e por preços mais altos que os das produtoras.
Más denúncias
O que pode derrubar a força do relatório aprovado é a denúncia mal feita, visivelmente elaborada apenas para atingir os adversários políticos. O crime de genocídio é gravíssimo; se uma acusação de genocídio for rejeitada, aqui ou no Tribunal Internacional de Haia, por falta de consistência jurídica, isso enfraquecerá politicamente todas as demais denúncias, por mais bem feitas que estejam.
Outro fator que pode desviar as atenções dos fatos revelados pela CPI é uma atitude descompensada de algum dos senadores da oposição a Bolsonaro. Há quem tema, por exemplo, que Renan Calheiros, caso seja contrariado, abandone a relatoria da CPI. Renan costuma ser frio em política, mas como tem seus objetivos alagoanos pode sentir-se tentando a isso. No caso, o noticiário sobre as revelações da CPI seria trocado pela fofocalhada dos senadores, e todo o tempo e esforço de apuração estariam perdidos.
Governo em guerra
A reunião acabou na madrugada de ontem: Bolsonaro, com apoio de ministros do Centrão (Ciro Nogueira, Flávia Arruda e João Roma) ordenou que o ministro da Economia, Paulo Guedes, desencavasse recursos para um auxílio mensal de R$ 400,00 a famílias carentes, mesmo que fosse necessário furar o teto de gastos que a lei permite. Guedes resistiu, mas estava sozinho, e enfraquecido pela revelação de que mantém empresas em paraísos fiscais. Acabou cedendo, e o anúncio foi marcado para as cinco da tarde de ontem.
Mas não aconteceu nada: pelo menos dois dos auxiliares mais importantes de Guedes se recusaram a assinar algo que furasse o teto. A assinatura de ambos, Bruno Funchal (secretário especial da Fazenda) e Jeferson Bittencourt (secretário do Tesouro), seria essencial para autorizar essas despesas. Pouco antes do horário marcado para o anúncio, o Governo resolveu não anunciar nada – ainda. Mas a ideia está de pé e vai voltar, pois este auxílio é parte essencial da luta de Bolsonaro pela reeleição.
O sucesso mineiro
Enfim, uma bela notícia: um estudo internacional liderado pelo Imperial College de Londres coloca Belo Horizonte como exemplo no combate à Covid. De acordo com o estudo, se todo o país combatesse a pandemia como Belo Horizonte o fez, provavelmente o número de mortes no país teria sido a metade das atuais 600 mil mortes.
O prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, do PSD, elogia a população da cidade, que seguiu as recomendações do setor de Saúde, e lembrou que a Prefeitura investiu pesadamente na luta contra a doença. “Trabalhamos junto com a população, com organização e com dinheiro. Tem de botar dinheiro em pandemia. Não faltou, graças a Deus”. O estudo é assinado por professores ingleses, americanos, espanhóis, brasileiros, belgas e dinamarqueses.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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