(*) Carlos Brickmann
E eis que chega o trenó, voando sem piloto: no comando, as quatro renas, por apelido 01, 02, 03, 04. Nada casual: multiplique 01 por 02, o resultado por 03, o resultado por 04, e terá o número mágico 24. Deixe a malícia de lado: é a data em que se comemora o Natal em quase todo o mundo, dia 24.
E cadê o piloto, o Papai Cruel? De acordo com a rena 02, a mais falante, Papai Cruel disse algo como “Chega! Estou de saco cheio, porra! Eu vou é para a praia. E chega de me vestir de vermelho, cor de comunista, talkey?” Papai Cruel estava com o saco cheio, mesmo: presentes para a turma do Centrão se comportar bem, mas, com os bons fluidos do Natal, também para os que falam como inimigos, mas, felizes com os afagos discretos, se comportam direitinho, sem desvios, como amigos secretos.
Papai Cruel, na verdade, está irritado com o vermelho. Não queria vestir vermelho, nem sobrevoar países vermelhos ou avermelhados, tipo China, Estados Unidos, Suécia, Argentina, Venezuela, França, Alemanha, Noruega. Onde já se viu dar presentes para os chilenos que votam em comunistas? E essa maluquice de continuar a combater a pobreza, depois que os pobres já foram derrotados? Gente maluca, essa, que prefere comprar feijão e arroz a gastar seu dinheirinho contado em fuzis e munição, coisa fina, importada!
Papai Cruel tirou férias. Mas volta, ele sempre volta. Ainda mais agora, que falam em apreender suas renas por pastar a grama dos vizinhos.
Cadê a velhinha?
Foi só um sonho, dos tempos em que havia uma Velhinha, em Taubaté, que ainda acreditava no Governo – pelo menos é o que nos garantia seu esplêndido biógrafo, Luís Fernando Veríssimo. É diferente dos dias de hoje, em que algo como 20% dos eleitores brasileiros acreditam nas narrativas do Governo.
Não deviam acreditar: narrativa, que já foi sinônimo de história, hoje está mais para lenda, mito. Mas acreditam – mesmo sabendo que renas não falam. Algumas fritam hambúrguer em redes que vendem apenas frango, outras vivem de sugar rachadinhas. Mas falar, não falam. Só escrevem.
Igualdade
O lema da Revolução Francesa – Liberdade, Igualdade, Fraternidade – é conhecido por boa parte dos nossos políticos. Nem todos são favoráveis à Liberdade e vivem tentando desmontar a democracia. Há quem ache que a Fraternidade é descartável: a morte de parte da população pelo atraso de vacinas e a fome por falta de recursos (desviados para outras finalidades, tais como campanhas eleitorais) não são consideradas importantes. Igualdade é outra coisa: quase todos desejam, principalmente quando lhes é favorável.
O caso do “orçamento secreto”, ou das “emendas de relator”, um esquema de distribuição de verbas que oculta o parlamentar que as distribui, é um ótimo exemplo: os governistas falam a favor, e recebem boas verbas do orçamento secreto; os oposicionistas falam contra, às vezes com veemência, e recebem também boas verbas do orçamento secreto (isso explica como é que Arthur Lira se elegeu presidente da Câmara, como candidato de Bolsonaro, tendo o voto de tantos parlamentares oposicionistas).
Os meus, os nossos
O Globo fez um levantamento de quanto coube de orçamento secreto a cada partido oposicionista. O maior beneficiado foi o PSD, R$ 612 milhões distribuídos entre 44 deputados. O PT recebeu R$ 34 milhões, distribuídos entre três deputados. Diferença das verbas ofertadas ao PSD e ao PT: de 13,9 milhões para 11,3 milhões por pessoa. O feroz oposicionista PSDB faturou R$ 90 milhões, distribuídos entre 17 deputados, ou R$ 5,3 milhões por pessoa. Sérgio Moro é o candidato do Podemos, R$ 72 milhões para oito deputados – R$ 9 milhões cada um. E Ciro Gomes viu seu PDT dividir R$ 59 milhões via onze deputados: R$ 5,6 milhões por pessoa, pouco mais que o atribuído ao PSDB.
Quanto aos partidos governistas, o céu é o limite.
Desvendando segredos
Não se impressione com a enorme quantidade de candidatos à Presidência de que nunca ouviu falar. Tranquilize-se: não ouviu, não ouve, não ouvirá. Só estão ali para marcar presença e não gastarão quase nada das bilionárias verbas de campanha (que, a propósito, é o caro leitor que paga). O objetivo de muitos partidos não é a Presidência, mas a bancada na Câmara Federal. É o tamanho da deputança que define a distribuição do Fundo Partidário pelos partidos. Analisar a trajetória de certos partidos é como investigar crimes: o importante é seguir o caminho do dinheiro.
Mas só até certo ponto: acharam aquele monte de dinheiro no apartamento de um parlamentar baiano, ele foi condenado a 14 anos e dez meses de prisão. Logo obteve prisão domiciliar e em pouco tempo passou a regime semiaberto. Tem de passar a noite em casa.
Outro parlamentar, no momento em que a Federal chegou à sua casa, pôs parte do dinheiro na cueca e outra parte, enroladinha, em um orifício corporal que se imaginava de saída. Foi descoberto. E continua exercendo o mandato.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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