A queda de quem nem subiu

(*) Carlos Brickmann

O presidente do Flamengo foi convidado para a presidência do Conselho da Petrobras e aceitou. O economista especializado em assuntos petrolíferos Adriano Pires foi convidado para ser o presidente da Petrobras e aceitou. Só que se tratava de uma Operação Tabajara: pelas normas da Petrobras, nem um nem outro poderiam ocupar os cargos, não por falta de competência, mas porque as atividades que já exercem não permitem que assumam a empresa.

O presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, desistiu da indicação por pretender, segundo disse, dedicar todo seu tempo ao clube – mas, alguns dias antes, essa ideia de se dedicar totalmente ao clube nem havia sido citada. E o economista Adriano Pires, antes entusiasmado diante da perspectiva de ser presidente da maior empresa brasileira, de repente perdeu o entusiasmo.

Traduzindo: ambos têm conflitos de interesses. Pires é um dos maiores e mais cobiçados consultores de empresas privadas de petróleo e gás. É ligado à Associação Brasileira de Empresas de Gás, Abegás, a Carlos Suarez (que já foi o S da OAS e hoje é grande distribuidor de gás), a Rubens Ometto (da Compass). Landim é também ligado a Suárez, que tem muitos acordos e propostas à Petrobras, e lhe caberia discutir esses acordos e decidir ou não colocá-los em vigor. Há também discordâncias que poderiam levar Landim, como presidente do Conselho da Petrobras, a decidir se a empresa deveria ou não processá-lo – o que, cá entre nós, seria uma situação muito estranha.

Sim, Pedro Bó

O ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, conhece bem Adriano Pires, e disse que era uma excelente indicação para comandar a Petrobras. O presidente Bolsonaro, ao convidar Landim, vestiu a camiseta do Flamengo. Os dois sabiam das coisas? Deviam saber, porque todas as informações sobre ambos constam dos relatórios da Petrobras a respeito de normas de governança. A Petrobras tem ações negociadas em Bolsa, no Brasil e nos EUA, e Operações Tabajara podem dar processos caríssimos.

Laços de família

O caso já é conhecido, mas deixa uma pergunta: que tipo de educação recebeu um rapaz que, sabendo que uma jovem grávida foi presa, torturada e largada nua num quarto escuro, com uma enorme jiboia por perto, resolve fazer piada com isso? Tamanha cafajestice não fere o decoro parlamentar?

A caverna do Tesouro

Em 2019, o FNDE, Fundo Nacional de Desenvolvimento Educacional, abriu concorrência pública para levar notebooks a escolas públicas. Foi uma barbaridade: a CGU, Controladoria Geral da União, mostrou que seriam comprados 118 notebooks para cada estudante de uma escola pública de Itabirito, Minas.

Em outras escolas, a abundância seria menor: de dois a cinco computadores por aluno. A concorrência de R$ 3 bilhões foi suspensa (e o presidente Bolsonaro alega que, tendo sido a manobra descoberta por órgãos governamentais de controle, não houve corrupção). Mas ninguém investigou quem multiplicou o número de notebooks a comprar.

Agora, repete-se o problema: o mesmo FNDE abriu concorrência para a compra de ônibus escolares, dispondo-se a pagar R$ 730 milhões acima do preço do mercado. O Tribunal de Contas permitiu a abertura de concorrência, mas que só será validada depois que explicarem direitinho o superpreço dos ônibus.

Conversa doméstica

O Ministério da Educação, onde se abriga o FNDE, é exatamente aquele local onde dois pastores de fora do governo são acusados de pedir propina, até em barra de ouro, para acelerar a liberação de verbas para prefeituras. Todos os ministérios estão sob a coordenação do deputado Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil e um dos comandantes supremos do Centrão.

Pois não é que uns quatro dias antes de determinar que a concorrência fosse em frente, o presidente do FNDE se reuniu com o ministro Ciro Nogueira?

Opostos e iguais

E do outro lado – do até agora favorito Luís Inácio Lula da Silva? Pois é: ele promete censurar a imprensa (opa, o nome é “controle social da mídia”), eliminar o teto de gastos, que enquanto foi deixado em paz levou a inflação para 3% ao ano, aumentar os gastos públicos. Ah, mas Lula tem como vice o ex-governador paulista Geraldo Alckmin! Porém, qual deles? Aquele que fazia críticas pesadíssimas a Lula? Ou o que acha que a opinião pode mudar conforme o sopro dos ventos? O atual Alckmin é socialista, filiado ao PSB. Antes dele, quem foi socialista, filiado ao mesmo PSB, era Paulo Skaf, que hoje é aspirante a vice na chapa bolsonarista ao governo de São Paulo.

Boa notícia

O primeiro submarino convencional produzido pela Marinha (serão quatro) incorpora-se à frota em maio. Está prontinho, todos os testes já foram realizados. E começa a construção do primeiro submarino nacional de propulsão nuclear, o Álvaro Alberto.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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