(*) Carlos Brickmann
Há coisas em que é difícil acreditar, mas que ocorreram: no Brasil, já houve época em que os candidatos diziam aos eleitores seus planos de governo. Até cumpriram as promessas: Dutra manteve o país na linha da Constituição, Getúlio Vargas multiplicou o salário mínimo, Juscelino foi o responsável por um enorme volume de obras e atração de capitais externos.
Hoje as coisas mudaram: o tema é dinheiro. Boa parte do PSDB não quer ter candidato à Presidência, porque teria de oferecer-lhe verba de campanha; e só aceita apoiar Simone Tebet, do MDB, se não tiver de gastar nada com isso. O pessoal quer poupar o custo de disputar a Presidência para ficar com mais dinheiro para suas campanhas. O União Brasil rifou Sérgio Moro, que foi para lá pensando em ser candidato à Presidência, e deixou Luciano Bivar, o famoso “quem?”, como cabeça de chapa. Com isso, Bivar, presidente do partido, controlará toda a verba de campanha. Bolsonaro ameaça as eleições se não houver auditoria das urnas (“sem auditoria não haverá eleição”, disse), mas seu PL está pensando se vale a pena gastar R$ 1,35 milhão com isso.
A campanha é milionária: são R$ 5,9 bilhões, mais o Fundo Partidário, mais o vale-tudo, que vai de showmícios (que são proibidos) até uso de verba oficial – por exemplo, via orçamento secreto, 20% de todas as ambulâncias oficiais foram compradas para o Piauí, Estado do ministro Ciro Nogueira. E até passeata de jegue apoiando candidato sai por conta do nosso bolso.
Querem mais
A farra com dinheiro público não acontece apenas em órgãos nacionais ou regionais: pequenas cidades pobres fizeram contratos tão escandalosos de espetáculos que alguns chegaram a ser suspensos. O sertanejo Gusttavo Lima foi contratado por São Luís (de Roraima) para um show por R$ 800 mil, ou quase 2% de todo o orçamento anual da Prefeitura. A coisa chegou tão longe que há dois projetos para limitar gastos. Em um, do deputado Célio Studart, do PSD – Ceará, os governos poderão gastar em espetáculos, no ano, até 1% de seu orçamento. Desta quantia, o máximo a ser gasto seria 20% por show.
O vereador Fernando Holiday, do Novo – São Paulo, propõe R$ 70 mil como o máximo para contratar um artista sem necessidade de licitação.
Palpite do colunista: nenhum dos dois projetos será aprovado como está.
O nosso é deles
O problema é que a ideia de que o dinheiro público pode ser gasto sem controle por quem está no poder se espalhou no país. Exemplo? Um voo já antigo, em que o então governador cearense Cid Gomes levou a esposa e a sogra, provocou escândalo no país. Hoje, isso ocorre todos os dias e já passa despercebido. Parentes, parentes de amigos, o cabeleireiro da esposa, todos já viraram passageiros comuns. De acordo com as normas, pode viajar quem tiver de participar da tarefa a ser desempenhada pela autoridade que pediu o avião. As exceções são o pessoal médico e o de segurança (e, ao que parece, quem mais quiser e for amigo dos viajantes). Em países mais pobres, como a Alemanha, o marido da então chanceler Angela Merkel não viajava com ela no avião oficial. Até poderia ir, mas teria de pagar tarifa cheia de primeira classe. Nos Estados Unidos, nem sempre é possível acompanhar o presidente usando voos comerciais. Há lugares para jornalistas no avião presidencial, e a conta é alta: tarifa cheia de primeira classe, sem exceções.
Como é mesmo?
O presidente Bolsonaro moveu pesada campanha contra a urna eletrônica porque, dizia, se o voto não fosse impresso a contagem não seria auditável. Estranho: se o PL, o partido de Bolsonaro, está discutindo se deve ou não gastar R$ 1,35 milhão na auditoria, isso significa que é auditável, sim.
Sinais eleitorais
Alexandre Kalil, do PSD, em segundo lugar nas pesquisas para o Governo de Minas, fechou acordo com Lula. O governador Romeu Zema, do Novo, em primeiro nas pesquisas, conversou longamente com Bolsonaro. Quer seu apoio, mas teme a alta rejeição do presidente. Pelo menos no primeiro turno, não haverá aliança: Zema disse que apoia o candidato do Novo ao Planalto, o cientista político Luís Felipe d’Ávila. No segundo… como diz o próprio Zema, em política as coisas mudam. Embora não diga, vai de Bolsonaro.
Dallagnol sem multa
O procurador Deltan Dallagnol, da Operação Lava Jato, ganhou na Justiça Federal e ficou livre de restituir ao Tesouro algo como R$ 2,8 milhões, pagos como diárias e viagens a promotores de fora chamados para ajudar nos processos. De acordo com o Tribunal de Contas da União, houve custos excessivos, que poderiam ter-se reduzido se fossem planejados com maior eficiência. Para o juiz-substituto da 6ª Vara Federal de Curitiba, Augusto César Pansini Gonçalves, a exigência de devolução é ilegal. Diz o juiz: “Deltan não ordenou despesas nem arquitetou o modelo de pagamento das diárias e passagens dos colegas”. Deltan disse que foi uma vitória da Justiça.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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