O grau de desfaçatez do presidente Jair Bolsonaro é tamanho, que chega a ser estupefaciente. Após o desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, em 5 de junho, na região do Vale do Javari, no extremo oeste do Amazonas, Bolsonaro simplesmente se calou, como se o caso devesse ser tratado com irresponsabilidade.
Na última terça-feira (7), quando o presidente classificou o desaparecimento como fruto de uma “aventura não recomendável”, o Comando Militar da Amazônia (CMA) divulgou nota informando que só participaria das buscas após “acionamento por parte do Escalão Superior”. Isso significa que, 48 horas depois do desaparecimento, o CMA aguardava ordens do comando do Exército para entrar em ação.
Na noite de quarta-feira-feira (8), Bolsonaro viajou a Los Angeles, nos Estados Unidos, onde participou do Cúpula das Américas e reuniu-se com o presidente Joe Biden na quinta-feira. O desparecimento de Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips não foi abordado durante o encontro, que teve na pauta temas ligados à preservação ambiental, democracia, políticas de imigração e o respeito ao sistema eleitoral brasileiro.
Bolsonaro, que após os compromissos relacionados à Cúpula deveria rumar direto para a Amazônia com o intuito de acompanhar de perto as operações de busca por Bruno e Dom, preferiu ir a Orlando participar de uma “motociata” com apoiadores, os patriotas de camelô que a milhares de quilômetros de distância da realidade defendem um genocida adepto da ditadura e de torturadores.
Com a repercussão do caso e a diante da inação oficial, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o governo adotasse “todas as providências necessárias” para encontrar a dupla.
“É dispensável o senhor Barroso dar uma de ‘dono da verdade’. (…) Ele (Barroso) se preocupou apenas com esses. Nós nos preocupamos com todos os desaparecidos no Brasil”, afirmou.
Ciente de que a repercussão do desaparecimento do indigenista e do jornalista britânico saiu do controle do Palácio do Planalto e ultrapassou as fronteiras do País, podendo provocar mais danos ao seu projeto de reeleição, Bolsonaro recorre ao populismo barato e criminoso para confundir a parcela desavisada da opinião pública.
Ataques ao ministro Luís Roberto Barroso tornaram-se comuns na retórica de Bolsonaro, mas afirmar que está preocupado com todos os desaparecidos é no mínimo galhofa ou delinquência intelectual. Isso porque o governo, por determinação do presidente da República, trabalha nos bastidores para acabar com a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP).
O presidente da CEMDP, Marco Vinícius Pereira de Carvalho, convocou a 84ª reunião do órgão para o próximo 28 de junho. Na reunião, os integrantes do colegiado pretendem aprovar um relatório final, o que significa decretar o fim da comissão, mesmo que ainda existam desparecidos desde a ditadura militar.
A CEMDP foi criada em 1995, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, para em consonância com as disposições transitórias da Constituição de 1988, reconhecer a responsabilidade do Estado brasileiro no desaparecimento e na morte de presos políticos.
Advogado, bolsonarista sabujo e simpatizante do regime militar, Marco Vinícius Pereira de Carvalho foi nomeado para o cargo pela então ministra Damares Alves, que continua alegando ser defensora dos direitos humanos. Antes da nomeação, Carvalho ganhou o noticiário ao patrocinar ação para impedir a posse do ex-presidente Lula como chefe da Casa Civil, em 2016, e o impeachment do ministro Dias Toffoli, do STF.
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