Defesa de Bolsonaro ignora requisitos da delação e afirma que Cid contou mentiras que “beiram o ridículo”

Em qualquer parte do planeta, o crime compensa na extensa maioria das vezes aos advogados. Principalmente se o acusado de cometer um crime for pessoa pública e tiver recursos suficientes para custear uma defesa de ponta. O UCHO.INFO nada tem contra a relação financeira entre advogado e cliente. Cada profissional cobra honorários na proporção da própria competência. Isso não significa que para defender um acusado a incoerência tenha primazia.

Um dos mais renomados criminalistas do País, o advogado Celso Vilardi apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira (6), a defesa de Jair Bolsonaro. Vilardi cumpriu o prazo de 15 dias dado pelo ministro Alexandre de Moraes para a apresentação da resposta à denúncia formulada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

No documento, Celso Vilardi questiona a competência da Primeira Turma do STF para julgar o ex-presidente, afirma que a Polícia Federal realizou pesca de provas contra o cliente, o que é vedado pela Justiça, e elenca uma série de argumentos para invalidar a delação do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid.

Diferentemente do que ora alega, o criminalista, antes de assumir a coordenação da defesa de Jair Bolsonaro, criticou a tentativa de golpe de Estado e elogiou o trabalho de investigação da Polícia Federal. Causa espécie a repentina mudança de opinião.

Alguém há de dizer que todos têm direito ao devido processo legal e à ampla defesa, como preconiza a Constituição Federal. O UCHO.INFO sempre foi defensor de tais direitos, aos quais não renuncia. Contudo, para não enfrentar a chamada “saia justa”, advogado deve evitar comentários sobre questões políticas, principalmente as que envolvem tentativa de golpe de Estado e outros crimes. Do contrário, o melhor é recusar a oferta para defender golpistas.

O advogado destaca que “não bastasse ter mentido” na delação, “Mauro Cid também faltou com o dever de sigilo previsto” em seu acordo de colaboração. Em meio às investigações, Cid foi gravado por um interlocutor relatando fatos sobre a delação, dizendo que tinha sido pressionado pela PF a contar fatos que não eram verdadeiros apenas para incriminar Bolsonaro.

Ele cita uma audiência em que Cid foi questionado pelo juiz Airton Vieira sobre a identidade do interlocutor com quem conversou sobre a delação.

“A resposta foi de que ele não sabia ao certo, mas, como o seu círculo de amizades estava muito restrito, ele acreditava que o diálogo somente poderia ter se dado com um familiar ou com um amigo muito próximo”, relata a defesa de Bolsonaro.

No texto, o advogado insere a resposta de Mauro Cid, que disse: “Eu tô bem recluso, a minha vida tá sendo praticamente em casa, eu não tenho vida social, não tô trabalhando, e com quem eu me comunico, eu sou um circo de amigos muito próximos e familiares próximos. E efetivamente, pra quem eu falei, quem eu conversei, eu não me lembro. Até porque, como era uma conversa privada particular, de um desabafo, de um momento psicológico ruim, foi alguém próximo da família ou de um amigo muito próximo. Então, a gente ainda não conseguiu identificar quem seria, quem foi essa pessoa que eu conversei”.

“A estória de que o interlocutor era um familiar ou amigo próximo beira o ridículo, como também soa patética a afirmação de que não se lembra com quem teria mantido o diálogo”, segue a defesa de Bolsonaro.

“E é de se indagar: por que ele mentiria para um familiar ou amigo muitíssimo próximo afirmando que estava sendo coagido pela Polícia para confirmar uma narrativa pronta?”, diz ainda o advogado, argumentando que de fato Cid mentiu para a PF por estar sob pressão.

“Mesmo que fosse possível acreditar na narrativa do Colaborador sobre o vazamento, é certo que mentir e revelar o acordo constituem causas de rescisão, conforme expressamente consta do contrato de colaboração”, diz ainda o defensor.

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Longe de querer ingressar no campo da ousadia, é bom lembrar que acordo de colaboração premiada não é prova, mas apenas e tão somente meio de prova. O delator assume o compromisso de não faltar com a verdade e relatar fatos passíveis de comprovação, sob pena de ter o acordo invalidado, o que significa perda de benefícios. Mesmo que isso viesse a ocorrer, as provas colhidas na esteira de acordo de delação rompido continuam válidas.

Faz-se necessário lembrar que a denúncia apresentada pela PGR não está baseada nos depoimentos de Mauro Cid, mas nas provas obtidas a partir de detalhes revelados no escopo da delação. Se a Polícia Federal obteve um cipoal de provas a partir dos depoimentos, o elogio anterior de Vilardi ao trabalho de investigação é pertinente.

Diante do conjunto probatório carreado ao inquérito, a chance de Bolsonaro ser condenado é grande. Isso explica o “jus sperniandi” adotado pela defesa. Quanto mais a ação penal for procrastinada à sombra de inventivas alegações jurídicas, melhor para o acusado, pois mantém certa distância da privação de liberdade.

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