Investigação de uma comissão da Organização das Nações Unidas (ONU) apontou que Israel liderou “atos genocidas” na Faixa de Gaza, incluindo diversas formas de violência sexual e de gênero contra a população palestina, e as quais podem ser consideradas crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
De acordo com a comissão, Israel “atacou e destruiu de maneira intencional” o principal centro de fertilidade do território palestino. Além disso, bloqueou a entrada de medicamentos necessários para tratar grávidas e usados em partos e cuidados neonatais.
Como resultado, “mulheres e adolescentes morreram devido a complicações durante a gravidez ou o parto devido às restrições impostas pelas autoridades israelenses”, algo que poderia ser considerado um crime contra a humanidade de “extermínio”, afirmou um relatório divulgado pela comissão.
O relatório, apresentado pela Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre o Território Palestino Ocupado (criada em 2021 pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU), se estende por 50 páginas.
“As evidências coletadas revelam um aumento terrível na violência sexual e de gênero”, destacou ao apresentar o relatório a jurista sul-africana Navi Pillay, presidente da comissão.
O documento aponta ainda que esse tipo de violência teria se tornado “uma estratégia de guerra de Israel para dominar e destruir o povo palestino”.
Segundo os investigadores, a prática se enquadra em duas das cinco categorias definidas pela Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio: a “submissão intencional do grupo a condições de existência que acarretem sua destruição física, total ou parcial” e a imposição de “medidas destinadas a impedir nascimentos no grupo”.
Clínica destruída
O relatório afirmou que os hospitais e departamentos de maternidade em Gaza foram sistematicamente destruídos, assim como a principal clínica de fertilização in vitro do território, bombardeada em dezembro de 2023.
A comissão acredita que o ataque foi intencional e alega não ter encontrado nenhuma evidência confiável de uso militar da clínica, que armazenava 4 mil embriões.
Assim, a comissão concluiu que a destruição “foi uma medida direcionada a impedir os nascimentos de palestinos em Gaza, o que é um ato genocida”.
Alguns dos abusos relatados no relatório incluem estupro de detentos, tratamento humilhante em centros de detenção, batidas policiais e postos de controle, além de forçar vítimas a se despir ou ser fotografadas e filmadas em circunstâncias degradantes.
A comissão também documentou casos em que mulheres e meninas de todas as idades, incluindo mulheres grávidas, teriam sido alvos diretos de ataques de franco-atiradores, o que o relatório também define como crime contra a humanidade e crime de guerra.
Esses abusos, argumenta Pillay, foram cometidos em um clima de impunidade que deve ser combatido com investigações envolvendo “o Tribunal Penal Internacional ou tribunais nacionais, seja sob suas leis nacionais ou exercendo jurisdição universal”.
Israel reage
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, criticou o relatório, que chamou de “falso e absurdo”.
“O circo anti-israelense conhecido como Conselho de Direitos Humanos da ONU (…) opta novamente por atacar o Estado de Israel com acusações falsas, incluindo afirmações absurdas” de destruição de instalações de atendimento de saúde sexual e reprodutiva em Gaza, afirmou um comunicado divulgado pelo gabinete de Netanyahu.
“Em vez de se concentrar nos crimes contra a humanidade e nos crimes de guerra cometidos pela organização terrorista Hamas no pior massacre contra o povo judeu desde o Holocausto, a ONU optou mais uma vez por atacar o Estado de Israel com acusações falsas”, apontou o comunicado.
Israel acusou ainda a comissão de trabalhar “com uma agenda política tendenciosa e pré-determinada (…) em uma tentativa sem vergonha de incriminar as Forças de Defesa de Israel”. Em 6 de fevereiro, o governo israelense formalizou sua retirada de todas as atividades relacionadas ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.
Navi Pillay
A Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre o Território Palestino Ocupado, presidida por Navi Pillay, foi criada em maio de 2021 para apurar supostas violações do direito internacional em Israel e nos Territórios Palestinos.
Nascida na cidade sul-africana de Durban, Navi Pillay, ex-comissária da ONU para os Direitos Humanos, foi juíza no Tribunal Penal Internacional (TPI).
Durante 28 anos como advogada na África do Sul, defendeu ativistas do movimento anti-Apartheid e ajudou a expor o uso da tortura e as péssimas condições dos prisioneiros políticos no país. Quando seu marido, Gaby Pillay, foi preso, Navi conseguiu impedir que a polícia usasse métodos de interrogatório ilegais contra ele.
Em 1973, Navi Pillay conseguiu garantir aos presos políticos, inclusive Nelson Mandela, o direito ao acesso a um advogado.
Em 1995, um ano depois que o Congresso Nacional Africano chegou ao poder, Mandela nomeou Navi para a Suprema Corte da África do Sul.
Em 2 de julho de 2008, o então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, indicou-a para suceder a Louise Arbour como Alta Comissária para Direitos Humanos. (Com agências internacionais)
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