O figurino de Janja, o “imundinho fashion” e o sequestro da camisa da seleção

(*) Ucho Haddad

Tenho pavor de pessoas que regurgitam tendências, que lideram patrulhas para condenar o que não está na moda. Quem ao redor do planeta tem moral para ditar o que é moda e o que não é. Não é de hoje que enxergo e trato o universo da moda como imundinho fashion. É algo tão falso, raso e nauseante, que não há, na minha modesta opinião, como ser tratado de outra maneira.

Essas figuras que gravitam na órbita do imundinho fashion parecem ter saído de um mesmo molde, são irritantemente iguais, vestem-se de maneira idêntica, seguem tendências (termo que abomino). Ousam ditar regras e condenar quem não segue a cartilha do comportamento détraqué. São toscas e ignorantes, a ponto de desconhecerem o significado da palavra détraqué, que cai como luva sobre esse comportamento desajustado, sem identidade e individualidade.

Nasci rebelde, mas sempre cultivei a coerência. Por isso não aceito quem queira impor opiniões e regras que, sob minha maneira de ver e viver, são absurdas. Moda é aquilo que me faz sentir bem, que proporciona conforto. Moda é o que cabe no bolso de cada um. Pouco importa se o que visto, o que uso e o que faço passa longe das tendências. Às favas as tendências e seus torpes defensores e propagadores.

O imundionho fashion tornou-se ainda mais insuportável com o surgimento dos chamados influenciadores. Não nasci para que alguém tente moldar o meu pensamento, a minha opinião. Tratei de escapar do serviço militar para não ser obrigado a prestar continência a quem acredita ser superior. O imundinho fashion repete e reverbera a utopia da caserna. Todos fardados, seguindo ordens, repetindo gestos e movimentos.

Acompanhando notícias e as redes sociais, sinto profunda pena dos que se deixam levar por pessoas que desconhecem o que tentam impor algo supostamente correto. O pior é que tais pessoas ganham dinheiro com uma atividade que causa engulhos, nada acrescenta e leva ao abismo da insensatez.

Hoje, atraiu minha atenção uma manchete que anunciava entrevista com determinada figura apresentada como empresária e influenciadora. Empresária do quê? Influenciadora do quê, de quem?

Nos últimos dias, a Pauliceia Desvairada, mais uma vez, serviu de palco para a São Paulo Fashion Week, evento de moda em que estilistas colocam na passarela criações impossíveis de serem usadas no cotidiano, mesmo com enorme esforço da paciência e do raciocínio.

Cá não estou para tratar dos devaneios recorrentes dos tais vanguardistas (sic) da moda, mas para criticar matéria jornalística sobre o figurino usado por Rosângela Lula da Silva, a Janja, em determinado desfile da SPFW. Há um cipoal de assuntos importantes e urgentes que deveriam merecer a atenção da imprensa, mas há quem se dedique a escrever baboseiras aos bolhões.

Sabem os que acompanham o meu trabalho como jornalista que tenho reservas em relação a Janja, pois entendo que a primeira-dama há muito passou do ponto. Janja era ilustre desconhecida, mas repentinamente caiu como meteoro desgovernado nos céus das celebridades. Há quem aplauda, há quem critique. Não faço parte da claque, faço críticas quando necessário e de forma coerente. Saudade da Dona Ruth Cardoso!

Voltando ao figurino da Dona Janja… A matéria mencionou que a primeira-dama compareceu ao desfile de certa grife usando jaqueta jeans, saia preta e camiseta com a frase “a vida presta”. O que tenho a ver com a roupa da senhora Lula da Silva. Falta de criatividade de quem perdeu tempo produzindo uma avalanche de bobagens.

Alguém pode questionar o motivo que me levou a ler a pífia matéria, já que o assunto é abominável. Li pelo simples fato de que o jornalismo atual, vazio e rasteiro, proporciona a sensação de que o ofício está com os dias contados. Tenho direito à indignação. Disse o grande e saudoso Darcy Ribeiro: “Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca”. Resignação não consta do meu dicionário. Indignação, sim.

O que mudou no planeta a partir da roupa da Dona Janja? Nada, nada vezes nada! A matéria serviu de latrina para o preconceito, para o extremismo desembestado que embala o País. Serviu para as subcelebridades palpitarem e filosofarem sobre moda e tendências (sic).

No rodapé da matéria, um amontoado de comentários esdrúxulos, alguns mesclando conceitos de moda, ideologia e intolerância política. Um afirmou que Janja é cafona, outro quer saber quem custeou a viagem de Brasília a São Paulo.

Janja é casada com o presidente da República, status que proporciona algumas regalias. Só os mandarins do golpismo têm direito a mordomias, podem quitar financiamento de mansão da noite para o dia, sem maiores explicações?

Não quero ingressar no terreno da política, mas não custa lembrar da Val do Açaí, do advogado Frederick Wassef (recomprou nos Estados Unidos o Rolex vendido por Bolsonaro) e de Fabrício Queiroz, aquele que pagava as contas do filho “01” com dinheiro vivo, fruto das rachadinhas, e fez depósitos na conta da Dona Michelle, conhecida nos bastidores da maledicência como “Micheque”. Meteórica lembrança.

Sugiro aos responsáveis pela citada matéria que publiquem um texto sobre o sequestro da camisa da seleção brasileira, que os golpistas utilizam como farda desde antes da fracassada tentativa de golpe de Estado. E continuam usando nas manifestações em defesa da anistia.

Resumindo, sequestraram a “amarelinha” para borrifar Brasil afora o falso patriotismo. Isso vai além da cafonice, é crime contra um símbolo nacional, é propaganda enganosa. Defendem o golpe e posam de defensores da pátria. A maioria, como sempre, tomada por silêncio vergonhoso. Infelizmente, pensar saiu de moda, não é tendência.

(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, fotógrafo por devoção.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.

Se você chegou até aqui é porque tem interesse em jornalismo profissional, responsável e independente. Assim é o jornalismo do UCHO.INFO, que nos últimos 20 anos teve participação importante em momentos decisivos do País. Não temos preferência política ou partidária, apenas um compromisso inviolável com a ética e a verdade dos fatos. Nossas análises políticas, que compõem as matérias jornalísticas, são balizadas e certeiras. Isso é fruto da experiência de décadas do nosso editor em jornalismo político e investigativo. Além disso, nosso time de articulistas é de primeiríssima qualidade. Para seguir adiante e continuar defendendo a democracia, os direitos do cidadão e ajudando o Brasil a mudar, o UCHO.INFO precisa da sua contribuição mensal. Desse modo conseguiremos manter a independência e melhorar cada vez mais a qualidade de um jornalismo que conquistou a confiança e o respeito de muitos. Clique e contribua agora através do PayPal. É rápido e seguro! Nós, do UCHO.INFO, agradecemos por seu apoio.