STF condena Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão por golpe de Estado e outros quatro crimes

O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta quinta-feira (11) o ex-presidente Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão por golpe de Estado, organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

A decisão inédita na história do judiciário brasileiro ocorre dois anos e oito meses após uma turba de manifestantes invadir e depredar a Praça dos Três Poderes, em Brasília.

Quatro ministros da Primeira Turma do STF entenderam que Bolsonaro foi responsável não apenas por insuflar seus apoiadores a rejeitarem o resultado das urnas, mas também por liderar um plano orquestrado para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outras autoridades, propagar desinformação sobre o sistema eleitoral, instituir uma intervenção militar e se manter no poder após sua derrota na eleição presidencial de 2022.

Votaram pela condenação Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Isolado, Luiz Fux apresentou divergência, pediu nulidade do processo e inocentou Bolsonaro.

STF estipula 27 anos e três meses de prisão

No cálculo da pena, Moraes considerou como agravante o fato de Bolsonaro ter sido tomado como líder da trama golpista, e citou as condições de culpabilidade, circunstância e consequências do crime como desfavoráveis ao réu. A idade do ex-presidente, porém, levou à atenuação do cálculo.

Do total, 2 anos e 9 meses são em regime de detenção, ou seja, aberto ou semiaberto. A prisão deve se iniciar em regime fechado e não tem efeito imediato, já que a execução só ocorre após trânsito em julgado.

A defesa de Bolsonaro ainda pode apresentar embargos de declaração acusando contradição ou omissão dos magistrados. O recurso é avaliado pela mesma Primeira Turma e raramente leva à extinção da condenação.

A decisão poderia subir ao Plenário da Corte se houvesse mais de dois votos divergentes do relator, o que não ocorreu. Juristas discutem, porém, a possibilidade de a defesa questionar a dosimetria da pena no colegiado de 11 ministros.

Bolsonaro segue recluso em prisão domiciliar, investigado por tentativa de obstrução da Justiça. Os advogados também podem solicitar a prisão domiciliar “humanitária” do ex-presidente por motivos de saúde, emulando decisão de Moraes a respeito do também ex-presidente Fernando Collor.

Oito réus condenados, incluindo militares

Além de Bolsonaro, também foram condenados outros sete réus que compõem o núcleo crucial da trama golpista. Para os magistrados, eles articularam o plano Punhal Verde e Amarelo, fomentaram manifestações antidemocráticas, cooptaram as Forças Armadas e órgãos de inteligência e usaram sua posição no governo para minar o exercício dos poderes constitucionais.

São eles:

Tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Braço direito do ex-presidente, esteve presente em diversas reuniões que levaram à arquitetura do plano de golpe. Sua delação foi peça principal para a denúncia da PGR. Condenado a 2 anos de prisão, segundo acordo de delação.

General Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e ex-vice na chapa de Bolsonaro em 2022. Articulador da trama golpista e responsável pelo plano para assassinar autoridades. Condenado a 26 anos prisão.

Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Utilizou a estrutura da Abin para espionar opositores e favorecer os interesses políticos de Bolsonaro. Ramagem foi condenado a 16 anos de prisão somente pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

Almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha. Apoiou planos de intervenção militar e ajudou a elaborar minuta golpista. Condenado a 24 anos de prisão.

General Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Representava a face “institucional” do golpe dentro do governo, conferindo legitimidade militar às conspirações. Condenado a 21 anos de prisão.

General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa. Integrou o núcleo militar que apoiou a narrativa de fraude eleitoral e usou seu cargo para realizar pressão institucional. Condenado a 19 anos prisão.

Anderson Torres, ex-ministro da Justiça. É acusado de ter se omitido no 8 de janeiro de 2023, quando comandava a segurança do Distrito Federal e bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília. Foi em sua casa que a PF encontrou a minuta de um decreto para instaurar um estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Condenado a 24 anos de prisão.

Outras sanções também foram aplicadas, como a perda de mandato de Ramagem, e a inelegibilidade dos réus por oito anos.

Como votou cada magistrado

Relator do processo, Moraes concluiu que os réus “praticaram todas as infrações penais imputadas pela Procuradoria-Geral da República”. Segundo ele, as investigações apontaram “não haver nenhuma dúvida de que houve tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito” liderada por Bolsonaro.

“Jair Bolsonaro exerceu o papel de líder da organização criminosa, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para implementação do projeto autoritário de poder”, declarou.

Em sua manifestação, Dino também acatou a tese da PGR na íntegra, detalhou a participação de todos os acusados e se manifestou pela condenação dos oito réus. Para o ministro, houve atos executórios para realização da tentativa golpista.

“Não se cuidou de mera cogitação. Não se cuidou de meras reflexões, que foram indevidamente postas em agendas, cadernos e folhas”, afirmou.

A ministra Cármen Lúcia endossou a posição de que Bolsonaro praticou tais crimes na condição de líder da organização criminosa. “Diferente do alegado, ele não foi tragado para o cenário das insurgências. Ele é o causador, ele é o líder de uma organização”, disse.

Fux foi o único a divergir dos demais colegas do órgão. Ele pediu a nulidade do processo e a absolvição de Jair Bolsonaro de todos os crimes, afirmando que não há provas para aceitar acusações contra o ex-presidente.

Para o ministro, a PGR “adotou uma narrativa desprendida dos fatos”. Fux classificou como “ilações” da PGR a afirmação de que teria havido uma ligação de Bolsonaro com os golpistas que depredaram a sede do Supremo, o Congresso e o Palácio do Planalto. O ministro também discordou da acusação de que o ex-presidente foi responsável pela propagação de ataques ao sistema eleitoral.

Por outro lado, pediu a condenação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e do general da reserva Walter Braga Netto.

Último a votar, o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin, acredita que a trama não se concluiu na cogitação do golpe, mas em ações voltadas para a permanência de Bolsonaro no poder.

“Primeiro, pela tentativa frustrada de coatar a atuação do Judiciário e de interferir nas eleições. Depois, por meio de atos de força que viabilizassem como estopim a deflagração de uma resposta institucional armada com apoio das Forças Armadas e manutenção do grupo no poder”, afirmou.

“Compreendo que a PGR teve êxito em demonstrar que os discursos públicos do ex-presidente não representaram exercício regular do direito de crítica, mas uma estratégia de corrosão progressiva da confiança pública nas instituições democráticas como afirmado na peça ministerial”, continuou. (Com Deutsche Welle e agências de notícias)

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