Pode parecer teimosia de nossa parte cobrar coerência e isonomia por parte dos cidadãos, principalmente das autoridades, mas uma democracia de fato e de direito não prospera sem esse binômio. Cumprir a lei de acordo com o interesse do “cliente” é preâmbulo de um Estado totalitário travestido de democrático.
Mais de dois anos depois a primeira incursão da Operação Lava-Jato, o único político investigado que já responde a processo no Supremo Tribunal Federal é Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente afastado da Câmara dos Deputados. Muito estranhamente, outros parlamentares continuam à beira do caminho aguardando um posicionamento mais impetuoso da Justiça. Esse cenário é uma afronta ao Estado Democrático de Direito, no qual todos devem ser tratados igualmente, sem privilégios ou rapapés.
Para fechar o cerco em torno de Cunha, o juiz federal Sérgio Moro aceitou denúncia contra a jornalista Cláudia Cordeiro Cruz, mulher do peemedebista, pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Não se pode negar que configura crime manter contas bancárias no exterior sem informar as autoridades brasileiras, principalmente quando o dinheiro que as abastece é produto é de origem ilícita, mas é preciso ampliar o entendimento sobre o tema.
Eduardo Cunha não é o único que se beneficiou das propinas do Petrolão, o maior esquema de corrupção de todos os tempos e que durante uma década funcionou de forma deliberada na Petrobras. Por isso merece ser julgado e, se necessário, condenado e preso. Não sem antes devolver o montante desviado.
Em suas trinta etapas, a Lava-Jato mandou para a cadeia mais de uma centena de investigados, alguns dos quais condenados e ainda presos. Outros foram condenados, mas deixaram a prisão na esteira de acordos de colaboração premiada. Tudo dentro do que determina a legislação em vigor.
A grande questão, que passa pelo caso de Cláudia Cruz, é que as respectivas esposas – algumas amantes também – dos executivos e donos de empreiteiras envolvidas no esquema criminoso da Petrobras também se beneficiaram do dinheiro roubado. Muitas sabiam dos crimes cometidos pelos maridos, mas não precisaram abrir contas bancárias no exterior para fazer uso do dinheiro sujo, muitas vezes utilizados para a aquisição de produtos caros e luxuosos, de grifes conhecidas e famosas, a exemplo do que fez a mulher de Cunha.
Casada com o ex-vice-presidente de uma empreiteira apanhada na Operação Lava-Jato, uma dessas cúmplices da roubalheira sempre “vendeu” a imagem de inocente, mesmo sabendo que o marido não era especialista em milagre da multiplicação. No closet de um nababesco apartamento fincado em área nobre da capital paulista, a tal mulher ostenta uma verdadeira coleção de bolsas e sapatos de marcas famosas, conjunto que a preço de mercado vale um bom punhado de dinheiro. Tudo comprado em viagens ao exterior ou em lojas de grifes internacionais aqui no Brasil.
Diz a nossa Constituição que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, o que em outras palavras significa que “o pau que bate em Chico, bate em Francisco”. Nesse caso, o pau que bate em Chica também deve bater em Francisca. Ou será que é exigir muito?