(*) Ucho Haddad
“Toda unanimidade é burra”, assim disse o polêmico dramaturgo Nelson Rodrigues. Em suma, é impossível agradar gregos e troianos, algo que no totalitarismo inexiste de forma covarde e violenta. Mesmo assim, quando alguém comemora a morte de uma pessoa, há algo errado na história de um ou de outro. Talvez nas histórias de ambos.
Fidel Castro Ruz, o comandante da Revolução Cubana, que derrubou o também ditador Fulgencio Batista, despediu-se da vida na madrugada deste sábado (horário de Brasília) e sua morte foi anunciada pelo irmão e presidente do país, o igualmente totalitarista Raúl Castro.
A lavagem cerebral a que foi submetida a extensa maioria da população cubana, em especial a porção mais idosa da sociedade local, faz com que o futuro seja incerto em termos políticos na ilha caribenha, que durante quase cindo décadas viveu no isolamento. Sempre financiada pela extinta União Soviética, que fazia da nação comandada pelo facinoroso Castro uma ameaça constante aos Estados Unidos, Cuba é o símbolo do atraso e da violação à liberdade. A partir de agora, Cuba é uma porção de terra rodeada pela incerteza, já que os comunistas que estão no poder dificilmente manterão a unanimidade à sombra da burrice.
Como todo comunista que se preza, Fidel foi um homem de frases feitas, muitas delas polêmicas e mentirosas. Mandou ao “paredón” mais de quatro mil adversários políticos, aos quais impôs a truculência de um regime utópico e criminoso. Fora isso, milhares de cubanos que tentaram fugir do regime castrista acabaram morrendo no pedaço de mar que separa Cuba do estado norte-americano da Florida, onde neste sábado (26) as comemorações foram intensas desde as primeiras horas.
Apesar disso, em 1979, antes de rumar para Nova York, onde participaria da Assembleia Geral da ONU, Fidel Castro foi questionado por um jornalista sobre o boato de que “sempre estava protegido pela roupa”. O tirano não demorou a destilar arrogância e bazófia: “Tenho um colete moral que é forte. Este tem me protegido sempre”.
Para quem eliminou aqueles que divergiram de sua ideologia sanguinária, Fidel foi um delinquente moral e intelectual festejado ao redor do planeta, como se tivesse a solução derradeira para os problemas da humanidade. Morreu como um ideólogo détraqué.
Petulante até o último suspiro, Fidel jamais se arrependeu das barbáries que cometeu ao lado dos seus “camaradas”, como Ernesto “Che” Guevara, Camilo Cienfuegos e outros bandidos mais.
“Cometi erros, mas nenhum estratégico, simplesmente tático. Não tenho nem um átomo de arrependimento pelo que fizemos em nosso país”, declarou o ditador ao jornalista espanhol Ignacio Ramonet, conforme relata o livro “Cem Horas com Fidel” (2006).
Tendo confinado o povo cubano, a quem concedia o direito de escolher entre a ditadura comunista e a perseguição seguida de morte, Fidel Castro viveu como um nababo, repetindo a receita de outros ditadores, mesmo que publicamente se apresentasse com seu enfadonho uniforme, como se sua revolução fosse um tremendo sucesso.
Não obstante, seguindo a cartilha comunista, conseguiu a proeza uníssona de socializar a miséria. Essa receita é velha e largamente conhecida no universo esquerdista, onde líderes prometem o céu à maioria, mas diante da incapacidade de entregar o prometido acabam por nivelar todos por baixo. Afinal, o ideário comunista começa com a cantilena de fazer tudo comum a todos.
Fidel manteve-se no poder durante décadas a reboque de um discurso contra o capitalismo, principalmente contra os Estados Unidos, a quem sempre acusou de querer arruinar os cubanos. Se por um lado “El Comandante” foi um embusteiro profissional e bem sucedido – pelo menos em termos de retórica –, por outro foi um péssimo mestre, para a sorte da humanidade. Até porque, seus discípulos são pífios, como mostram os tiranetes espalhados pela América Latina.
O regime castrista só aceitou retomar as relações com os EUA, acenando na direção de Washington o lenço do desespero, por questões estratégicas: dar sobrevida ao país e não sepultar a ideologia comunista, que hoje conta com algumas reles pílulas depositadas aqui e acolá.
Completando a frase de Nelson Rodrigues, “quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”. Como penso, sinto-me confortável ao existir na condição de ponto fora da curva. Mas há outra frase que me traduz: “Penso, logo existo”. Por pensar, e muito, não consigo desejar o mal a outrem, até mesmo ao pior dos inimigos, a quem sempre terei uma mão estendida.
Contudo, de igual modo, não posso desejar a Fidel que descanse em paz. Afinal, com o currículo manchado de sangue, o ditador cubano há de experimentar por muito tempo as altas temperaturas dos domínios luciferianos.
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, cronista esportivo, escritor e poeta.