No rastro do “efeito Odebrecht”, presidente do Peru renuncia

O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, apresentou nesta quarta-feira (21) sua renúncia, em meio ao segundo processo de destituição que enfrenta no Congresso do país. O líder foi acusado de envolvimento no escândalo de corrupção protagonizado pela empreiteira brasileira Odebrecht.

Kuczynski, de 79 anos, justificou sua renúncia com “clima de ingovernabilidade” que não permitiria avanços no país. O presidente deixou o cargo, no entanto, depois da divulgação de vídeos e áudios que mostram seus aliados tentando comprar votos de congressistas opositores para evitar sua destituição.

Em um vídeo gravado no Palácio de Governo no qual apareceu escoltado por todo o Executivo, o presidente denunciou a “grave distorção do processo político” causada pela divulgação de vídeos e áudios que faziam-no “injustamente parecer como culpado de atos” nos quais não tinha participado e que, por isso, “o melhor para o país é que renuncie à presidência”.

O governante, que anunciou ter enviado sua carta de renúncia ao Congresso, disse que “não pode ser um empecilho” para que seu país “encontre a via da unidade e da harmonia que me negaram”.

“Haverá uma transição constitucionalmente ordenada”, destacou, em referência ao fato de que a Constituição peruana estabelece que o cargo deve ser assumido pelo primeiro vice-presidente, Martín Vizcarra, que atualmente é embaixador peruano no Canadá.

Em sua mensagem à nação, Kuczynski disse que desde que assumiu o poder, em 28 de julho de 2016, agiu “dando o melhor”, apesar dos constantes ataques de que foi alvo “por parte da maioria legislativa”, que é controlada pelo partido fujimorista Força Popular.

Kuczynski assegurou que nos dois pedidos de destituição apresentados contra ele no Congresso se usou o “pretexto de que havia supostamente mentido” sobre sua vida profissional. “Inclusive, uma vez superado este transe, se tem voltado à carga com uma nova moção que tem os mesmos argumentos e contém os mesmos fatos que se rejeitaram na primeira há apenas três meses”, acrescentou.


Compra de votos

O governo de Kuczynski mergulhou na terça-feira numa crise profunda depois que a oposição fujimorista publicou vídeos e áudios, que também aprofundaram a guerra política entre os irmãos Keiko Fujimori, líder do Força Popular, e Kenji Fujimori, dissidente desse grupo e aliado de Kuczynski.

Nas gravações se vê Kenji e outros congressistas próximos oferecendo ao legislador Moisés Mamani, do Força Popular, a realização de obras públicas na sua circunscrição eleitoral em troca de que votasse contra a destituição do presidente.

Também aparecem o advogado de Kuczynski, Alberto Borea, e um funcionário chamado Fredy Aragón, cuja destituição foi confirmada nesta quarta-feira numa resolução oficial, aparentemente falando em nome ou sob pedido do governante e inclusive dando a entender que o legislador poderia beneficiar-se economicamente.

Kuczynski deveria comparecer nesta quinta-feira perante o Congresso, em pessoa ou através do seu advogado, e posteriormente seria aberto um processo de debate e votação sobre a moção de destituição por “incapacidade moral permanente”.

Escândalo da Odebrecht

O pedido de moção contra Kuczynski foi apresentado em 8 de março pela oposição. Trata-se da segunda moção de destituição contra o presidente aprovada para debate no Congresso em apenas três meses. Em dezembro, os parlamentares peruanos discutiram um primeiro pedido, do qual Kuczynski se salvou graças à abstenção de dez legisladores do fujimorismo.

Três dias depois, Kuczynski concedeu um indulto humanitário ao ex-presidente Alberto Fujimori, condenado a 25 anos de prisão por crimes contra a humanidade. A medida levantou a suspeita de que o presidente teria feito um pacto com o parlamentar Kenji Fujimori, filho do ex-presidente, para permanecer no cargo.

Kuczynski é acusado de ter recebido repasses no valor de 782 mil dólares da Odebrecht, no período em que ele ocupou os cargos de ministro da Economia e, posteriormente, de primeiro-ministro do país.

Ele insiste que o dinheiro se trata de pagamentos legítimos por serviços de consultoria e nega ter recebido propina ou cometido qualquer ato ilícito. A Odebrecht, por outro lado, admitiu ter desembolsado, desde 2001, subornos de mais de 785 milhões de dólares em 12 países – dez deles latino-americanos – para assegurar contratos de obras públicas.

Só no Peru, a construtora, que é a maior da América Latina, pagou propinas no valor de 29 milhões de dólares a funcionários do governo entre os anos de 2005 e 2014. (Com agências internacionais)

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