Embalado pelo revanchismo ideológico, Jair Bolsonaro estreia na ONU com discurso vergonhoso

Em discurso vergonhoso e revanchista, contrariando o que havia antecipado em termos de conteúdo sem beligerância, o presidente Jair Bolsonaro proporcionou ao País mais um momento de vexame internacional ao estrear na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

Ao participar da 74ª edição da Assembleia, nesta terça-feira (24), Bolsonaro afirmou que é uma “falácia dizer que a Amazônia é um patrimônio da humanidade”, ressaltando que seu governo tem “compromisso solene com a preservação do meio ambiente”.

O presidente brasileiro tem garantido o direito à livre manifestação do pensamento, mas não pode querer transformar uma mentira conhecida em verdade solene. Se há algo falacioso no escopo da crise ambiental, surgida a partir das queimadas na Amazônia, por certo é o compromisso do atual governo com os ruralistas, que por terem despejado muito mais do que apoio na candidatura de Bolsonaro agora cobram a devida contrapartida.

Recorrendo várias vezes ao revanchismo ideológico, Bolsonaro emoldurou seu discurso com o tom do enfrentamento, algo que vem ocorrendo desde a corrida presidencial e permanece no cerne do governo, como se o período eleitoral não tivesse data para terminar.

Falando apenas e tão somente a seus apoiadores, como se prestasse contas de um governo que ainda não mostrou a que veio, o presidente brasileiro centrou a primeira parte do discurso em suposta ameaça do que chamou de “globalismo socialista” contra a soberania brasileira, o que não é verdade. Além disso, Bolsonaro aproveitou a ocasião para criticar a imprensa internacional, a exemplo do que fez de forma recorrente no Brasil.

Após afirmar, dias antes da abertura da Assembleia-Geral da ONU, que faria discurso para apresentar o Brasil ao mundo como oportunidade de negócios, Bolsonaro repetiu sete vezes a palavra “ideologia”, sempre com entonação de denúncia, afirmando que “a ideologia invadiu a própria alma humana para dela expulsar Deus e a dignidade com que Ele nos revestiu”.

Essa oratória, que lambe a doutrina do “Destino Manifesto”, é um desrespeito a todos aqueles que divergem de Jair Bolsonaro no campo da fé. Se no Brasil, segundo a Constituição Federal, o Estado é laico, no âmbito global essa laicidade deve ser respeitada. Sendo assim, o mandatário brasileiro não poderia falar sobre liberdade religiosa, como fez em seu discurso, pois não é isso que ele e muitos dos seus assessores fazem.

O vexaminoso discurso foi elaborado com a participação do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e do assessor internacional do Palácio do Planalto, Filipe Martins, dois seguidores do ideólogo ultraconservador Olavo de Carvalho, que serve de norte ideológico para a família Bolsonaro.

Sem se preocupar com o fato de revanchismo ideológico leva a nada, o presidente ressaltou que foi à ONU para apresentar um “novo país”, que, de acordo com suas afirmações, esteve “à beira do socialismo”. Bolsonaro não perdeu a oportunidade de atacar os governos de Cuba e da Venezuela, países que chamou de “ditaduras” e lar de “regimes nefastos”.

Ao criticar a imprensa, prática rotineira, Bolsonaro citou “falácias” difundidas pela mídia e por líderes de outros países, que teriam tratado o assunto referente à Amazônia de “forma desrespeitosa”. O chefe do Executivo federal insistiu que a Amazônia “permanece praticamente intocada”, prova, segundo ele, de que o Brasil “é um dos países que mais protegem o meio ambiente”.

“Questionaram aquilo que nos é mais sagrado, a nossa soberania”, afirmou o presidente, após dizer ser um equívoco afirmar que a Amazônia é o pulmão do mundo e patrimônio da humanidade. “Valendo-se dessas falácias, um ou outro país, em vez de ajudar, embarcou nas mentiras da mídia e se portou de forma desrespeitosa e com espírito colonialista”.


A declaração tinha como alvo o presidente da França, Emmanuel Macron, com quem Bolsonaro se envolveu em acirrada troca de farpas, em meio à crise ambiental provocada pelo avanço do desmatamento e pelas queimadas na Amazônia. Durante o discurso do brasileiro, Macron não estava presente no plenário da ONU.

Para rebater as denúncias feitas pelo cacique Raoni, no âmbito internacional, sobre as desastradas políticas ambientais e indigenistas do atual governo, Bolsonaro disparou contra o líder indígena, a quem classificou como “peça de manobra”.

“A visão de um líder indígena não representa a de todos os índios brasileiros. Muitas vezes alguns desses líderes, como o Cacique Raoni, são usados como peça de manobra por governos estrangeiros”, disse o colérico presidente.

Provando ao mundo que é um néscio em termos de geografia, Bolsonaro atacou a França e a Alemanha ao afirmar que ambos os países usam 50% de seus respectivos territórios para a atividade agrícola, agricultura, enquanto o Brasil usa somente 8%.

Como sempre afirma o UCHO.INFO, Jair Bolsonaro é um incompetente confesso que não tem estofo para cargo de tamanha importância e relevância. O que explica seus embates com lideranças internacionais, já que o governo brasileiro adotou o enfrentamento como bandeira diplomática, quando, na verdade, o consenso e o diálogo produziriam melhores resultados ao País, principalmente no campo comercial.

Dando vazão a seu pensamento obtuso e retrógrado, que por certo está sendo utilizado por governantes mal-intencionados, Bolsonaro disse que 14% do território brasileiro está demarcado como terra indígena e condenou o que chamou de “ambientalismo radical e indigenismo ultrapassado, que representa o atraso, a marginalização e a total falta de cidadania”.

“Nossos nativos são seres humanos, como qualquer um de nós”, argumentou, garantindo que não vai “aumentar para 20% sua área já demarcada para terras indígenas, como alguns chefes de Estado gostariam que acontecesse”.

Segundo o presidente, “os que nos atacam não estão preocupados com o ser humano índio, mas sim com as riquezas minerais e a biodiversidade existentes nessas áreas”. “A ONU teve papel fundamental na superação do colonialismo e não pode aceitar que essa mentalidade regresse a estas salas e corredores, sob qualquer pretexto”, acrescentou Bolsonaro.

Como mencionado acima, Bolsonaro usou as redes sociais para divulgar, antes de sua estreia na ONU, que seu discurso seria “a oportunidade de apresentar ao mundo o Brasil que estamos construindo”. O presidente pode dizer aquilo que desejar, mas não pode distorcer a realidade apenas para vender ao planeta uma ideia que está longe do que acontece no País.

Por um lado, o equilíbrio fiscal e a recuperação econômica ainda não deram o ar da graça, apesar do palavrório messiânico do ministro Paulo Guedes (Economia), que vem sendo desmentido pelo cotidiano, por outro a instabilidade política e a insegurança jurídica completam um cenário que deixa o investidor cada vez mais desconfiado.

Se a ideia era, no plenário da ONU, vender ao mundo a ideia de um país de oportunidades, Bolsonaro perdeu a viagem, pois centrou seu palavrório no revanchismo ideológico e em ataques àqueles que divergem de suas opiniões. Mesmo assim, Bolsonaro ousou falar em preservação das liberdades. Enfim, como disse certa feita o escritor e filósofo francês Joseph-Marie de Maistre, “toda nação tem o governo que merece”.