(*) Gisele leite
O impasse de proteger a saúde ou a economia. A estagnação diante da crise sanitária e da calamidade pública trazendo cerca de duzentos e cinquenta mil mortos em todo país. A saúde pública e privada colapsada em muitas partes do país. Não podemos ceder ao impulso egoísta de apenas preservar as liberdades individuais.
O lockdown e tantas outras medidas impopulares sob a coação de não receber as verbas da União, por estar governada por um negacionista xiita. Essa mesma discussão já fora travada há mais de cento e vinte anos atrás, diante da gripe espanhola, ou a gripe pandêmica de 1918.
Afinal, quem não aprende com a História resta fadado a repeti-la, tanto que assistimos atualmente o mesmo nefando cenário. No passado, a doença aportou no Brasil em setembro de 1918, em um navio inglês, chamado de S.S. Demerara, vindo de Lisboa, via Senegal, tanto que o primeiro nome, foi a “gripe do Senegal” e, ainda fez escalas em Recife e Salvador antes de finalmente aportar no Rio de Janeiro. Foi, na verdade, a segunda e mais mortífera onda de doença, desta vez se espalhando para além do continente europeu.
Na época, a imprensa tratava com desdém a doença, devido a desinformação. Afirmou-se até que a dita grupe espanhola havia sido criada pelos alemães, como arma de guerra, da mesma forma que há quem afirme que a Sars-CoV-2 foi criado pelos chineses, apesar de tantos estudos em contrário.
Não se trata de tirania científica contra as liberdades civis. Ainda há registros das duras e firmes medidas adotadas por Oswaldo Cruz, no primeiro governo de Rodrigues Alves, para livrar a capital do país da varíola e da febre amarela, o que culminou na Revolta da Vacina.
Ainda em outubro de 1918 não bastasse o caótico cenário, uma notícia sacudira ainda mais a pobre República brasileira. O presidente eleito, o mesmo que patrocinara a revolução sanitária de Oswaldo Cruz contraíra a gripe espanhola, não tomaria posse em novembro. Morreu devido as complicações derivadas da doença em janeiro de 1919.
Nessa ocasião, entrou em cena Carlos Chagas, igualmente respeitado tanto no país como no exterior, entre outras qualidades, por ter desvendado a origem da doença, que atualmente leva seu nome (homenagem um tanto bizarra). E, com o apoio da imprensa, foi reconhecido como o herdeiro de Oswaldo Cruz e reverenciado como herói nacional desde de sua morte em 1917.
Na época não existiam vacinas, nem remédios adequados para debelar a patologia. E Chagas instalou em cinco hospitais de emergência, além de vinte e sete postos de atendimento na capital. A quarentena e o isolamento foram reforçados, mas curiosamente as máscaras não eram de uso comum, nem entre os profissionais de saúde. A ação de Carlos Chagas fora replicada em São Paulo, onde a doença foi particularmente devastadora e, também, em outros Estados. Ao fim de 1918, a imunidade desenvolvida pela população fez com que a segunda onda arrefecesse, deixando cerca de quinze mil mortos no Rio de Janeiro e doze mil em São Paulo. De fato, o número elevado de óbitos jamais fora devidamente apurado, variando entre trinta e cinco mil a trezentos mil, incluindo todas as ondas da mesma doença.
No início da pandemia de Covid-19, tal imunidade de rebanho também representava a maior esperança, porém, atualmente a OMS – Organização Mundial da Saúde não enxerga tal possibilidade, em curto prazo, mesmo com a vacinação.
Atualmente, com pouco mais de três por cento de toda população brasileira, faltando vacinas e, eficiente Plano de Vacinação, estamos em apuros, pois nova cepa do vírus se apresenta ainda mais letal e mortífera. A nova cepa virótica parece, ao menos, ser mais democrática, pois atinge indiferentemente os mais jovens e, não distingue entre pobres e ricos.
Só nos resta a sobriedade de manter o isolamento social e o distanciamento, além de continuar o uso de máscaras e, higienização adequada com álcool gel.
(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.
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