Em discurso covarde, nos EUA, Fábio Faria ignorou a “farra das passagens” e escândalos envolvendo a família

 
Após três anos como presidente da República, período em que levou o Brasil ao retrocesso e ao obscurantismo, Jair Bolsonaro modula cada vez mais o discurso para atacar adversários políticos e os concorrentes na disputa pelo Palácio do Planalto. Ignaro confesso e órfão de predicados necessários para o cargo, Bolsonaro impõem aos assessores a repetição de uma narrativa covarde e criminosa, que serve apenas para ludibriar ainda mais os incautos.

No final de semana, o ministro Fábio Faria, das Comunicações, mostrou ao País que em seus domínios a sabujice não tem limites. Faria participou em Orlando, no estado americano da Flórida, de evento organizado por pastores evangélicos e teve como companheiro de oratória o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, considerado foragido da Justiça brasileira.

“O conceito de direita e de esquerda só surgiu quando veio um político conservador e agora temos um presidente conservador”, disse Faria. “Ninguém sabia o que era direita e esquerda. E vocês sabiam? Eu não sabia.” Ou seja, o ministro é a pessoa certa para integrar um governo liderado por alguém que representa uma ode à ignorância.

Em nota, Fábio Faria afirmou que foi convidado para discursar em evento de um pastor de igreja que ele e a família frequentam em Orlando. “Se eu soubesse que ele (Allan dos Santos) iria, eu não teria comparecido”, informou o ministro, que deveria ter deixado o local ao perceber a presença do blogueiro fugitivo.

Porém, o desvario verborrágico de Faria foi além. O ministro, em clara sintonia com Bolsonaro, atacou o PT e fez ilações sobre uma eventual volta de Lula ao Palácio do Planalto. Em seu discurso, o ministro citou pessoas morrendo de fome “se o comunismo voltar”, usando como exemplo a Venezuela, e a liberação do aborto na Argentina.

“O Lula vem com o Zé Dirceu, com a Natália Bonavides [deputada federal do PT-RN], Fátima Bezerra [governadora Rio Grande do Norte], com Gleisi [Hoffmann, presidente PT]. Vem com um grupo que nunca mais vai querer sair do poder. Vão vir vingativos, com raiva e não vão nem pensar no Brasil”, disse Fábio Faria, pré-candidato ao Senado pelo Rio Grande do Norte.

Falso bom-mocismo

Faria, que é casado com uma das filhas do apresentador e empresário Silvio Santos, deveria se envergonhar de sugerir que representantes da esquerda, se eleitos, não pensarão no Brasil e nos brasileiros.

O ministro, bajulador de primeira hora do presidente da República, parece não se recordar de alguns escândalos que atingiram a família Faria em seu âmago. O pai do titular das Comunicações, Robinson Faria, foi alvo da “Operação Dama de Espadas”, que investigou esquema de funcionários fantasmas, comandado pela ex-procuradora Rita das Mercês. Robinson, que à época do ilícito era governador, foi acusado de receber mais de R$ 5 milhões do esquema criminoso, em 2014.

Robinson Faria entrou na ementa de inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo suposto recebimento de R$ 350 mil da construtora Odebrecht, uma das molas propulsoras do esquema de corrupção conhecido como Petrolão.

 
No âmbito da Lava-Jato, operação que ultrapassou as fronteiras da Petrobras, depoimentos de delação premiada de dirigentes da JBS atestam que Robinson e o filho foram beneficiados com pagamento de propina em troca da venda da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (CAERN).

Investigações sobre a atuação da holding J&F, controladora da JBS, apontam que pai e filho receberam R$ 10 milhões em troca da CAERN. Os valores teriam sido pagos, em parte, através de escritórios de advocacia.

O caso chegou a ser arquivado por falta de prova, mas, em junho de 2019, a Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou a reabertura de nova investigação contra o Fábio Faria com base na delação premiada de Ricardo Saud, ex-executivo do grupo J&F. O pedido teve com base provas obtidas com a quebra de sigilo telemático de um dos advogados envolvidos no caso, denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção e lavagem dinheiro em esquema de compra de sentenças na Justiça Eleitoral.

Fábio Faria acabou enredando a própria Patrícia Abravanel, com quem é casado, no lamaçal descoberto pela Lava-Jato. A filha do dono do SBT foi citada na delação premiada de Ricardo Saud, da J&F. “Foi um jantar muito elegante até. Foi o Fábio Faria com a noiva dele, a Patrícia Abravanel, filha do Silvio Santos. Foi o Robinson Faria com a esposa dele, nós todos com as esposas, tal, para tratar de propina. Até bacana, né? Todo mundo com as esposas para tratar de propina”, disse o ex-executivo aos investigadores.

Farra das passagens

Em 2009, Fábio Faria ganhou o noticiário na esteira do escândalo das passagens aéreas pagas com recursos da cota parlamentar. O agora ministro foi obrigado a devolver R$ 21,3 mil (em valores da época) gastos com passagens aéreas para que famosos desfrutassem das folias carnavalescas em Natal. Entre os agraciados estavam Adriane Galisteu, ex-namorada do político, a mãe da apresentadora, Emma Galisteu, e os atores Kayky Brito, Sthefany Brito e Samara Felippo. Na ocasião, por meio de sua assessoria, Faria afirmou: “O meu mandato é muito maior do que qualquer ex-namorada”.

Na nota, Fábio Faria deu mostras de sua desfaçatez e pouca coragem: “Desde que assumi meu mandato como Deputado Federal, defini como uma das minhas prioridades atuar com transparência e com probidade nos meus atos parlamentares. A questão relativa à emissão de passagens aéreas é uma atribuição administrativa com a qual nunca lidei pessoalmente, deixando os detalhes dessa tarefa burocrática a cargo do corpo técnico de meu gabinete.”

Traduzindo para o bom vernáculo, o ministro Fábio Faria não é a pessoa mais indicada para acusar adversários políticos e ideológicos de não pensarem no Brasil. Ademais, em relação à Venezuela, Faria deve desconhecer que o chefe, Jair Bolsonaro, já rasgou elogios ao finado tiranete bolivariano Hugo Chávez, responsável pela tragédia que assola o país vizinho.

“Chávez é uma esperança para a América Latina e gostaria muito que essa filosofia chegasse ao Brasil”, disse o então deputado Jair Bolsonaro em entrevista à revista Veja, em 1999. “Acho ele ímpar. Pretendo ir a Venezuela e tentar conhecê-lo”, completou.

Ouvidos pela BBC News Brasil em agosto de 2021, especialistas em política latino-americana afirmaram que Bolsonaro é o líder mais próximo ao estilo de Hugo Chávez que o Brasil já teve no período democrático recente. “Bolsonaro se cercou de militares, cria embate com outros poderes, desacredita o processo eleitoral e tenta calar a imprensa. Todas medidas tiradas do manual chavista”, afirmou Jorge Castañeda, ex-ministro de Relações Exteriores do México e professor da New York University.


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