Sufoco. E como será o amanhã?

(*) Marli Gonçalves

Sufoco. O papo é sério, muito sério. Tudo sufocante, nublado e nebuloso. Árido. Sem ar. Muito fogo e calor. Águas se esvaindo. Difícil respirar, pensar, se proteger, enquanto vemos os que poderiam tomar alguma providência – enquanto ainda há tempo – batendo a cabeça por aí. Viram as ideias e conselhos “geniais” que apareceram essa semana?

A que mais me chamou a atenção foi o pedido para que deixássemos as janelas fechadas para que não entrasse a fuligem das queimadas que estão tornando ainda mais insuportáveis os dias em grande parte do país. São Paulo, especialmente, está batendo recordes de presença como a primeira colocada na lista das cidades mais poluídas do mundo. E eles mandam fechar as janelas. Adorável, não? Gênios. Como se todos tivessem em suas ricas casas aparelhos de ar condicionado espalhados por todos os ambientes, ventiladores, umidificadores. No máximo, talvez, leques.

Ah, e aliás, que também não precisássemos pegar o transporte coletivo, ir trabalhar, estudar, fazer qualquer coisa da rotina. Tipo, sei lá, existir?

Ainda não entenderam que dependemos de ações bem mais eficazes, muito mais, e que sejam decretadas pelas gentes do poder, e de todas as esferas. Suspensão de aulas, ampliação de rodízios, mudança de horários de trabalho ou incentivo ao home office (com janelas abertas pra ver se entra um ventinho), prevenção de queimadas, aumento das guardas florestais, controle e fiscalização do uso da água que continua sendo desperdiçada por canos furados e lavagem de calçadas como se ela fosse vassoura. Real atenção à saúde pública por conta da exposição prolongada a essa situação. Fim dessa loucura de aumentar a frota particular de veículos, e lembrando que os elétricos são completamente fora do orçamento de mortais. Que parem de prometer o que não conseguirão cumprir nem por milagre.

A experiência de outros países que já passaram por momentos de crise como o que estamos vivendo poderia ao menos inspirar, fazer com que compreendam que não é mais conversa, previsão de futuro, mas emergência real bem diante de nosso nariz seco. São necessárias medidas duras em momentos específicos, mesmo que eles sejam momentos eleitorais. A estiagem já nos dá alô. Têm ocorrido apagões significativos de energia elétrica e em locais populosos – o centro de São Paulo vem sofrendo com isso.

Mas continuam só se reunindo, se reunindo, criando grupos de crise e até comitês, mais gastos. Estamos perdendo a Amazônia, o Pantanal, o Cerrado. Flora e fauna castigadas, o que sentimos não só na pele, mas na tristeza de quase ver e ouvir o desespero da fuga. O fogo se aproxima das áreas urbanas periféricas que nem preciso descrever para vocês a densidade populacional. Reservas indígenas escalpeladas. Marina Silva, você está bem? Onde anda você? Quais soluções já trabalhava nesse mais de um ano e meio de poder?

Escrevo esse protesto porque você aí também deve estar bem preocupado, não só com hoje, amanhã, mas com o futuro que já não parece mais tão distante. Não tenho filhos, se os tivesse estaria triste por ver o mundo que habitariam porque as discussões sérias foram (e continuam de alguma forma) sendo empurradas mais para a frente infinita e continuamente.

Enquanto isso, assistimos às campanhas eleitorais municipais desfilando boçalidades, locuções com vozinhas tatibitates de gente boa e tranquila pensando que estão se dirigindo a crianças. Todos “nasceram” na periferia, frisam diariamente, embora há muito não estejam mais por lá. Todos têm “grandes” corações, baita corações, enormes, pelo que propagam nas tevês enquanto piscam com olhar e ar doce.

Estamos em pânico. O que será do amanhã?

Cof, Cof, Cof!

(*) Marli Gonçalves – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Site Chumbo Gordo, autora de “Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também”, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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