Para Mendonça, desconfiar da Justiça Eleitoral é direito. O que dizer de indicado “terrivelmente evangélico”?

Dono de humor ácido e refinado, o jornalista José Simão (Folha, UOL e BandNews) é autor da frase que traduz com precisão a realidade verde-amarela: “O Brasil é o país da piada pronta”. A cada novo dia que surge na versão moderna e bagunçada da longínqua Pindorama, o escárnio ganha novas proporções.

Nesta quarta-feira (4), durante julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos ilegais postados por usuários, o ministro André Mendonca, durante a leitura de longo e enfadonho voto, disse que desconfiar da Justiça Eleitoral é um direito.

“A Justiça Eleitoral brasileira é confiável e digna de orgulho. Se, apesar disso, um cidadão vier a desconfiar dela, este é um direito. No Brasil, é lícito duvidar da existência de Deus, que o homem foi à Lua e das instituições”, disse.

Por tradição, sabem os que acompanham o nosso jornalismo, o UCHO.INFO não se cala diante de absurdos vociferados por autoridades, estejam trajando toga ou não. Ultrapassa as raias da insensatez fazer tal afirmação apenas para defender os interesses golpistas de Jair Bolsonaro, réu em ação penal por fracassada tentativa de golpe de Estado.

Na verdade, o ministro André Mendonça, com tão delirante declaração, busca abrir caminho para os advogados do líder golpista tentarem a anulação da inelegibilidade decidida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com base evento no evento com representantes diplomáticos de vários países, realizado no Palácio da Alvorada em 18 de junho de 2022, quando Bolsonaro tentou convencer os convidados sobre a insegurança do sistema eleitoral brasileiro.

Missa encomendada?

Como no universo político nada acontece por acaso, a explicação para a fala de Mendonça é cristalina. Em junho de 2023, por 5 votos a 2, o TSE declarou a inelegibilidade de Jair Bolsonaro por oito anos, contados a partir da eleição presidencial de 2022.

André Mendonça é integrante efetivo do TSE, que nas eleições de 2026 terá o ministro Kassio Nunes Marques como presidente. Ambos foram indicados ao STF por Jair Bolsonaro. No julgamento de junho de 2023 no TSE, Nunes Marques acompanhou a divergência aberta pelo ministro Raul Araújo, ao votar pela improcedência da ação que culminou com a inelegibilidade de Bolsonaro.

Pois bem, se o ministro André Mendonça defende a tese de que desconfiar da Justiça Eleitoral é um direito, cabe-nos afirmar que desconfiamos de um magistrado que foi indicado à mais alta instância do Judiciário nacional apenas e tão somente por ser “terrivelmente evangélico”. Notório saber jurídico, às favas!

Causa espécie o fato de um ministro e dublê de pastor presbiteriano que, debaixo da sisudez da própria toga, age para defender o responsável por um demoníaco plano de golpe de Estado, fracassado porque Bolsonaro é um covarde conhecido e a Justiça foi firme e célere em suas decisões.

Data venia, ministro André Mendonça, sua declaração foi emoldurada por infelicidade atroz. Discordar do nosso jornalismo também é direito incontestável, mas se há no nosso almoxarifado uma mercadoria em abundância, esta certamente é a coerência. Sinta-se à vontade, ministro, para discordar do nosso jornalismo, pois será prova de que estamos no caminho certo.

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