(*) Ucho Haddad –
Há no futebol brasileiro uma antítese que se agiganta a cada dia. Conceitualmente, o esporte bretão consiste em apresentar ao adversário um engodo protagonizado com os pés, ação que alguém, um dia, batizou de jogada. E jogadas têm surgido no mundo do futebol com impressionante velocidade, dentro e fora do campo.
Diante do malabarismo negocial que tem marcado o futebol nos últimos tempos chega a ser inacreditável que na seara do mais popular esporte do planeta ainda existam inocentes. Quando Vanderlei Luxemburgo recebeu cartão vermelho da cartolagem alviverde, o presidente do Palmeiras, Luiz Gonzaga Belluzzo, não demorou a anunciar que o novo técnico do clube seria Muricy Ramalho, demitido do SPFC.
Enrolados em números milionários, Palmeiras e Muricy não chegaram a um acordo. E o resultado soou como uma atitude precipitada e inocente de Belluzzo, uma pessoa correta e bem intencionada que aterrissou em um ninho de cobras peçonhentas. O futebol. Descartado o negócio, o próprio Muricy Ramalho ressurgiu na cena para dizer, por vias transversas, que um desfecho positivo ainda poderia acontecer. Mas o Palmeiras definitivamente descartou a possibilidade de retomada do assunto.
Nesse imbróglio palmeirense alguns detalhes devem ser considerados, antes que o assunto caia no esquecimento. Vanderlei Luxemburgo pode ter um temperamento difícil de ser enfrentado, mas não reconhecer sua competência profissional como treinador é uma enorme besteira. Até porque, Luxemburgo não chegou ao Real Madrid por ser incompetente. Sendo assim, é preciso saber as razões que levaram o técnico a deixar o Palestra Itália. Beira o inaceitável a desculpa de que a demissão de Luxemburgo teve o atacante Keirrison como motivo principal. É verdade que jogador derruba técnico, mas aceitar essa hipótese é reduzir a pó a competência do bom e velho Luxa.
Sem comandante, a saída encontrada pelo Palmeiras foi guindar Jorge Silva, o Jorginho, à interinidade do cargo. E Jorginho está quase se transformando no interino permanente. Entre os que apoiam a efetivação de Jorge Silva está todo o elenco alviverde. E é exatamente nesse escaninho que mora o maior de todos os perigos. Por enquanto, o interino tem sido solicito com os jogadores, pois a diretoria do clube pouco pode lhe cobrar. Se efetivado no cargo, Jorge Silva sofrerá cobranças constantes, não apenas da diretoria, mas principalmente da torcida. E diante de um beco sem saída, o treinador terá de cobrar os jogadores, que, se pressioandos, podem se voltar contra o treinador.
O futebol tem dessas arbitrariedades. Situação idêntica enfrentou O SPFC, que preferiu demitir o técnico Muricy Ramalho a dispensar alguns jogadores arredios. Com Muricy fora do Morumbi, a diretoria tricolor entendeu que Ricardo Gomes poderia virar o jogo. Sem dúvida alguma o ex-treinador do Monaco ainda precisa de um pouco mais de tempo para se acertar, mas por tudo que temos visto é possível imaginar o que vem pela frente. Acostumado a grandes conquistas, o SPFC e sua torcida sem dúvida transferirão a Ricardo Gomes a culpa pelo problema que está no elenco, e não na comissão técnica.
Situação semelhante vem marcando o cotidiano do Fluminense. Não faz muito tempo, a diretoria do tricolor carioca resolveu contratar Carlos Alberto Parreira, técnico competente e com diversas conquistas importantes no currículo. Mas Parreira durou muito pouco tempo nas Laranjeiras. Acéfalo em termos de treinador, o Fluminense colocou na alça de mira ninguém menos que Muricy Ramalho. Diferentemente do que lhe foi oferecido pelo Palmeiras, Muricy receberá do Fluminense a incumbência de apagar o fogo que debela o departamento de futebol do clube. Sem dúvida alguma que o técnico será remunerado à altura da responsabilidade do cargo, mas é preciso lembrar que Muricy não é melhor que Parreira, e nem mesmo tem a fórmula mágica para solucionar o que não é solucionável.
Quadros idênticos se repetem em muitos clubes brasileiros, como é o caso do Santos, que acaba de contratar Vanderlei Luxemburgo. O alvinegro praiano tem um sem fim de protegidos, mas mesmo assim contrataram um treinador que é conhecido por insistir em trabalhar com seus apaniguados. Será mais uma queda de braços a chacoalhar a Vila Belmiro. E os torcedores do Cruzeiro que se preparem, pois após perder de maneira inexplicável a Copa Libertadores da América, o técnico do anil belo-horizontino será cobrado com a devida veemência.
Há quem diga que o futebol brasileiro é o melhor do mundo, mas há excesso de malandragem nesse mar de inocência que querem nos vender.