A dita dura – A semana termina com um assunto que passou despercebido do grande público, mas representa uma ameaça ao Estado Democrático de Direito. Após reunião com a corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon (STJ), o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Ivan Sartori, disse que a imprensa patrocina uma campanha para “enxovalhar” o Judiciário.
A declaração de Sartori foi acompanhada de uma explicação no mínimo evasiva. De que juízes que receberam pagamentos vultosos não são alvo de investigação. “Investigação é um termo parcial, um termo pejorativo e um termo perverso para enxovalhar a magistratura e isso é uma campanha que vem sendo feita por dois jornais do Estado de São Paulo, que são a ‘Folha de S. Paulo’ e ‘O Estado de S. Paulo’. Embora às vezes a reportagem saia no contexto, a manchete sempre é depreciativa, sempre enxovalha a magistratura. E isso nós não podemos admitir. Eu não vou admitir e vou defender até a morte”, afirmou o presidente do TJ paulista.
Ao criticar o trabalho dos profissionais da mídia, o desembargador Ivan Sartori sugeriu que, a exemplo do CNJ, seja criado um conselho para controlar os jornalistas. “Eu vou falar. Temos o CNJ e vocês não querem o Conselho Nacional de Jornalismo. Ia ter mais responsabilidade”, disse o magistrado.
Péssimos profissionais existem em qualquer segmento laboral, inclusive no jornalismo. Acontece que o papel da imprensa é, pelo menos para os que não aderiram à chapa-branca, monitorar o Estado e todos os seus Poderes, pois só assim a sociedade estará minimamente protegida do absurdo que é a relação entre os cidadão e os governantes. Se alguns integrantes do Judiciário se valem das quase incompreensíveis filigranas da lei para engordar o patrimônio, cabe à imprensa revelar tais fatos, pois do contrário a democracia continuará sendo corroída.
A exemplo da expressão “bandidos de toga”, usada pela ministra Eliana Calmon para se referir a magistrados transgressores, no universo do jornalismo há também os que empunham penas putrefatas, que colocam uma suposta credibilidade a serviço da inverdade, como se alguns imundos tostões justificassem as nódoas de uma consciência pesada.
Ao defender a criação de um órgão para patrulhar a imprensa, o desembargador Ivan Sartori, que deste noticioso merece o devido respeito, mostra que no momento de tal declaração seu conhecimento jurídico sofreu um repentino apagão, pois garante a nossa Carta Magna que “é livre a manifestação do pensamento, desde que vedado o anonimato”. Se alguém, integrante do Judiciário ou não, se sentir ultrajado em sua dignidade por uma notícia supostamente inverídica, que recorra ao fórum mais próximo.
Quando a ministra Eliana Calmon dispara acusações na direção da magistratura, não o faz com o objetivo de pasteurizar as críticas, mas de apontar o dedo àqueles que transformam a folclórica cegueira da Justiça em olhar fixo no universo das ilicitudes. Pior fica a situação do Judiciário quando um processo contra um órgão do Estado demora quarenta anos para alcançar a instância superior. Isso sim é banditismo escancarado.