Pesquisa alerta o consumidor sobre propagandas enganosas de financiamentos de veículos que prometem taxa zero de juros
(*) Ana Carolina Castro
Em tempos de crise, as concessionárias iniciam uma busca desesperada por compradores. As ofertas, muitas vezes enganosas, devem ser avaliadas com cuidado pelo consumidor para evitar sustos no momento do pagamento. A Pro Teste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor – investigou os sites de algumas montadoras para confirmar se as propagandas de parcelamento de carros sem juros realmente eram verdade. A pesquisa demonstrou que, ao contrário do que a propaganda dizia, comprar um veículo a prazo é de fato bem mais caro que pagá-lo a vista.
O Custo Efetivo Total (CET), que representa o custo total de uma operação de empréstimo ou financiamento, deve sempre ser anunciado. Porém, nem sempre isso ocorre, pois a omissão leva o consumidor a acreditar que o financiamento não tem custo. Segundo o site do Banco Central do Brasil o CET, o valor deve ser informado pelas instituições financeiras e pelas sociedades de arrendamento mercantil antes da contratação de operações de crédito. O CET também deve ser citado nos informes publicitários, e as informações passadas ao consumidor devem ser claras e precisas.
Foram pesquisadas nove montadoras: Volkswagen, Honda, Citröen, Fiat, Toyota, Chevrolet, Peugeot, Ford e Renault. Durante a pesquisa foram encontrados quatro modelos de carros com a promessa do financiamento sem juros: três da Citröen (C4 Pallas Flex, Grand C4 Picasso, Xsara Picasso) e um da Peugeot (Peugeot 207).
A propaganda da Citröen não citava a TAC ( taxa de abertura de crédito), que também não constava no valor divulgado. Além disso, o valor divulgado do CET não inclui no cálculo todos os custos e está escondido em uma nota de rodapé de tão reduzida que torna a leitura quase impossível. Quem consegue ver, percebe que a oferta é restrita aos financiamentos via leasing. A nota do rodapé diz também que o único modelo com a opção de financiamento sem juros via Crédito Direto ao Consumidor (CDC) é para o C4 Pallas. Nesse caso, o CET do financiamento sairia por 9,3% ao ano para o financiamento de 50% de um carro com valor de R$62.370, em 12 vezes. No entanto, a simulação de compra de um C4 Pallas Flex constatou que o CET correto para os dados no rodapé seria de 15,49% ao ano. A cobrança da TAC ainda acrescentaria ao custo um valor de R$888,00.
O consumidor deve também tomar cuidado para não ser pego em outra prática ilegal: a venda casada. A associação afirma que o vendedor da Citröen infligiu o Código de Defesa do Consumidor ao tentar convencer o comprador a emplacar o veículo na própria loja por R$690,00. Essa era a condição que garantia a taxa zero de juros. No entanto, o emplacamento pode ser feito pelo próprio consumidor no Detran pela metade do preço cobrado pela empresa.
A Peugeot não caiu no mesmo erro, mas fez pior. Não informou o CET nem a cobrança da TAC. O site da montadora também não esclarece sobre quais são as condições para financiar o veículo com zero de juros. Essa propaganda, no entanto, é desmantelada quando simula-se a compra de um Peugeot 207: o CET é de 15,55% ao ano, pois a TAC sai por R$630,00.
Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Pro Teste, explica que é preciso ficar atento no momento da compra para identificar
possíveis casos de propaganda enganosa: “O consumidor deve guardar uma cópia do anúncio e, se for de algum site, deve imprimir a página”. Constatada a propaganda enganosa, Dolci esclarece que o consumidor deve “primeiramente, tentar negociar com a empresa o cumprimento da oferta. É importante fazer uma notificação por escrito, mas se não obtiver sucesso deve-se formalizar queixa numa entidade de defesa do consumidor ou procurar o Juizado para causas até 40 salários mínimos; causas com valores superiores devem ser encaminhadas à Justiça comum”.
Deputado federal pelo PP de São Paulo e presidente do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (INADEC), Celso Russomanno, também avisa: “Quando for comprar um veículo o consumidor deve exigir uma cópia do contrato do financiamento para não ficar refém da concessionária, e deve também exigir que o contrato seja preenchido na hora. Nada de assinar contrato em branco, você tem que saber tudo sobre a transação.” Segundo Russomanno, o diretor da empresa infratora pode pegar de três meses a um ano de prisão e ser condenado a pagar multa que varia de R$ 200,00 a R$ 3 milhões, conforme a gravidade da infração e o faturamento da empresa. Em alguns casos a empresa é também obrigada a se retratar publicamente.
Além disso, Russomanno alerta para mais uma taxa escondida: a Taxa de Retorno. A prática ilegal é comumente usada e consiste em uma “comissão” que as financeiras repassam às concessionárias que fecham o financiamento. O consumidor não percebe, pois o valor, que pode chegar a R$ 3 mil, é diluído nas parcelas. O Código de Defesa do Consumidor determina que a Taxa de Retorno seja devolvida em dobro ao consumidor, mas a maioria das pessoas sequer sabe de sua existência.
Para evitar transtornos, é imprescindível comparar as informações contidas no material publicitário com o que está sendo cobrado e pedir a um contador que calcule o custo total a prazo para verificar se há disparidade entre o valor à vista. Russomano afirma que a desconfiança por parte do consumidor é fundamental. “Quando a esmola é muita o santo desconfia. Esse é o ditado do consumidor atento”, explica o deputado, que em seguida ressalta: “Instituições como a INADEC estão aí para fazer valer os direitos do consumidor, se há uma irregularidade, deve-se buscar”.
A reportagem entrou em contato com as assessorias da Citroën e da Peugeot, mas, até o fechamento da matéria, não obteve resposta.