Excesso de ousadia – A prisão dos condenados na Ação Penal 470 (Mensalão do PT) tem todos os ingredientes para transformar-se em ópera bufa. De todos os presos, o mais estridente, por enquanto, é o ex-ministro e deputado cassado José Dirceu, que continua insistindo na tese de que a lei está sendo descumprida no caso da sua prisão. “Mesmo diante de uma decisão injusta, eu me submeti ao cumprimento da lei, mas não estão cumprindo a lei pra mim”, disse o ex-comissário palaciano e chefe dos mensaleiros, segundo um dos seus advogados, Rodrigo Dall’Acqua.
Exigir o cumprimento da lei é um dever de todo cidadão, mas tal declaração não cabe a alguém que descumpriu a lei de forma acintosa, apostando na impunidade. Os direitos de José Dirceu, assim como os de todos os condenados, devem ser respeitados e atendidos à risca, mas não se pode querer que as coisas aconteçam com imediatismo, quando esse tipo de situação não ocorre com presos comuns. O primeiro passo da execução de uma pena é inserir o preso no sistema penitenciário, situação sem a qual o juiz da Vara das Execuções Penais não pode cumprir o que específica a sentença condenatória. Isso se dá por meio da chamada carta de guia, que traz dados do processo, pena do réu e regime inicial a ser cumprido.
Tal procedimento demanda tempo e todo preso precisa aguardar o cumprimento do que determina a burocracia para, então, exigir aquilo que lhe cabe com base na sentença condenatória. O que os mensaleiros condenados à prisão querem é ser tratados como celebridades, como se a legislação brasileira dispusesse tratamento diferenciado de acordo com a importância de cada um.
É importante destacar que a legislação penal vigente define como regime semiaberto algo bem distinto do que pleiteia José Dirceu. Regime semiaberto é aquele em que o condenado cumpre sua pena em unidade prisional voltada à reeducação do infrator, como as colônias penais agrícolas, sendo que o sentenciado deve trabalhar no próprio estabelecimento ou em local determinado pelo juízo. No caso de Dirceu, essa tentativa de reeducação não funcionará, haja vista a arrogância que marca o comportamento do agora presidiário.
O que o chefe dos mensaleiros pleiteia, através de seus advogados, é cumprir a pena em regime aberto, que prevê que o condenado saia pela manhã para trabalhar ou estudar, o que precisa ser devidamente comprovado, devendo dormir em uma casa de albergado. Por incompetência e inoperância do Estado, como um todo, não se tem notícia de que no País exista pelo menos uma casa de albergado. Com isso, a Justiça concede ao condenado a possibilidade de cumprir a pena em regime menos gravoso. Em outras palavras, o fiasco da governança verde–loura transformou o regime semiaberto em aberto. De igual modo, é direito de qualquer condenado cumprir a pena em unidade do sistema prisional próxima à família, dependendo do comportamento do mesmo e da disponibilidade de vaga no sistema. Do contrário, a progressão do cumprimento da pena se dá de forma automática, o que é prejudicial à sociedade, que volta a conviver com transgressores não recuperados.
José Dirceu, assim como todos os mensaleiros, tem recursos suficientes para contratar os melhores advogados do País, os quais são instados a ultrapassar os limites no enfrentamento imposto ao Judiciário, pois sabem que no Supremo Tribunal Federal, juízo de origem da Ação Penal 470, há quem interprete a Constituição de acordo com a necessidade do julgado. Isso ficou claro e inequívoco durante o julgamento do processo do Mensalão do PT, principalmente na fase recursal.
Nos limiares do que determina a legislação nacional, tudo deve ser tentado pelo condenado, como forma de minimizar a pena. Não se pode aceitar, porém, é que a condição social ou econômica do réu interfira em qualquer decisão judicial, inclusive as que podem reformar as penas. Quando isso acontece, a democracia é apunhalada de maneira covarde. E é exatamente isso que os mensaleiros intentam, ou seja, romper a isonomia de tratamento que deve ser dispensada aos condenados.