(*) Carlos Brickmann –
Campanha pró-impeachment, baseada num abaixo-assinado com mais de um milhão de adesões? Bobagem: Dilma acaba de ser reeleita, com 54,5 milhões de votos, e não existem condições políticas para afastá-la legalmente. Da mesma forma, os 14 pedidos de impeachment já protocolados na Câmara Federal devem morrer por asfixia: o Governo tem maioria folgada e cuidará de arquivá-los.
Mas haverá terceiro turno. Não agora, mas quando forem divulgadas oficialmente, ou vazarem, as delações premiadas de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef a respeito do Petrolão. Há mais: um diretor de uma das empresas atingidas pela Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, já comunicou ao Ministério Público que está disposto a negociar a delação premiada. Há outros interessados.
Com revelações que podem atingir gente importante do Governo, talvez a opinião pública se mobilize (ou não), forçando parlamentares a rever posições. Pode ser que no fim não aconteça nada (Suas Excelências acabam de ser eleitos, e só terão de enfrentar as urnas daqui a quatro anos, quando tudo que hoje é importante não passar de vaga lembrança), mas a dura batalha para deslegitimar o Governo inevitavelmente deixará vítimas – talvez de escalão mais baixo, mas talvez não.
Nessas épocas de crise ocorrem coisas estranhas (uma bobagem até baratinha, as cascatas artificiais da Casa da Dinda, inflamou a opinião pública. Uma entrevista de Pedro Collor levou à queda de seu irmão, o presidente Collor). Também pode acontecer de Dilma domar a crise.
Como se vingará em seguida?
Profeta do passado
Como ensina a banda Capital Inicial, vivemos olhando o futuro e prevendo o passado. Prever o passado é bem mais fácil; o futuro insiste em desafiar os prognósticos. Mas pode-se prever que, a menos que Dilma mostre qualidades de conciliação e liderança (que até agora ocultou), que seja capaz de negociar em benefício da estabilidade do país, que seja capaz de lidar com a insatisfação pública de boa parte da Polícia Federal, o clima, já ruim, pode degenerar.
É ruim para todos – até para quem vencer e tiver de comandar um país dividido e envenenado.
Flagrante do clima
Como é que gente do comando vitorioso se comporta após a vitória? O ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, abordado por um repórter do programa CQC, deu um soco no microfone e foi embora. A presidente reeleita Dilma Rousseff, na Rede Record, foi grosseira com a jornalista Adriana Araújo, que lhe perguntou se o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, seria o próximo ministro da Fazenda.
Dilma: “Você está lançando um nome, Adriana?” E, voltando-se para quem estava no estúdio, debochou: “Ela está lançando um nome!”
De tardementa
Logo depois, na Globo, a presidente voltou a seu estilo habitual: criticou o eleitor de São Paulo por reeleger o governador Alckmin e a imprensa por, segundo ela, não realçar o risco da falta dágua. “Fosse com qualquer Governo da situação, nós seríamos criticados diuturna e noturnamente”.
Pois é: Governo só pode ser da situação. Se fosse da oposição, não seria Governo. E “diuturnamente” não tem nada a ver com dia: quer dizer “por longo prazo”. É o que dá permitir que o marqueteiro João Santana vá para longe, Paris, tirar alguns dias de férias.
Besteira tem limite
Aécio Neves, derrotado, cumprimentou sua adversária Dilma Rousseff pela vitória. O pessoal de cúpula de sua campanha até agora se comportou civilizadamente. Em compensação, seus eleitores xiitas saíram falando besteira: criticando os eleitores nordestinos (que deram ampla vitória a Dilma), ameaçando ir embora do país, retomando velhas e imbecis teses separatistas.
O Brasil, ainda colônia, derrotou duas nações que tentaram dividir-nos: a França (que criou a colônia da França Antártica) e a Holanda, que se instalou em Pernambuco (e, até ser expulsa, até que tomou boas iniciativas). Não seria uma derrota eleitoral que provocaria aquilo que nem duas grandes potências conseguiram. Brasileiro é brasileiro, seja de que Estado for; e com frequência descende de uma mescla de migrantes brasileiros e estrangeiros. Separar-se por perder uma eleição? Ridículo.
E que seria do esplêndido churrasco gaúcho sem o sal grosso de Mossoró?
A presidente e o Supremo
Esqueça a preocupação com as nomeações de Dilma para o Supremo. É verdade que, de acordo com o previsto, ela deve indicar cinco nomes. É verdade que, em 2016, só deverá haver um ministro não indicado nem por Lula nem por Dilma: Gilmar Mendes, nomeado por Fernando Henrique, cuja aposentadoria compulsória, aos 70 anos, está marcada para 2025.
Só que não muda nada: dos dez ministros atuais do Supremo (falta indicar o substituto de Joaquim Barbosa), nove foram indicados por Lula, Dilma ou presidentes que estão em sua base de apoio, Collor (Marco Aurélio) e Sarney (Celso de Mello). Isso não impediu que o Governo fosse derrotado em várias ocasiões – inclusive no processo do Mensalão, comandado por Joaquim Barbosa, um dos indicados de Lula. Ministro do Supremo não depende de quem o nomeou: tem independência garantida. Nomeie dez, nomeie todos, isso não assegura vitórias sucessivas ao Governo.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.